Iniciativa com o apoio da CGD
Apesar da tendência de concentração da população em centros urbanos – tendência essa que não é só portuguesa e se deverá agravar –, a crise da habitação alastrou às regiões do Interior, garantiu Ana Abrunhosa, ministra da Coesão Territorial, esta terça-feira, na Guarda, durante um Encontro Fora da Caixa, uma iniciativa da Caixa Geral de Depósitos (com a VISÃO como parceira de média). “Não é só Lisboa e Porto. Mesmo no Interior, as empresas dizem que já começam a pagar preços muito elevados.”
A solução passa por mais construção pública, para resolver as distorções. “Temos de usar bem os fundos para haver construção pública. Não planeámos e confiámos no mercado, e por isso temos agora uma falha do mercado, com falta de habitação. Vamos financiar a construção de habitação a custos acessíveis.” Um papel que não cabe apenas ao Estado. “O próximo quadro-comunitário permite que os municípios o façam em parceria com privados.”
A ministra realçou a importância da descentralização para resolver os diferentes problemas de coesão do território nacional: áreas metropolitanas com dificuldades crescentes de habitação e de transporte e um Interior cada vez menos populado. “Temos uma parte importante do território sem gente a viver. Em Espanha, também acontece o mesmo. Nos Bálticos, as perspetivas são para 30 a 35% dos municípios desaparecerem. É um desafio.”
É necessário, por isso, reinventar o Interior, sobretudo quando aumentam as pressões climáticas, acrescentou, dando o exemplo do incêndio que, no ano passado, queimou 25% do Parque Natural da Serra da Estrela. “As ocorrências extremas são mais frequentes e severas. Quando não intervimos a tempo, um incêndio torna-se incontrolável. É fundamental alterar a gestão do parque natural e torná-lo mais vivido e fruído. O que não é humanizado nem vivido também não é preservado. Não podemos proteger o território como se fosse um museu. Temos de humanizá-lo, criar atividades adequadas a essas regiões”, defendeu, sublinhando que a “revolução tecnológica” permite ter floresta e agricultura com menos pessoas, a que se soma uma grande diversidade de oferta turística.
Pagar pelos serviços que o Interior nos presta
Ana Abrunhosa assegurou que há muita coisa a acontecer. “Os que conhecem o nosso Interior conseguem identificar coisas boas e sementes de mudança.” O declínio populacional, no entanto, precisa de ser muito bem gerido. “As regiões do território com menos população têm de ter qualidade de vida e estarem ocupadas com atividade. Mas só vamos ter agropecuária e floresta se essas atividades forem rentáveis.”
A gestão pode passar pelo pagamento de serviços de ecossistema. “Devemos pagar o que nos dão em qualidade do ar e da água. Se nos fornecem esses serviços, é natural que sejam remunerados.” A forma de o fazer com maior potencial é através do mercado de carbono “Nos territórios do Interior, temos de assegurar um coberto que capture carbono. Os títulos de carbono podem vir a ser um bom rendimento para os nossos autarcas, através de bolsas de terras.”
Antes da ministra, na abertura da conferência, Paulo Macedo, presidente da Comissão Executiva da CGD, também falou das oportunidades de negócio que estão a surgir na mitigação das alterações climáticas, nomeadamente “o hidrogénio e a captura de carbono”. Mas, alertou, “o custo da transição tem de ser financiado”, e a banca desempenha aí um papel, “a apoiar a transição energética, a desenvolver o digital, a investir na mobilidade elétrica, a reduzir o manuseamento de cash”.
Se, por um lado, as empresas têm o incentivo do negócio, por outro, conhecem bem as consequências negativas da inação climática, continuou o gestor. “Os maiores riscos a dois a dez anos são os climáticos, relativos à biodiversidade e aos desastres naturais. Num inquérito da Deloitte de 2023, vemos que as empresas estão preocupadas em primeiro lugar com a recessão, mas as alterações climáticas já aparecem em segundo lugar.”
Paulo Macedo salientou dois impactos concretos, do ponto de vista económico. “Os riscos físicos, como a desvalorização das propriedades, quando destruídas por um fogo ou por umas cheias; e o próprio custo da transição. Por exemplo, uma empresa daqui, da Guarda, instalou painéis solares para produzir 44% da eletricidade que consome, mas isso tem um custo. São dois efeitos muito diretos.”