Hotéis, casas particulares, SPA entre Lisboa e Singapura, com passagem pelo Brasil ou por Angola. A Viterbo Interior Design, fundada em 1971 por Graça Viterbo e, agora, nas mãos da filha Gracinha – que assumiu a direção de projetos da empresa em 2008 – e do genro Miguel Vieira da Rocha, sócio e diretor financeiro, tem-se afirmado cada vez mais como uma empresa de reconhecido mérito nacional e internacional, e nem a pandemia a fez abrandar.
“Ao nível de projeto, quase não houve confinamento, mas uma intensidade de trabalho enorme”, começa por dizer à EXAME a designer de interiores. “Eu não senti o confinamento, também porque já vivemos fora e já fazíamos muito trabalho remoto. Não houve ninguém em layoff e a empresa continuou a trabalhar a todo o gás”, congratula-se a empresária.
Depois de ter fechado o ano com uma faturação a rondar os €2 milhões – e que se te tem mantido relativamente estável ao longo dos últimos, pelo menos, cinco anos, segundo dados compilados pela Informa D&B –, a Viterbo Interior Design entra em 2021 com a mesma capacidade de trabalho e com vários projetos novos em mão. Miguel explica que, apesar de ter havido uma espécie de pausa na entrada de negócios durante o “Grande Confinamento”, a verdade é que, assim que setembro chegou, o ateliê voltou a encher-se de pedidos. Para o casal, este foi um sinal de confiança não apenas na sua empresa, que com cinco décadas de mercado é uma das mais reconhecidas, mas também no País que continua a atrair investidores. Durante o primeiro período de recolhimento obrigatório, os pedidos foram sobretudo de clientes particulares que revelaram “bastante interesse em fazer com que funcionassem espaços onde se pudesse jantar e trabalhar, espaços de ritual, de convívio…”, conta, com uma gargalhada, Gracinha, aproveitando para dizer que a gestão da crise foi praticamente feita pelo marido que ela apelida de “expert em crisis management”.
A verdade é que o casal assumiu a gestão da Viterbo em 2008, precisamente no início da primeira grande crise financeira do século XXI, e cerca de dez anos depois deparou com outra. “Não se nasce a saber gerir crises”, começa por dizer o responsável, com um sorriso. “O grande segredo é a equipa, são as pessoas com que nos rodeamos”, garante. “Em altura de crise, temos todos de fazer sacrifícios, somos todos responsáveis, mas a equipa mostra também quem são os pilares da empresa. Desde que assumimos a gestão da Viterbo, tivemos um cuidado adicional com o género de colaboradores que contratamos. Precisamos de ter pessoas com paixão, e isso tem sido uma coisa determinante. A maior parte delas está connosco desde a primeira crise”, revela ainda. Atualmente, o ateliê conta com 22 trabalhadores a tempo inteiro, entre mestres artesãos, designers, arquitetos de interiores, gestores de projeto, departamento de orçamentação e equipas de controlo de qualidade. Além dos postos de trabalho diretos, os gestores da Viterbo garantem ter um compromisso muito sério com os prestadores de serviços com os quais trabalham há vários anos. “Temos mesmo uma missão, para além do nosso trabalho interno que é dar trabalho para toda uma indústria”, reforça Miguel.
“Temos um nome forte no mercado – com cinco décadas de história –, mas isso traz-nos também muita responsabilidade no foco de ter uma empresa inovadora. O facto de termos uma obsessão em inovar e em sermos cada vez melhores, não só como empresa mas também como equipa, e adotarmos novas tecnologias na empresa é crucial para acompanhar a indústria e o mercado.”
Tudo isto, em conjunto com uma internacionalização bem estruturada e consistente, que ambos fizeram questão de implementar assim que tomaram as rédeas da organização, fez com que o ateliê atravessasse o ano sem grandes solavancos financeiros. “A internacionalização naturalmente também ajudou muito, porque abrimos a porta da Viterbo para o mundo; não ficámos só limitados ao território nacional e conseguimos chegar a outros projetos que não teríamos aqui. Temos uma estrutura implementada para trabalhar além-fronteiras”, revela o casal. Gracinha e Miguel não só já tiveram um escritório aberto em Luanda como, durante quatro anos e até 2016, se mudaram para Singapura, de onde conseguiram afirmar-se no mercado asiático, com o qual trabalharam consistentemente durante uma década. “Literalmente, todas as terças-feiras, viajava para Banguecoque”, revela a designer que também teve em mãos projetos na Europa ou apartamentos com vista para o mar, no Rio de Janeiro.
