Brasil, os superfofinhos
Os comentaristas, especialistas e opinadores profissionais no Brasil não têm sido gentis com a seleção. No entanto, entre os jogadores parece haver mais carinho do que pressão, mais boa onda do que nervosismo. Neymar é o presidente dos superfofinhos. No aquecimento, antes do jogo com o México, abraçava todos os colegas e dava um beijinho em Dani Alves. No túnel, antes de entrar em campo, David Luiz falava com uma das crianças que acompanhavam os jogadores como se fosse o tio porreiro que presta toda a atenção ao que o sobrinho lhe diz. E, claro, Neymar, que conversava, divertido, com uma menina que, amanhã, na escola, vai ser questionada e celebrada pelos coleguinhas como se fosse ela mesma uma craque. Não sei até onde é que a meiguice e a alegria podem levar uma seleção. Mas uma coisa é certa, a ternura e amizade destes rapazes, que entram em campo com a mão no ombro do colega da frente porque, dizem, “a mão você dá a toda a gente, mas um ombro você dá ao seu amigo”, tem servido para aliviar o estado de alma agressivo e intolerante do Brasil antes da Copa. Um pouco de gentileza, por favor, entre tanta ruindade.
Dia de jogo
O primeiro jogo do Brasil foi em São Paulo, a mais de 600 km do Rio de Janeiro. O segundo, com o México, aconteceu em Fortaleza, a 2500 km. No entanto, nos dias de jogo do Brasil, esta cidade parece que está nas imediações do estádio desde que acorda até que se deita. Muito mais de metade das pessoas com quem me cruzei estavam de verde e amarelo. Centenas de vendedores nas praças, ruas e semáforos vendem infinitos artigos da parafernália da seleção. Os prédios de escritórios fecham horas antes do encontro e o resto do dia é definido pela seleção. Tudo é verde, amarelo, e “estamos juntos”. Há uma eletricidade festiva na movimentação massiva das pessoas – o metro cheio, os ônibus cheios, toda gente a falar do mesmo assunto. Nunca tinha vivido nada igual, parece que a cidade se une num só propósito. Não sei se vai ser a Copa das Copas, mas é certamente uma Copa muito diferente de todas aquelas que já vivi.
A apologia de Ronaldo
Quando mostrei a primeira página da Folha de São Paulo aos meus amigos brasileiros eles riram. Eu tinha ficado um pouco irritado. A frase da manchete – “Perdeu, playboy” – é um bordão geralmente atribuído aos bandidos que roubam os riquinhos playboys, a frase que decreta a vitória de um sobre o outro e que, claro, implica a humilhação do derrotado. Curiosamente, a frase avançou pelo mundo (pelo menos no mundo que entende português) por causa do filme Tropa de Elite, dessa vez na boca dos agentes do BOPE.
Se fosse brasileiro, admito, acharia mais graça à manchete. Afinal, eu também já gozei com Ronaldo. Confesso que a minha irritação tinha a ver com a derrota por 4-0 com a Alemanha. Mas, como leitor da Folha, reparara também como o jornal tem uma embirração especial por Ronaldo, fazendo, nas últimas edições, constantes piadas com o gel, as sobrancelhas e o creme bronzeador do número 7 da seleção – o problema maior é que as piadas não têm graça alguma.
É verdade que Ronaldo se põe a jeito, que o seu narcisismo e a sua vontade de palco coincidem na perfeição com a voragem mediática que glorifica e doura tudo o que não interessa. Também é verdade que todos querem um pedaço de Ronaldo, porque o rapaz vende, e a Folha está entre eles, faz parte da tendência universal dos meios de comunicação: fazer mais entretenimento barato e voyeurismo de celebridade do que jornalismo.
Não se trata de compaixão pelo rapaz. Trata-se de prioridades. Eu entendo que o Cristiano Ronaldo, miúdo pobre da Madeira, abnegado e competitivo ao ponto da obsessão, que vive num mundo à parte do nosso, e que parece ser bastante benemérito e grato, tenha por vezes as prioridades de um puto charila com a mania que é bom, ou que dispa a camisola depois de um golo para que o seu caparro apareça nas primeiras páginas de todo o mundo. O que não entendo é a que a prioridade da Folha, numa primeira página, seja a mesma de uma adolescente embirrante e com um odiozinho de estimação, uma miúda que lê a Contigo! como se fosse a bíblia e que, se estivesse diante de Ronaldo, tremeria das pernas como a adolescente que é.
Golo!
Ontem o Brasil não marcou, ainda que tenha tentado muito. Para compensar a secura de golos e gritos de celebração, recordamos aqui os festejos, de norte a sul do país, do primeiro da seleção no torneio, contra a Croácia, numa produção do New York Times que mostra os segundos antes, durante e depois do golo entre a torcida verde e amarela. VEJA AQUI
Forró for all
Os Estados Unidos defrontaram o Gana em Natal, naquela que foi, provavelmente, a cidade mais norte-americana do Brasil. Durante a Segunda Guerra Mundial, por causa de uma base militar, viviam ali 10 mil americanos numa população total de 54 mil pessoas. Natal foi a primeira cidade brasileira a ter jeans, pastilhas elásticas e coca-cola. O género musical forró tem a origem do seu nome nos bailes dos americanos abertos aos brasileiros, que eram anunciados como “for all” (para todos), daí a corruptela “forró”.
Seleção Sideshow Bob
Mais uma vez os penteados. Não é a primeira vez que David Luiz é comparado com o vilão dos Simpsons, Sideshow Bob. Nesta Copa, não está sozinho. Com Willian, do Brasil, Witsel e Fellaini, da Bélgica, e Assou Ekotto, dos Camarões, podia começar uma equipa de futebol de salão.