No dia da Internet Mais Segura, Sofia Rasgado, coordenadora do consórcio Centro Internet Segura, faz um balanço sobre as duas linhas criadas para a recolha de denúncias de conteúdos ilegais, violentos ou persecutórios na Internet e também queixas de potenciais vítimas de cyberbullying.
Na Linha Alerta, que tem como objetivo recolher denúncias de conteúdos ilegais na Internet, foram reportadas 956 casos de potencial ilicitude (discursos de ódio, pornografia infantil, etc.) durante de 2018. Depois de analisar o total de denúncias, o Centro Internet Segura encaminhou para análise de entidades competentes cerca de 150 casos que, comprovadamente, estão à margem do que deve ser uma Internet que respeita o próximo. Para a Linha Internet Segura, não são fornecidos os números absolutos, mas as percentagens permitem confirmar que é o sexting que motiva mais queixas para o número 800 21 90 90.
Hoje, o Dia da Internet Mais Segura é assinalado com uma conferência organizada pela Fundação para a Ciência e Tecnologia no Funchal, com presença de vários especialistas internacionais.
Que balanço faz do trabalho levado a cabo pelo Centro Internet Segura em 2018?
O Centro tem duas linhas com propósitos específicos: a Linha Alerta e a Linha Internet Segura. A Linha Alerta contempla denúncias de conteúdos ilegais relacionados com o abuso sexual de menores, a apologia da violência e a apologia do racismo. Chamamos-lhe Linha, mas funciona muito mais como um formulário na Internet. O utilizador, sempre que encontra um conteúdo que avalia como ilegal, pode copiar o link para nosso formulário, para análise de conteúdos através dos nossos mecanismos e ferramentas. E (no caso de se justificar) encaminhamos esses links para as entidades com que celebrámos protocolos. Apesar de termos tido menos denúncias reportadas na Linha Alerta em 2018, a percentagem de casos validados como positivos, com conteúdos considerados ilegais, é semelhante. O que corresponde a 14% a 15%.
São essas as percentagens de casos positivos com conteúdos ilegais!?
Só fazemos o rastreio. Depois encaminhamos para as entidades responsáveis, a PJ, ou a rede europeia que faz a articulação com congéneres europeias e também com a Europol. A maioria destes casos de conteúdos ilegais não estava alojada em Portugal.
Quantos casos são estes?
Em 2018, foram cerca de 150 os casos de conteúdos ilegais entre quase 1000 casos reportados.
E na Linha Internet Segura?
É uma linha que presta esclarecimentos de forma anónima e confidencial. Temos como objetivo contribuir para uma cultura do uso mais consciente e informado das tecnologias da informação. São principalmente adultos que nos contactam, independentemente do género. Em 2018, tivemos resultados muito próximos de queixas de homens e mulheres. Comparando os dois anos, destaca-se uma maior preocupação com as questões de relacionamento e da sexualidade online. Por sexualidade online entendemos sexting, sextortion, imagens ilegítimas… Foi esta a temática que levou a fazer mais contactos para a Linha Internet Segura.
Há mais casos na Linha Internet Segura que a na Linha Alerta?
São duas linhas completamente diferentes. Na Linha Alerta não acompanhamos as pessoas nem falamos com elas. Apenas analisamos o link que nos é enviado. A Linha de Internet Segura é uma linha de apoio, com conversa com as pessoas que ligam para cá, ou para encaminhar as pessoas para outros serviços que possam intervir, como a Polícia Judiciária, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) ou o Instituto de Apoio à Criança (IAC). Há uma nuance muito importante: em 2019, iniciámos um projeto cofinanciado pela Comissão Europeia. Houve um alargamento do consórcio, com a entrada da APAV. Neste momento, a APAV tem como incumbência a operacionalização das duas Linhas. Durante algum tempo foi a Fundação para a Ciência e Tecnologia que teve a cargo a operacionalização das Linhas. Mas em 2019 quem vai ter essa função é a APAV. É uma grande mais-valia, porque tem experiência ao nível do apoio das vítimas.
Sim, mas não nos pode fornecer números?
Na Linha Internet Segura posso dar-lhe as percentagens relativamente às temáticas. Tivemos 31% dos casos estavam relacionados com sexting, extorsão sexual online, e partilha não consensual de imagens íntimas. Depois tempos questões técnicas associadas a redes sociais com 24%; questões técnicas associadas a malware e questões segurança 13%; compras online, banca online e burlas associadas com 11%; cyberbullying com oito por cento; e técnicas associadas a suporte parental com sete por cento; roubo de identidade online com 3% e fake news com 2%.
Não revela os números absolutos?
Não, não posso revelar esses dados. Esta é uma linha que tem uma atuação no terreno que lida com dados que não podem ser comparados com números de outras entidades. Notamos que tem havido cada vez mais um esforço da nossa parte pela divulgação – e que esta Linha tem sido cada vez mais utilizada.
Será que estes dados aqui reportados serão apenas a apenas a ponta de um icebergue?
A Internet espelha a vida real. O nosso comportamento online acaba por ser também o comportamento offline. Claro que com o anonimato, as pessoas tomam comportamentos que vão um pouco além dos comportamentos que tomariam num espaço offline. E por isso decidimos dedicar os eventos relacionados com a Internet Mais Segura à temática dos direitos humanos online. Uma das razões é a existência de discursos de ódio.
Será que as queixas apresentadas na Linha Internet Segura serão apenas uma parte reduzida do total de casos realmente verificados?
Acho que cada vez mais as pessoas têm consciência de que sempre que são vítimas de algo que acontece na Internet podem pedir ajuda. E digo isto pela sensibilidade que temos do trabalho que temos feito com o consórcio, nomeadamente pela Direção Geral de Educação, que trabalha com toda a comunidade escolar e que tem desenvolvido uma série de recursos e atividades nas escolas para a área do bullying. É um trabalho que tem por objetivo capacitar os jovens para estarem atentos quando estas situações sucedem e pedirem ajuda aos pais ou aos professores. Cada vez mais a sociedade está alerta para este tipo de comportamentos. A Linha da Internet Segura é uma das opções, mas há outras… nas escolas há professores, e há outras entidades que contribuem com certeza para esta sensibilização e dar resposta a estas situações.
O cyberbullying deu novas ferramentas ao desejo de vingança…
Quando falamos do bullying falamos de uma relação dirigida apenas para um indivíduo, mas quando falamos de cyberbullying a ação pode ser dirigida a um único indivíduo, mas ganha uma escala de divulgação que é exponencial. Em termos de impacto, a agressão acaba por ser muito mais nefasta.
Os efeitos podem ser bem diferentes do bullying que não é feito na Internet!
Pois, essa é a questão que se prende com o anonimato, porque a pessoa sente de alguma forma que tem algo que o protege e lhe permite ter algumas atitudes que nunca teria face a face. E há ainda o histórico que nunca é eliminado. Uma vez online, para sempre online. Esse é um dos riscos que tentamos ensinar nas nossas ações de sensibilização: quais são os riscos de estar online e o que é que jovens e crianças podem fazer para minimizar esses riscos… relacionados como a partilha de imagens que podem ser usadas noutros contextos. Há um conjunto de informação que tentamos passar para que se possa fazer uma navegação segura, com os benefícios que a Internet tem.