Quando se trata de salvar vidas, todos os minutos contam. E foi isso que levou Pedro Monteiro e outras pessoas, que estavam a contribuir para o Project Open Air, a criarem um grupo mais pequeno, mas ao mesmo tempo mais ágil, para o desenvolvimento de um ventilador de especificações acessíveis a todos (open source). O Air4All arrancou apenas no dia 13 de março e na próxima semana, se tudo correr como planeado, já estará pronto para cumprir os primeiros testes de desempenho.
Os mais de 80 voluntários do Air4All estão, em bom rigor, a desenvolver dois ventiladores: um de sistema pneumático, que pode ser ligado às plataformas de oxigénio e ar comprimido que já existem nos hospitais portugueses; e um outro, de sistema mecânico, que está a ser projetado como uma alternativa para ser usada em locais onde não existe ligação a sistemas de gases – como em lares e algumas ambulâncias.
No momento em que falava com a Exame Informática, Pedro Monteiro estava num laboratório de ventiladores a calibrar o modelo pneumático do Air4All, aquele que tem recebido prioridade de desenvolvimento por parte do grupo, por ser o que permite colmatar de forma mais rápida uma eventual insuficiência de ventiladores nos hospitais, devido à crise de saúde provocada pela Covid-19, como também é aquele que vai exigir a menor curva de aprendizagem aos médicos.
“Percebemos cedo que a questão do controlo do ventilador é um ponto crítico e focamos muito o desenvolvimento naquilo que é o controlo de ventilação”, explica sobre o elemento que diferencia o Air4All de outros projetos de ventiladores open source que estão a ser criados um pouco por todo o mundo. “E aquilo que os médicos se queixam é que a curva de aprendizagem [dos ventiladores open source] é longa e nós queremos encurtar isso, com uma interface de utilizador mais simples”, acrescenta.
Para acelerar o desenvolvimento do projeto, estão a ser escolhidos componentes e acessórios já certificados para a indústria farmacêutica e hospitalar. “A nossa opinião é que isto não pode ser simplesmente um sistema de recurso com durabilidade limitada, tem que oferecer uma alternativa às pessoas para sobreviverem. Isto não pode ser um medicamento que ninguém sabe exatamente o que faz ao fim de 24, 48 ou 72 horas”, sublinha Pedro Monteiro, que além de voluntário no Air4All, é diretor executivo da empresa de compósitos Morphis Composites.
A nossa opinião é que isto não pode ser simplesmente um sistema de recurso com durabilidade limitada, tem que oferecer uma alternativa às pessoas para sobreviverem. Isto não pode ser um medicamento que ninguém sabe exatamente o que faz ao fim de 24, 48 ou 72 horas
Pedro Monteiro, ceo da Morphis Composites
A equipa de voluntários conta ainda com investigadores do Instituto Superior Técnico, da Fundação Champalimaud, da Fundação Gulbenkian, e com informáticos e engenheiros de várias empresas portuguesas. Uma dessas empresas é a fabricante de impressoras 3D Beeverycreative.
“A Beeverycreative já tinha a equipa de desenvolvimento a identificar o que podíamos pôr à disposição, oferecer mesmo, algumas peças de máquinas descontinuadas. Mas a equipa ao mesmo tempo, como makers que são, queria participar. Desde logo disse sim, usem tudo o que a empresa tiver, e juntaram-se ao que o Pedro estava a fazer”, conta Aurora Baptista, diretora executiva da tecnológica de Aveiro.
Três elementos da unidade de investigação e desenvolvimento da Beeverycreative estão a colaborar no Air4All, mas mais focados no modelo mecânico. “O modelo já fez a terceira iteração de prototipagem, esteve mais de 24 horas a funcionar e agora está a ser preparado para a industrialização”, conta a CEO.
Com os protótipos de prova de conceito já desenvolvidos, a equipa da Air4All vai receber uma nova ronda de feedback de médicos para passar à industrialização do modelo pneumático, isto é, tentar reduzir o tamanho do equipamento e pensá-lo de forma a que possa ser fabricado de forma simples. “Uma pequena linha de montagem conseguirá ter uma produção bastante interessante”, projeta Pedro Monteiro.
O modelo já fez a terceira iteração de prototipagem, esteve mais de 24 horas a funcionar e agora está a ser preparado para a industrialização
Aurora Baptista, CEO da beeverycreative
Na próxima semana o equipamento já deverá estar pronto para a fase de testes. Ao mesmo tempo, a equipa está em contacto com o Irfamed para obter certificação. Se receber luz verde, há também toda uma linha de apoio de produção pronta a entrar em ação por parte de empresas portuguesas: fábricas de injeção de plástico, de estampagem de chapas, de produtos hospitalares, fábricas de cablagens e de fabrico de PVC mostraram-se disponíveis para colaborar no projeto.
“Temos pessoas extraordinárias no nosso país dispostas a abdicarem de margens de lucro e interesses pessoais para salvar pessoas. Nunca pensei passar por uma pandemia, nem por uma resposta humana desta grandeza”, conclui o porta-voz da Air4All.