O irrealismo diletante e arrogante dos gregos foi vergado. A força bruta, e muitas vezes cega, dos alemães, venceu. Quanto ao resto, sendo certo que Atenas apenas tratou de salvar a pele, tudo é de tal forma triste e surreal neste acordo que não se consegue perceber o que pretende e onde acabará esta Europa.
Os gregos perderam. Como perderam os portugueses, os italianos, os espanhóis, os irlandeses e mesmo os franceses. E também – um dia irão senti-lo, porque esta história não morreu no passado fim de semana – os alemães, os austríacos e os holandeses. Ou mesmo os dinamarqueses e os britânicos, que, fora da moeda única, não deixam de estar interessados numa Europa forte e coesa, com a Grécia lá dentro. Todos perdemos com este dossier que se arrasta há demasiados anos, tendo de um lado governos que sempre mostraram poucos escrúpulos para se manterem no poder e nunca souberam o que era fazer jogo limpo com os seus parceiros europeus, e, do outro lado, um grupo de países que, na realidade, sempre falharam enquanto financiadores, enquanto credores, enquanto consultores e parceiros, porque falharam sempre no que era essencial, na sua dimensão política. Falharam enquanto líderes e protagonistas do mais admirável projeto político supranacional de todos os tempos – que está hoje em forte risco de ser uma história do passado, e já não uma promessa de futuro com paz, segurança, prosperidade e solidariedade.
Aos inqualificáveis governos tradicionais da Grécia, suportados por anos de assistência financeira que apenas deu mais desemprego, empobrecimento e endividamento, sucedeu o “revolucionário” Syriza. Devemo-lo ao Eurogrupo, com o ministro Wolfgang Schäuble na primeira linha. O radicalismo sempre chamou radicalismo. Ou desespero. Só o descrédito absoluto na UE, nos seus representantes e soluções políticas, pode justificar o apoio recebido pelo Syriza no último referendo. Reforçou uma posição que sempre foi colocada ao povo grego de forma leviana e demagógica, e que era, sobretudo, insustentável nas negociações, por ser intrinsecamente incongruente: “emprestem-nos mais dinheiro, mas nós não pagamos porque vocês são uns bandidos sem moral”. O “não” às propostas dos credores não apoiou Tsipras. Na realidade, perante o que já se sabia das negociações e do estado das finanças do país, apenas fechou ao primeiro-ministro a possibilidade de demissão, a única saída da embrulhada onde se tinha metido.
As pessoas esqueceram-se que o povo grego não estava a votar o comportamento dos credores, mas sim o do seu Governo perante os credores. E aquele já estava, obviamente, derrotado. Não é fácil travar guerras com as prateleiras dos supermercados sem nada para alimentar a população, as contas bancárias congeladas e a ameaça do caos e da guerra civil em cima da mesa. Apesar de muitos o considerarem hoje um traidor, Tsipras fez o que tinha de fazer. Teve em conta, no último momento, o interesse imediato da Grécia, da sua democracia, da paz e do bem-estar da sua população.
Bem mais difícil é perceber o que pretende a UE com esta lista de exigências. A “lição” pela insubordinação fica dada de forma clara. Mas o preço exigido nunca será pago. E nada garante, sequer, que esta “humilhação” mantenha a Grécia no euro. Para os gregos, não irá, seguramente, valer a pena. Pelo que esta “punição” pode muito bem acabar como um caso exemplar. Mas à grega.