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Depois de o multimilionário Warren Buffet ter apelado publicamente ao Governo de Obama para que deixasse de “mimar” os ricos e os começasse a taxar de forma mais efetiva, um grupo de 16 personalidades do mundo empresarial francês, entre os quais os presidentes dos grupos Total, Sociétè Générale, Air France, Danone ou Peugeot/Citroen, propôs ao respetivo governo um aumento das taxas que incidem sobre os cidadãos de maior fortuna. Uma atitude pouco comum, mas, ainda assim, muito menos estranha do que o facto de não existirem mais histórias destas pelo mundo fora, Portugal incluído.
O texto surgiu em forma de petição, com os seus proponentes a afirmarem que querem do Governo a criação de uma “taxa especial” que deve incidir sobre os contribuintes mais favorecidos do ponto de vista económico, de forma a poderem ajudar a França a ultrapassar as dificuldades que hoje tem, e que afetam também vários países europeus. Não deixam margem para dúvidas: nem sobre o facto de quererem essa “taxa especial sobre as grandes fortunas”, nem sobre os cuidados que é necessário ter com esse novo imposto, nem sobre os limitados efeitos que terá, nem, por último, sobre os motivos que os levam a defender tal medida, questão central de toda esta história.
Uma das coisas irritantes da nossa política é a facilidade demagógica com que se pedem impostos sobre fortunas, sobre transações financeiras, sobre lucros, etc. Não é por esse objetivo ser injusto ou ilegítimo. Nunca será uma coisa ou outra enquanto existir tanta desigualdade social e tanta iniquidade fiscal. E num cenário de crise financeira e económica, esse esforço acrescido por parte de quem mais tem surge ainda mais justo, seja do ponto de vista ético ou social. O que não leva a nada é a demagogia do discurso que ignora os efeitos perversos, ou mesmo contraproducentes, que algumas dessas medidas sempre teriam, caso fossem aplicadas por um único país e sem a “aceitação” das entidades atingidas, sejam elas pessoas individuais ou coletivas.
Aumentar os impostos sobre as fortunas, sobre os rendimentos de capital ou sobre os salários milionários, em economias como a portuguesa ou a francesa, que são abertas ao mundo e, simultaneamente, integrada numa aliança de países e numa zona monetária, são movimentos que só podem ser tomados com grande prudência e de forma concertada. Daí os limites de “razoabilidade” de que falam estes milionários franceses, alertando para o risco de fuga de capitais e de evasão fiscal em caso de tributação “excessiva”. Este é um perigo real para as finanças públicas dos Estados da UE e um dos mais sérios desafios ao modelo social europeu.
E razão têm também os 16 titulares das maiores fortunas de França quando assumem que o seu gesto tem efeitos limitados e não resolve os problemas de fundo da economia. Independentemente do acréscimo de receitas que o Estado possa ir buscar aos chamados “ricos”, para lá do facto de existir hoje uma política fiscal que não corrige, ou pelo menos corrige pouco, as desigualdades abissais de rendimento entre cidadãos, apesar de ser verdade que os estados estão reféns de um funcionamento global dos mercados e de um quadro jurídico internacional que os impede de taxar devidamente os rendimentos de capital, é fundamental reconhecer o que é hoje inegável: as finanças públicas da maioria dos estados europeus encontram-se numa situação lamentável. E é essa tendência da despesa pública, sempre crescente e insustentável, que tem, antes de tudo, de ser atacada e moralizada. Também aqui têm razão os grandes gestores franceses: a solução do problema não está, simplesmente, em taxar mais. Está em fazer melhor, ser mais racional e mais justo, quer do lado dos impostos quer do lado da despesa pública.
A prova de clarividência deste grupo de “afortunados de França” está, contudo, no facto de assumirem que são ricos, e que tiram o respetivo proveito, porque vivem num determinado modelo de organização política e económica, a sociedade francesa, reforçado pelo contexto da União Europeia. Um modelo de que não abdicam e “querem contribuir para que seja preservado”. Palavras sábias de quem sabe ver a totalidade do retrato, sabe olhar para longe, é rico e quer continuar a sê-lo.
O aumento da carga fiscal sobre algum tipo de riqueza é um problema de difícil resolução e não resolve, por si só, o problema da economia. Mas faz parte desse problema e pode dar uma ajuda para melhorar a situação global, caso se consiga o devido enquadramento internacional – o europeu, no mínimo, e o mais vasto possível, em termos ideais. Uma coisa é certa: o modelo europeu, o modelo ocidental, precisa desse contributo para não desaparecer de vez. Assim como as fortunas europeias precisam de uma sociedade que não entre em colapso social e económico para poderem sobreviver na sociedade que lhe gera a riqueza.
Warren Buffet pediu ao Governo dos EUA que deixasse de “mimar os ricos”. Os ricos de França, disseram o mesmo, assumindo que estão dispostos a pagar para que não se deixe morrer a galinha dos ovos de ouro.