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No dia 21 de fevereiro de 2014, o Tribunal Administrativo de Lisboa rejeitou uma providência cautelar apresentada pela PT com o objetivo de travar o concurso público internacional que selecionou os fornecedores dos serviços de rede e internet para mais 6000 escolas públicas e 20 organismos tutelados pelo Ministério da Educação e Ciência (MEC). Podia ter sido o fim de um processo polémico, que já contava com um atraso de mais de três anos, mas não foi: em maio, a Oni informou os serviços do MEC de que iria desistir dos dois lotes que lhe foram atribuídos no concurso – e em consequência abdicou também de uma receita de mais de seis milhões de euros relativos aos custos de interligação de quase todas as escolas públicas das regiões centro e sul de Portugal Continental.
Tendo em conta que a Oni já havia classificado a providência cautelar da PT como uma «manobra dilatória», a desistência assume contornos de final inesperado no dossiê que envolve a segunda maior rede informática do país (o Multibanco é a primeira). Os resultados não se fizeram esperar: a PT, que ganhou os dois lotes que agregam as escolas da região Norte e a ligação entre institutos e departamentos do MEC, e a Optimus (agora integrada na Nos), que garantiu a gestão de tráfego e segurança da rede, assinaram os contratos a 10 de março de 2014. Os dois lotes que foram alvo da desistência da Oni só viriam a ser contratualizados a 31 de outubro.
Questionado pela Exame Informática, o MEC classifica a desistência da Oni como «penalizadora, na medida em que veio atrasar o processo de contratação de dois dos três maiores lotes a concurso».
Na sequência da notificação de desistência, o MEC aplicou as penalizações previstas pelo Código de Contratação Pública, anulou a adjudicação e iniciou conversações com o segundo classificado no concurso. E foi assim que a PT, que durante três anos, garantiu a rede de todas as escolas através de ajustes diretos e extensões cujos valores totais nunca foram revelados pelo governo e acabaram mesmo por ser “chumbados” pelo Tribunal de Contas, acabou por ganhar a gestão de toda a rede das escolas, com a exceção do lote avaliado em 482 mil euros que foi atribuído à Optimus.
Durante os próximos três anos, a PT vai receber 9,7 milhões de euros pela manutenção de quatro dos cinco lotes do concurso de seleção de fornecedores da redes das escolas.
O MEC desvaloriza o facto de a PT, devido à desistência da Oni, ter garantido o fornecimento dos serviços de rede de todas as escolas públicas – um cenário, que excetuando o lote atribuído à Optimus, não destoa muito do anterior ao concurso internacional. «O concurso é público e não havia, portanto, preferências do MEC. O facto de uma empresa ter ficado com quatro dos cinco lotes, quando isso ocorre de acordo com as regras da concorrência, não nos coloca qualquer problema», reitera o MEC em resposta institucional, enviada por e-mail.
O que terá levado a Oni, uma pequena operadora especializada no segmento empresarial, a desistir de dois contratos que ascendem a mais de seis milhões de euros e que poderiam servir de prova de capacidade técnica e comercial? Nos bastidores, há quem garanta que a Oni invocou a falta de rentabilidade dos dois lotes que valem mais de seis milhões de euros. É uma tese que não pode ser confirmada junto do remetente e do destinatário da notificação de desistência: a Oni recusa fazer qualquer comentário sobre o assunto; o MEC comenta outras questões relacionadas com o desfecho do concurso, mas nada adianta sobre as justificações invocadas pela Oni aquando da desistência.
Nem um ano passou desde então, mas o setor das telecomunicações apresenta hoje um cenário bem diferente daquele que se registava em maio de 2014. Tudo se precipitou em junho com as primeiras notícias, avançadas pelo Expresso, que davam conta de um buraco milionário nas contas da Rioforte – e o consequente financiamento do grupo GES através de quase 900 milhões de euros que estavam na tesouraria da PT.
Só em outubro surgiriam as primeiras notícias que davam conta do interesse da Altice, detentora da Oni e Cabovisão, em comprar a PT à brasileira Oi. O negócio avaliado em 7,4 mil milhões de euros recebeu na passada segunda-feira, a luz verde da Comissão Europeia, mas com uma condição: para comprar a PT, a Altice vai ter de vender a Oni e a Cabovisão. Resultado: mesmo sem saber o que estava a acontecer na operadora concorrente, a decisão de desistência da Oni acabou por garantir que a rede das escolas se mantinha numa empresa da Altice – desta feita, através da PT, cuja compra está em vias de ser concluída.
Quem comprar a Oni (as mais recentes notícias dão conta do interesse da Vodafone) vai deparar-se com um cenário diferente daquele que a Altice vai encontrar na PT: de acordo com o Código dos Contratos Públicos, os casos de desistência podem ser alvo de coimas máximas de 44.800 euros que podem ser acrescidas do impedimento de participação em concursos públicos por um máximo de dois anos.
Por Hugo Séneca