Mário Cláudio, 69 anos, não se ofende se eu disser que ele tem espírito de caravanista. Encontrámo-lo num destes dias no centro de Paredes de Coura para uma entrevista-itinerante pela região, que ele conhece bem. O escritor quis perceber o projeto da Caravana VISÃO, saber por onde já andámos, se as pessoas das terras por onde passámos se têm interessado.
Também perguntou se ao longo desta viagem temos entrevistado outros “escritores de província”, expressão rara que, mesmo sem mais nada, diz logo muito do entrevistado. Mário Cláudio vive no Porto, mas é como “escritor de província” que se identifica. Recuperou uma casa na aldeia de Venade, perto de Paredes de Coura, mantendo-lhe a traça típica da região. E é aqui que assegura a ligação à terra. Não é casa de família, essa era em Cabreiros, entre Braga e Barcelos, mas foi vendida a seguir ao 25 de abril. “Tive pena e, por isso, quis comprar esta”, conta.
Aqui é para deixar o tempo passar. Não tanto quanto gostaria, afazeres cosmopolitas e obrigações profissionais o impedem. “Se pudesse fixava-me aqui e tornava a casa do Porto numa segunda casa”, explica Mário Cláudio. Venade deveria ser mais um lugar de descanso, não tanto de trabalho, de escrita. A propósito, tem livro pronto, a sair na próxima semana: uma biografia de Tiago Veiga, poeta nascido aqui no Minho cuja obra Mário Cláudio se tem dedicado a divulgar.
Sentado no banco da frente da Caravana VISÃO, seguimos o percurso do nosso guia de excelência. Passamos pela Igreja da Senhora do Livramento, “muito popular no tempo da guerra colonial”. Avistamos casas abandonadas, falamos de famílias tradicionais, de aristocratas que às criadas deixaram heranças.
Salienta Mário Cláudio: “Como a aristocracia daqui é a mais velha de Portugal, foi aqui que nasceram as grandes casas nobres. Muitas dessas famílias acabaram depois por se ruralizar e algumas dessas pessoas trabalham a terra. É importante pensar no Minho nestes termos”.Passamos também pelo Santuário de São Bento de Porta Aberta, por uma ponte romana que ligava Braga a Astorga, por um albergue de peregrinos e pela antiga igreja romana de São Pedro de Rubiães. Vemos uns quantos espigueiros (e, já agora, é espigueiros porque estamos no Alto Minho, no Baixo Minho seriam canastros e, na zona litoral, caniços). Chegamos finalmente a Romarigães, onde está a casa em que Aquilino Ribeiro se inspirou para escrever A Casa Grande de Romarigães. “Ele passou aqui muito pouco tempo, pois no inverno isto era insuportável. Mas serviu de pretexto para o livro e isso já foi importantíssimo”, comenta Mário Cláudio. A casa está parcialmente alugada a um conhecido empresário da região, que ali tem viveiros. A parte restante da Quinta do Amparo ainda é utilizada pelo filho de Aquilino Ribeiro, Aquilino Ribeiro Machado, antigo presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Para lá do grande portão de ferro crescem ervas daninhas e flores do campo.