Pedro Almodóvar, aclamado de pé pela audiência, como se, depois de uma longa desavença, fumasse o cachimbo da paz com a Academia espanhola. Penélope Cruz e Javier Bardem, juntos em público, para anunciarem à Hola e aos aficionados do cor-de-rosa que a Espanha tem a sua própria versão do casal Demi Moore e Ashton Kutchner. Estas serão muito provavelmente as imagens da última cerimónia de entrega dos Prémios Goya que Portugal e o resto do mundo mais comentarão. No entanto, o que realmente importa, sob tantos holofotes, é que Celda 211, de Daniel Monzón, recebeu oito distinções, entre as quais as de melhor filme, realizador, actor, actriz secundária, actor revelação, som, montagem e guião. Batia-se contra o favoritismo da co-produção hispano-americana, Ágora, de Alejandro Aménabar, que iniciou a “partida” com 13 nomeações (ganhou sete em categorias técnicas)
Chegaremos a ver este Celda 211? Daniel Monzón (nascido em Palma de Maiorca há 41 anos) não é exactamente um estranho em Portugal, já que El Corazón del Guerrero (de 1999) recebeu o Prémio de Melhor Película Fantástica no Fantasporto, mas é duvidoso que, à imagem do que acontece com a grande maioria dos filmes espanhóis, também este não passe em circuito comercial. Nem na televisão, pública ou privada. Para além do imenso continente que é a obra de Pedro Almodóvar, há, para os portugueses, toda uma terra incógnita que é o restante cinema espanhol. Conhecemos os actores e as actrizes de Almodóvar, os seus argumentistas, Alberto Iglesias que lhe compõe as bandas sonoras (e que conquistou o seu oitavo Goya por Abraços Desfeitos), a sua paleta de cores, preferências cinéfilas, mas tudo o mais é nebuloso.
Acontece o mesmo no sentido contrário. À parte os festivais e as mostras de cultura portuguesa, necessariamente localizadas no tempo e no espaço, o que conhecem os espanhóis do nosso cinema? Porventura alguns filmes de Manoel de Oliveira, como acontece no resto do mundo, geograficamente bem mais distante. Mas todos os outros cineastas, e, com eles, os actores, técnicos e realidades portuguesas?
Não falo sequer da criação de um mercado ibérico de profissionais de cinema, que a proximidade das línguas e das culturas deveria proporcionar, com vantagem para ambas as partes, refiro-me apenas a uma regularidade aceitável de exibição.Com o pretexto de que não existe apetência dos respectivos públicos, Portugal e Espanha permanecem, nesta área muito mais do que na Literatura ou nas Artes Plásticas, de costas tão voltadas como há 30 anos. Numa época em que, graças à sofisticação das tecnologias de comunicação, as distâncias se encurtam, a continuidade deste desconhecimento mútuo chega a ser absurda. Para não dizer ridícula.