Desde jovem que na Faculdade de Letras comecei a ter conhecimento do meu colega em Histórico-Filosóficas, mas da Universidade de Coimbra, Eduardo Lourenço. Um pouco mais velho do que eu. Foi o meu grande amigo Joaquim Barradas de Carvalho que me falou, com entusiasmo, de Eduardo Lourenço, pela primeira vez, e me fez ler alguns dos seus livros, como Heterodoxia, salvo erro da Coimbra Editora, de 1949. Não foi para mim um livro fácil, longe disso. Falava de Hegel, de Descartes e Kant, autores que conhecia mal dos meus estudos de Filosofia. E do existencialismo, tão em moda nessa época em que eu procurava ler (mal) Marx e sobretudo Lenine e Estaline. Saudosos tempos hoje ultrapassados…
Depois li Fernando, Rei da Nossa Baviera, As Saias de Elvira e outros Ensaios, Os Militares e o Poder, O Fascismo Nunca Existiu, O Labirinto da Saudade, A Noite Intacta: (i)recuperável Antero, Sentido e Forma da Poesia Neo-Realista, sobre três poetas de que fui muito amigo, Carlos de Oliveira, José Cochofel e Joaquim Namorado (deste menos, por ter um temperamento difícil, ao contrário do irmão Egídio). Vem isto a propósito do livro, que me foi recentemente oferecido pelo meu amigo José Jorge Letria (JJL), de uma longa entrevista que fez a Eduardo Lourenço, livro intitulado A história é a suprema ficção (Editora Guerra e Paz).
Trata-se de um livro que se lê, com profundo prazer, num dia e pouco, para quem tem uma vida ocupada como eu. As perguntas são excelentes e as respostas de um incontestável pensador, sem dúvida, o mais profundo e atual do nosso tempo, Prémio Pessoa, dos mais graduados académicos e dos mais reputados no estrangeiro. E, além disso, de uma modéstia absoluta.
No tempo de crise aguda em que vivemos, as pessoas não contam e só os mercados interessam ao Governo, que quanto à cultura, zero. A verdade é que a Cultura e a Ciência portuguesas foram sempre brilhantes, e agora, desde há dois anos e meio, deixaram de interessar aos que nos governam. Realmente deixaram quase de contar. Por isso é que aparecer um livro de entrevistas feitas por JJL, com uma oportunidade exemplar, com respostas do nosso maior pensador, com a inteligência e a modéstia que lhe são reconhecidas, em Portugal e no estrangeiro, representa algo que não deve deixar de ser lido e meditado.
Portugal, ao longo dos séculos, não foi só o país das Descobertas, que deram novos mundos ao Mundo. Foi sempre um país de cultura, no mais amplo sentido do termo. De cultura, de grandes escritores, poetas e cientistas. Nem podia ter sido o que foi sem isso mesmo. Contudo, este Governo não tem vindo a destruir e a vender só o nosso património. Está a destruir as Universidades, as Escolas Públicas e tudo quanto lhe cheire a Ciência e Cultura. O secretário de Estado da Cultura (porque não há ministro) queixou-se de não ter dinheiro, o que deve ser verdade. Mas além disso, como se viu no caso Miró – um escândalo intolerável – não soube o que dizia nem o que fazia. Revelou-se um zero.
Sem cultura, o Governo deixa de ter qualquer crédito e os discursos de Portas e de Passos Coelho, ambos de palavra fácil, não se entendem entre si e muito menos são entendidos pelos poucos que os ouvem sem desligar as televisões.
O livro de Jorge Letria e de Eduardo Lourenço é uma excepção ao atual estado de coisas e de um interesse absoluto. Por isso o apresento aos meus leitores e peço-lhes que o leiam. Creiam que não perdem tempo e ficam muito mais ricos de saber. Vale-lhes o preço e, por isso, o recomendo vivamente.