xutos
Esta vem a propósito de Rei Édipo, a peça de Sófocles, que Jorge Silva Melo leva ao palco do Dona Maria. Mas, para evitar equívocos, é bom que as histórias se distingam: uma coisa é o mito de Édipo, da Antiguidade Grega, outra é o complexo que Freud descreveu. Outra ainda é a música dos Xutos & Pontapés. Mas já lá vamos.
A peça recria o mito de Édipo, um rei que não consegue fugir à previsão trágica do horóscopo e acaba por desposar a mãe e assassinar o pai. Em Freud, nada disto é real, o exemplo serve para metaforicamente descrever a relação ambivalente de amor, desejo e ódio que os filhos sentem pelos seus progenitores.
A personagem dos Xutos verbaliza o complexo, transformando-o num caso agudo, numa psicopatia. A diferença essencial é que Édipo não sabia que aquela mulher que desposou era a mãe, nem que aquele homem que matou era o pai. Na música dos Xutos, pelo contrário, há uma declaração de intenções: “Mãe, mãe, eu já matei o pai pai pai pai pai, mão foi uma morte sem dor”. Na linha do que Jim Morrison cantou no apocalíptico The End: “Father, I want to kill you; mother, I want to fuck you”.
Não sei o que os pais do Tim acharam desta canção, mas assenta que nem uma luva no período mais punk dos Xutos, que corresponde aos primeiros anos: está no álbum 1979-1982. Tem a força e energia, uma linguagem e forma de estar insurrecta, politicamente incorrecta, embora denuncie os maus tratos domésticos. Ao todo, na versão ao vivo, repetem a palavra “Mãe” 53 vezes (salvo erro), e em número semelhante dizem “pai” e “tu”, sempre numa espécie de eco, acentuando a ideia de triângulo amoroso familiar, presente na história que conseguem contar. A forma como as palavras são gritadas combina, na perfeição, com o som da guitarra, e faz desta canção, tão peculiar, um imenso grito de raiva. Freud explica, Édipo também, os Xutos qum sabe.
Mãe -Letra
Mãe tenho ciúmes do pai
Quando se deita contigo Mãe
E te chupa as tetas
E te esborracha os seios
E se monta em ti
E se vem depois. Mãe
Mãe eu não suporto o pai
Mãe vou dar cabo do pai
Quando ele diz Mãe
Gosta de mim Mãe
Quando ele diz Mãe
Gosta de ti Mãe
Quando ele diz Mãe
Que nos ama aos dois
E depois bate sem fim
Eu vim cá para fora
Toda a gente chora
Toda a gente berra
Foste tu
Foste tu
Mãe
eu já matei o pai
Mãe
Foi uma morte sem dor
Agora sou só eu Mãe
Agora és só tu Mãe
Agora somos só dois
E depois, e depois
Mãe
Morreste também
Mãe
Traíste-me assim
Agora sou só eu Mãe
E procurei o fim Mãe
Eu vim cá para fora
Toda a gente chora
Toda a gente berra
Foste tu
Foste tu