Na sequência do tema da capa da última edição, e após ter questionado 10 músicos brasileiros sobre as razões que os levaram a trocar a terra natal pelo nosso país, o Jornal de Letras estendeu o questionário também às artes plásticas e performativas, conversando com Isa Toledo e Keli Freitas.
1. Porque escolheu viver em Portugal?
2. O que Portugal trouxe para a sua arte?
3. O que a sua arte trouxe a Portugal?
4. Acredita que Portugal pode ser um ponto privilegiado para intercâmbio de culturas, nomeadamente, no mundo lusófono?
Artes plásticas
Isa Toledo
Ano e local de nascimento: São Paulo (1990)
Ano da chegada a Portugal: 2016
Mestre das palavras e da ironia, matérias-primas da sua prática artística, Isa Toledo é senhora de um sentido de humor refinado.
Através de vídeos, colagens, bordados, ilustrações, objetos do quotidiano que recolhe em mercados e feiras tradicionais, performances ou instalações, a artista “molda” as palavras qual ferreiro na bigorna.
Do sentido à fonética, a palavra escrita e falada dá origem a trocadilhos que sugerem reflexões, arrancando inevitavelmente sorrisos a quem com eles se depara.
Em 2015, um ano antes de chegar a Portugal, co-fundou o ButchCamp com o designer gráfico Rosen Eveleigh, um projeto de investigação centrado na estética contemporânea dos acampamentos, cujas entrevistas e artigos foram publicados pela Teen Vogue, Another Magazine, Dazed e Girls Like Us.
Em Portugal, onde atualmente é representada pela Galeria Miguel Nabinho, reside desde 2016, ano em que iniciou o mestrado em pintura na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, após ter estudado ilustração no Camberwell College of Arts – Universidade de Artes de Londres, e de ter vivido também em Berlim.
Além de ilustrações para a Revista Electra e para dois livros da editora Sr. Teste, destacam-se duas exposições individuais – pick one card any card (2021) e Casa Commedia (2024) – ambas na Galeria Miguel Nabinho.
Assim respondeu ao nosso inquérito:
1. Como a minha família vivia toda dispersa, costumávamos voltar todos os anos para o Brasil. Em 2012, depois da morte da minha avó materna, passamos a nos encontrar sempre em Lisboa. Em 2016, depois de morar alguns anos em Berlim, onde achava um saco não falar alemão, vim viver aqui de vez.
2. O mestrado trouxe tempo e espaço, a Baixa trouxe carimbos e papelarias e cordões, o país trouxe interesses novos, tipo a lã, bons exemplos, tipo a Ana Jotta, e trouxe enfim um galerista, o Miguel Nabinho!
3. Lata.
4. Isso depende de como defines privilégio, intercâmbio e cultura. J
Artes performativas
Keli Freitas
Ano e local de nascimento: Três Corações (1983)
Ano da chegada a Portugal: 2017
Com uma licenciatura em Letras pela Pontifícia Universidade do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e formada em Artes Cénicas pela CAL (Casa das Artes de Laranjeiras), Keli Freitas tem ainda o mestrado em Estudos Portugueses pela Universidade Nova de Lisboa.
Entre as suas criações, destacam-se Osmarina Pernambuco não consegue esquecer (2019), Adicionar um lugar ausente (2020), Fábrica de matar baleia (PANOS, 2022) e Outra Língua (2022). Trabalhou também como dramaturga com Tita Maravilha, no projecto Es tr3s irms, e com Gaya de Medeiros no projeto BaqUE.
Em 2024, venceu a 2.ª edição do Projeto CASA, iniciativa promovida pel’O Espaço do Tempo, A Oficina, e pelo Cineteatro Louletano, com Volta para a tua Terra, um projeto no qual, a partir da busca pela sua bisavó portuguesa, desafiou as ideias de imigração e pertença.
Kelly Freitas define-se ainda como “colecionadora de correspondência de pessoas anónimas”, que compra em feiras de antiguidades, a partir da qual, desde 2013, desenvolve trabalhos autorais.
O mais recente fruto de tal atividade foi o espetáculo Madrinhas de Guerra, em cena de 25 a 28 de julho no Amphiteatro Chimico do Museu de História Natural e da Ciência, em Lisboa, no âmbito do ciclo Abril Abriu, do Teatro Nacional D. Maria II, construído a partir da figura destas mulheres que se dispuseram a consolar soldados por correspondência, durante a guerra colonial portuguesa em África.
Assim respondeu ao nosso inquérito:
1. Cheguei a Portugal em 2017 para fazer um semestre de intercâmbio entre a minha Faculdade de Letras no Rio (pontifícia universidade católica do rio de janeiro – PUC – Rio) e a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL). Também era uma das autoras do laboratório de escrita para teatro do TNDM II, coordenado pelo Rui Pina Coelho, na turma de 2017/2018.
2. A experiência de ser estrangeira dentro da minha própria língua.
3. Acho que isso só Portugal poderá dizer.
4. A presença e permanência de artistas estrangeiras é hoje parte essencial da produção e circulação de outros discursos dentro tecido artístico português.