A Sagres nasceu para inglês beber. Estávamos em 1940, em plena Segunda Guerra Mundial, quando esta marca de cerveja foi lançada, na Exposição do Mundo Português. Tinha sido criada para atender a um pedido dos ingleses – queriam que Portugal abastecesse de cerveja as suas tropas em Gibraltar. Três anos depois, este enclave britânico, no Sul de Espanha, havia de tornar-se o primeiro destino das exportações da Sagres.
A história é contada por Nuno Pinto Magalhães, diretor de comunicação da Sociedade Central de Cervejas (SCC) e seu funcionário há 39 anos. No museu da empresa, em Vialonga, perto de Lisboa, vai mostrando as antigas garrafas da Sagres, incluindo aquelas que começaram a ser comercializadas a partir de 1960, em alguns países europeus, acompanhando a grande vaga migratória da “mala de cartão”: França, Suíça, Luxemburgo…
Em 1968, o Sumol inicia a mesma viagem. É o chamado “mercado da saudade” – estas marcas levam lá para fora um pedacinho de Portugal. E o nome pelo qual são conhecidas é determinante. Explicando: a Sagres não entrou, de imediato, em países onde a emigração maioritária provinha dos Açores e da Madeira (como os Estados Unidos da América, o Canadá ou a África do Sul), porque estas populações não identificavam a marca. Na Madeira, bebia-se a Coral e, nos Açores, a Especial. Do mesmo modo, para os portugueses em Angola, cerveja era a Cuca, e em Moçambique era a 2M ou a Laurentina.
A Sagres só ia para África em pequenas quantidades, destinada a abastecer os soldados portugueses, durante a guerra colonial. Com a independência das ex-colónias e as guerras civis que se seguiram em Angola e Moçambique, as infraestruturas industriais destes países foram desativadas. No final dos anos 70, a Sagres entra nos PALOP – Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa. Atualmente, o principal mercado de exportação da Sagres é Angola. O da Super Bock também. E o da Sumol idem.
O fenómeno do turista
Os PALOP, que nada têm a ver com o “mercado da saudade”, consomem estas marcas portuguesas por outra razão: a língua. “A língua é um fator de grande competitividade. Cria-se entre Portugal e estes países um registo de proximidade que tem um peso enorme”, refere António Pires de Lima, presidente-executivo da Unicer, que produz a Super Bock. É a cerveja portuguesa mais vendida lá fora (com presença em mais de 50 países), exportando 47% da sua produção.
Se, no topo das exportações das duas concorrentes, Super Bock e Sagres, estão os PALOP e o tal “mercado da saudade”, o das grandes comunidades portuguesas na diáspora, atualmente verifica-se um novo fenómeno que as cervejeiras não descuram. “Em Inglaterra e na Irlanda, verifica-se um crescimento das vendas das cervejas de Portugal e de Espanha. São os turistas que vêm cá passar férias quem, gostando da nossa cerveja, querem poder comprá-la no seu país”, explica Pires de Lima.
São as “cervejas do sol, da praia e da boa comida”, como diz Nuno Pinto Magalhães, que começam a ter grande aceitação em certas cidades do Reino Unido. A Sagres vai aproveitando o novo mercado e já está a ser comercializada em 320 supermercados da cadeia britânica Tesco.
Outros países surgem na mira destas marcas, independentemente da diáspora e da língua portuguesas. O Sumol, por exemplo, está a apostar no mercado gigante da China. A Sagres olha para o Magrebe. A Super Bock quer “lançar a semente um pouco por todo o lado”. Por agora, no entanto, o sucesso das suas exportações ainda se mede pela saudade e pela língua partilhada.
Cronologia
Onde há um português… há uma cerveja ou uma laranjada. Breve história de uma ligação antiga
1927
A marca Super Bock é registada
1940
A Sagres é lançada na Exposição do Mundo Português
1943
O primeiro destino de exportação da Sagres é Gibraltar, para consumo das tropas inglesas, durante a II Guerra Mundial
1954
Nasce uma “laranjada natural”, o Sumol
Anos 60
A Sagres acompanha a grande vaga da emigração portuguesa e começa a ser vendida em França, Suíça, Luxemburgo e Andorra. E vai ter com os soldados portugueses na guerra colonial
Em 1968, o Sumol também começa a atravessar as fronteiras: França, Inglaterra e Estados Unidos da América. Mais tarde, chega aos PALOP
Anos 70
No início desta década, a Sagres chega ao continente americano, acompanhando a diáspora nos EUA e no Canadá. Com a independência das colónias, inicia a sua exportação para os PALOP
Atualidade
A Sagres é vendida em 38 países. O principal mercado é Angola.
A Super Bock encontra-se à venda em mais de 50 países. O principal mercado é Angola.
O Sumol pode ser bebido em 70 países. O principal mercado é Angola.