Já vem de longa data a relação de Nuno Silva, gestor de projeto na Deimos Engenharia, com o planeta Marte. Esteve envolvido no desenvolvimento do sistema de piloto automático da missão europeia, adiada múltiplas vezes, Exomars e nos anos de 2011/12 participou, enquanto membro da Airbus, na definição da missão que hoje poisa no Planeta Vermelho. “Deveria ter sido uma missão conjunta entre a NASA e a Agência Espacial Europeia”, recorda, sendo a Airbus o parceiro industrial. A construção do rover ficaria a cargo da agência americana – aproveitando sobras, peças suplentes, da missão Curiosity (que chegou a Marte em agosto de 2012), e a Europa tomava conta do software. Ao fim de dois anos de trabalho de engenharia conjunto, a NASA decidiu partir sozinha, desistindo da missão conjunta.
“O Perseverance é em muitos aspetos semelhante ao Curiosity”, nota o engenheiro, que identifica muitas parecenças entre a missão que hoje chega ao destino e o que há dez anos foi discutido nas reuniões a três – NASA, ESA e Airbus. E admite algum nervosismo relativamente aos riscos da missão. “É sempre um desafio aterrar em Marte”, observa. Há a atmosfera fina, fina, que torna muito mais difícil a estabilidade da descida, as tempestades de areia, as dificuldades de comunicação que obrigam a que tudo seja automatizado. “Não tem nada a ver fazer um satélite para enviar para o espaço e desenhar um rover para poisar em Marte.” Nuno Silva admite a primazia da América relativamente à Europa. “A NASA atingiu um ponto em que já domina a componente da aterragem do rover. Isto está resolvido. Por isso pode agora concentrar-se nos aspetos científicos da missão, nos instrumentos a bordo. A Europa ainda está a tentar resolver as duas componentes.”
Lançada em julho do ano passado, a partir de Cabo Canaveral, esta será a mais avançada de todas as missões americanas, tendo como objetivo procurar resquícios de vida no planeta, em particular na cratera de Jezero – o que sobra de um antigo lago, que existiu há quase quatro mil milhões de anos.
Não há grandes segredos para o sucesso americano, diz Nuno Silva: “Dinheiro e mais dinheiro”. Já a burocracia euopeia pesa. “A questão organizacional da Europa está a custar muitos atrasos. Que não são motivadores para a indústria. Vinte por cento do nosso tempo é gasto a negociar contratos”, aponta. Mesmo assim, Nuno Silva acredita que em breve estaremos no ponto em que as viagens a Marte se tornarão “rotineiras.”
Se tudo correr bem, depois de pousar no solo marciano, o rover Perseverance dará início à sua missão de partir pedaços de rocha com uma broca, recolher as amostras de rochas e colocar em quarenta recipientes – duas outras missões que se seguirão terão como objetivo transportar o material até à órbita de Marte e depois até à Terra.
A Exame Informática ira acompanhar os momentos finais da missão, acompanhada pelos dois engenheiros aeroespaciais, Nuno Silva e Nuno Ávila, também da Deimos Engenharia.