Tantos verdes diferentes e juntos. As azáleas estão todas em flor. Que beleza! Estamos no Miradouro do Pico do Ferro, à beira da margem norte da cratera das Furnas, em São Miguel. A lagoa e o vale aninham-se nos bordos íngremes da imensa cratera, cobertos de abundante vegetação nativa. Concha dentro da ilha. Já estivemos aqui dezenas de vezes e é sempre o mesmo deslumbramento. Numa cota superior ao vale, a lagoa, como que suspensa, espelha o céu, a vegetação e, no silêncio profundo deste mundo visto de cima, tudo é simplesmente belo e há uma paz indescritível. Há que guardar estes momentos para sempre no fundo de nós para que os possamos reviver vezes sem conta. As furnas, caldeiras vulcânicas de água fervente, fumegam do chão eternamente, emprestando ao sítio uma encantada neblina. Adivinha-se o cheiro a enxofre e apetece o tradicional cozido à portuguesa preparado nas entranhas da terra com o calor do vulcão. Retalhos de pastagens lisas com sebes de hortênsias entremeiam com matas e pomares, por onde ondeiam pequenos rios e riachos, uns de águas frias, outros de águas quentes, com trutas e enguias.

Minúsculas casinhas brancas correm as ruas estreitas da aldeia do vale ou agrupam-se no conforto de largos com coretos, açucareiros ou igrejas … e todos os caminhos vão dar ao Parque Terra Nostra, um jardim botânico existente desde 1780, quando o sortudo Cônsul dos Estados Unidos da América nos Açores quis erigir ali a sua residência de verão. Daqui vemo-lo como uma ilha arborizada que sobressai na paisagem, albergando centenas de géneros de camélias e a maior coleção de cicas da Europa. As minhas preferidas são as sequoias, que vão lentamente tomando as alturas. No coração deste parque está a enorme piscina de água férrea, para deleite dos banhistas. Pessoalmente, prefiro lá ir nas noites de inverno quando posso sentir o contraste das águas quentes com o ar frio da noite. Que delícia flutuar sobre as águas e vislumbrar, entre as araucárias, o brilho distante das estrelas.
As flores polvilham todo o cenário, anunciando a Primavera, que, aqui, é a estação por excelência.
Comigo, tenho uma das minhas filhas. Nasceu a 22 de Março. Chamei-lhe Alexandra, mas apeteceu-me dar-lhe o nome de Primavera. Confesso-lhe esta velha intenção, distraindo-a da contemplação. Diz que não me perdoaria e que eventualmente mudaria de nome pela sua estranheza. Compreendo-a. Rimos.

Do cenário desprende-se um cheiro fortíssimo a mato e a água. Nesta altura do ano, há um perfume intenso que predomina sobre todos os outros. É certamente de uma flor selvagem, mas qual? Serve como um feitiço para atrair pássaros. Há muita vida a fervilhar em cada árvore e em cada arbusto: o tentilhão, o santo antoninho, as lavandeiras,
os toutos, os melros pretos, o priolo, os canários da terra – esses já muito escassos por força dos ataques dos pardais parasitários, que são muitos.
Pusemo-nos no carro. Descemos para almoçar num dos restaurantes do vale, dar um passeio pela aldeia, ou pelo parque, beber água das múltiplas fontes de águas termais que brotam nos caminhos, tomar um banho nas piscinas de água férrea. Há lá nada melhor do que isto!