À luz do ambiente das redes sociais, estas linhas vão soar mal. Vindas de um jornalista, então, pior um pouco. Mesmo no meio de ventos e tempestades como os das últimas décadas, o jornalista deve continuar a cumprir a sua função de watch dog, escrutínio dos vários poderes, garante das democracias liberais e dos seus cidadãos. Para mim, e felizmente para muitos outros profissionais, esta continua a ser uma verdade insofismável. A verdade, porém, também nos obriga a reconhecer os méritos dos que, no dever das suas obrigações, cumprem as tarefas que lhes foram atribuídas: como o vice-almirante Henrique Gouveia e Melo, que desde fevereiro deste ano coordena a task force do plano de vacinação contra a Covid-19. Recorde-se que Gouveia e Melo iniciou as suas funções num clima de grande persecução por causa de casos de vacinação indevida em pessoas não prioritárias. O novo responsável garantiu desde logo que as regras iriam ser apertadas, assim como a consciencialização de todos os envolvidos no processo. Proferiu então duas frases que merecem ser recordadas: “Nós somos silence service porque gostamos de prestar serviço de forma silenciosa. Não é pormo-nos em bicos de pés que vai ajudar os portugueses.”
Temos motivos para nos orgulharmos desta ultramaratona contra a Covid-19. Estamos a par das médias europeias, com 29% da população já vacinada com a primeira dose e 11% com a vacinação completa (dados do último fim de semana). Mais importante ainda: acima dos 60 anos, idade crítica em termos de mortalidade, as taxas já são da ordem dos 73% (60-69 anos), 93% (70-79 anos) e 95% (acima dos 80 anos). Só no passado fim de semana foram administradas 200 mil doses e, de acordo com as informações prestadas por Gouveia e Melo, na Assembleia da República, as previsões apontam para que 70% dos portugueses estejam vacinados entre o final de julho/início de agosto. Não é preciso lembrar a noite em que o Sporting venceu o campeonato nacional para falarmos da nossa proverbial dificuldade em planear, prever, antecipar (só um parêntesis para dizer que aconteceu com o Sporting, mas podia ter acontecido com outro clube qualquer…). O discreto e silencioso Gouveia e Melo fala apenas quando tem de falar. Às polémicas, tem respondido com factos e, sobretudo, com ação, nunca esquecendo o seu objetivo principal: vacinar! Existem atrasos nas entregas das farmacêuticas? Existem erros com as marcações? Pois, claro que sim. Mas, perante as dificuldades, o responsável pela task force não parece hesitar: nem acerca de vacinas, nem acerca de recomendações etárias, nem acerca de grupos prioritários. Há uma guerra contra um vírus, há uma luta contra o tempo, há uma missão para cumprir – prestando contas a quem de direito, mas sem alaridos. Silence service.
No meio de tantas críticas e apreciações levianas, não é justo que nos esqueçamos daqueles que, além de estarem disponíveis para a coisa pública, têm cumprido a sua missão. A palavra é mesmo esta: missão. Não são assim tão poucos, nem são assim tão raros. Por isso, senhor vice-almirante, por aqui segue o meu louvor. Imagino que vá dizer que não é para agradecer, que é seu dever, mas eu faço questão: obrigada!