Quer ajudar na luta contra o Covid-19? Esteja em quarentena voluntária, em regime de teletrabalho ou a fazer uma vida normal, dentro do possível, só precisa de ter um computador em casa ou no trabalho, mesmo que a uso. A ajuda é tão simples como doar uma parte – quanto, o leitor decide – do poder de processamento do seu computador para ajudar investigadores na luta contra doenças como o cancro da mama ou do rim, a Alzheimer, a doença de Parkinson e, agora a grande prioridade, o Covid-19. Basta fazer download deste programa e instalá-lo.
O programa chama-se Folding@Home e, na prática, permite que os computadores pessoais, dos mais fracos aos mais potentes, possam contribuir para a resolução mais rápida de problemas matemáticos de investigações científicas. Depois de ter anunciado na semana passada que iria dedicar-se também ao estudo do novo coronavírus (SARS-CoV-2), a contribuição feita pela comunidade já permitiu identificar a estrutura da proteína que constitui ponto de ligação do novo coronavírus às células humanas.
“Podemos afirmar que já é um avanço conseguido com estas contribuições. Em vez de ser na segunda-feira [16 de março], se calhar seria [alcançado] daqui a uma semana e meia. [As contribuições] Estão a garantir que os cientistas têm acesso à informação”, explica Pedro Valadas, membro do conselho de comunicação da Folding@Home, em entrevista à Exame Informática.
O português de 34 anos é mais conhecido por ser o fundador da comunidade de entusiastas de computadores PC Master Race (PCMR), mas quando a mãe faleceu de cancro, aproximou-se do projeto Folding@Home e em 2019 tornou-se membro do conselho de comunicação. “O Folding@Home é um projeto muito científico, criado em laboratórios dentro das universidades e há uma grande necessidade de fazer tradução da linguagem científica, de pessoas que têm dificuldade em traduzir a capacidade para a descoberta científica para a comunicação comum, para que as pessoas possam perceber como ajudar”, sublinha.
Atualmente são 11 os laboratórios de investigação que estão ligados ao Folding@Home, que nasceu na Universidade de Stanford, nos EUA, no ano 2000. Em cada um destes laboratórios há projetos de investigação em desenvolvimento – como é que determinada proteína se comporta na presença de um determinado componente, por exemplo – que necessitam de um grande poder de processamento, nem sempre disponível. É aqui que entra a comunidade.
Um por todos, todos por um
Ao doar parte do processamento do seu computador vai contribuir para a resolução de um problema maior. As investigações são divididas em “unidades de trabalho”, que são colocadas nos servidores da Folding@Home. Cada unidade de trabalho é depois distribuída por milhares de computadores que estão a executar o programa. “Cada um faz [o processamento] em ambiente offline e quando estão prontos devolvem os resultados para os nossos servidores”, detalha Pedro Valadas. Sem o esforço de todos, os cálculos provavelmente demorariam meses até estarem concluídos, diz, pois também é preciso contabilizar a necessidade de confirmação dos resultados.
Por ter sido declarada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma pandemia, o Covid-19 fez estalar uma onda de contribuições em todo o mundo. Os valores começaram a aumentar no início do mês de março, mas foi já no final da semana passada que se deu o grande salto, graças aos apelos feitos nas redes sociais, incluindo de grandes tecnológicas como a Nvidia e a AMD. Em casa, Pedro Valadas, o entusiasta dos PC que é advogado de profissão, tem uma placa gráfica Nvidia RTX 2080 Ti a contribuir constantemente para a Folding@Home.

Devido ao volume de contribuições, os servidores da Folding@Home estão a sofrer alguns problemas de estabilidade, mas isto não significa que já não são necessárias mais contribuições – bem pelo contrário. Atualmente já há pelo menos uma grande tecnológica em conversações para garantir mais capacidade de resposta à Folding@Home, pelo que quantos mais computadores contribuírem nos próximos tempos, melhor: pelo Covid-19, mas também pelas investigações a outras doenças que ainda estão em curso.
“Diria que, mais do que portugueses, somos cidadãos globais e esta pandemia é uma representação disto. No mundo tecnológico atual, ninguém é impotente, todos podemos ajudar, o objetivo é dar poder às pessoas através da boa vontade e os portugueses sempre mostraram enorme vontade de ajudar. Podemos pôr o poder tecnológico atrás desta vontade e contribuir para o País e para a Humanidade”, acrescentou o porta-voz da iniciativa.
“É essencial garantir o poder computacional para que o projeto continue”, sublinhou.