Um conjunto de cientistas e empreendedores estão atualmente no Ártico a criar buracos no gelo para bombear a água por baixo e trazê-la para cima, de forma que congele na superfície. A equipa da startup Real Ice está na Baía de Cambridge, na aldeia de Nunavut, a concretizar este plano que tem como objetivo recongelar mais de 386 mil milhas quadradas do Ártico. A intenção final é atrasar ou mesmo reverter as perdas de gelo que acontecem no verão e ajudar a contrabalançar o efeito da atividade humana nas alterações climáticas.
Como avança a CNN, alguns especialistas vocalizaram críticas a esta empreitada, defendendo que os métodos não provaram ser bem sucedidos em grande escala, apresentam um risco ecológico e estão, no fundo, a ser uma distração face à raiz do problema das alterações climáticas, que descrevem ser o uso de combustíveis fósseis. Do lado da Real Ice, no entanto, a empresa afirma ter sido inspirada em processos naturais e de constituir uma última hipótese para proteger um ecossistema que está em vias de desaparecer.
Desde a década de 1980 que o gelo espesso no Ártico diminuiu 95% e o gelo que permanece ainda é fino e ‘jovem’. Alguns cientistas preveem que, a este ritmo, não exista qualquer gelo na região em 2030. Caso se confirme, este é um cenário preocupante pelas suas várias consequências.
A equipa da Real Ice atua ao colocar bombas submersíveis em vários locais que trazem a água dos mares para cima da superfície do gelo e deixá-la a congelar. Andrea Ceccolini, co-CEO da empresa, afirma que este método também permite remover a neve de cima do gelo, libertando-o dessa camada isoladora e ajudando ao crescimento adicional na parte inferior do bloco de gelo.
O grupo tem vindo a fazer testes no gelo há dois anos, começando no Alasca. Os primeiros testes destinavam-se a validar que o equipamento a usar iria ‘sobreviver’ em temperaturas gélidas. Depois, a equipa chegou ao Canadá este ano e cobriu cerca de 13 mil metros de gelo, adicionando-lhe uma camada extra de 50 centímetros. Agora, em novembro, a equipa já cobriu uma área de 131 mil metros quadrados e, em apenas 10 dias, conseguiu uma camada de gelo de mais de 10 centímetros. Os investigadores vão regressar para novas medições no final do ano e depois em maio e estimam conseguir aumentar a espessura do gelo entre 50 e 100 centímetros.
O plano final passa por automatizar o processo, com recurso a drones submarinos, alimentados a hidrogénio ‘verde’ que usarão brocas aquecidas para perfurar o gelo. A Real Ice quer colocar cuidadosamente 500 mil drones, para não interferir com a migração dos animais naquela região, num projeto com custos avaliados entre cinco e seis mil milhões de euros.
Liz Bagshaw, professora na Universidade de Bristol, classifica a solução como sendo “extremamente questionável” e alertando que estas intervenções são “moralmente dúbias, no mínimo, e pior ainda, eticamente irresponsáveis”. Dezenas de cientistas alertaram que este tipo de projetos de geoengenharia polar podem ter “consequências graves imprevistas”.