É preciso tentar antecipar [problemas e soluções]
Miguel Vieira da rocha
“É certo que os nossos melhores mercados são sempre aqueles onde estamos, na altura. Portanto, atualmente a nossa melhor geografia é Portugal. Os nossos clientes gostam da proximidade.” Mas as portas dos outros continentes mantêm-se abertas e com trabalhos regulares. “Quando tínhamos o escritório em Angola, percebemos que estávamos abertos 24 horas por dia, sete dias por semana, para responder a todos os fusos horários”, recorda a designer com uma gargalhada. “Portanto, também foi uma vantagem para nós essa aprendizagem, para fazer face a esta pandemia. Estamos muito habituados a trabalhar à distância e em cenários diversos”, brincam. E é precisamente por todas essas razões que se torna claro que nem só de uma equipa coesa se faz um caminho financeira e artisticamente sólido. “É preciso tentar antecipar [problemas e soluções]”, adianta Miguel.

No ano passado, especificamente, “percebemos que ia haver uma crise económica. É certo que temos de ter um cuidado muito grande com os custos fixos da empresa, mas o que me vem primeiro à cabeça é onde podemos investir para sairmos da crise mais fortes. E uma das áreas foi a social media, em que aproveitámos o confinamento para investir na parte online”, revela. As contas de Instagram do ateliê e da própria designer, que se dedica também a desenhar uma linha de acessórios e que consagra parte do seu espaço a vídeos sobre educação positiva, foram reavivadas e “estão cada vez mais fortes”, salienta ainda o gestor. Além disto, a empresa decidiu investir num espaço no Algarve, região que considera particularmente significativa.
Para os gestores da Viterbo, era importante ter uma presença física numa área onde assinam muitos projetos, e nem a pandemia os fez recuar, uma vez que, sendo uma empresa que dá especial atenção aos elementos têxteis, acredita que os consumidores e potenciais clientes precisam de ter um espaço onde podem tocar, sentir, cheirar as peças. Além de que, asseguram, “quando tudo isto passar, as pessoas vão voltar a querer isso”.
Ecletismo e muito respeito
Uma visita ao portefólio da Viterbo Interior Design atesta-nos não apenas da diversidade das dimensões dos projetos assinados mas acima de tudo do ecletismo que é possível encontrar nos serviços que prestam. Para a designer, não há outra forma de trabalhar. “Eu não copio espaços. Eu crio espaços para o meu cliente. Respeito a vontade dos clientes, o seu estilo, os códigos culturais, e há um lado de religião, de cultura, que tem de ser tido em conta. Há um lado que percebi em África, por exemplo… as cores são absorvidas de forma diferente consoante o lugar onde estamos. Isso tem de ser tido em conta. Há um lado antropológico da profissão que obriga a um enorme respeito cultural”, salienta.
As cores são absorvidas de forma diferente consoante o lugar onde estamos. Isso tem de ser tido em conta. Há um lado antropológico da profissão que obriga a um enorme respeito cultural
gracinha viterbo
“Já tive de desenhar uma sala de oração indiana e precisei de estudar tudo sobre o assunto, porque não sabia nada”, admite. Conhecida pela irreverência e pela disrupção que geralmente transporta para os projetos que assina, Gracinha tem-se afirmado, tal como a mãe há muitas décadas, como uma das mais importantes embaixadoras da qualidade nacional. Com uma formação internacional muito diversificada – estudou no Liceu Francês, em Lisboa, depois foi estudar design para Londres e nunca deixou de viajar por todo o mundo para acumular culturas e conhecimento –, torna-se difícil dizer que um projeto é assinado por Gracinha Viterbo, a não ser por lhe reconhecermos a coragem e um profundo conhecimento na utilização de têxteis, de cores e de pequenos elementos que se destacam.
“Acho que somos formatados para sermos todos iguais e eu venho a ser o elemento disruptivo que quer centrar as pessoas na sua identidade”, justifica. “A pessoa gosta de uma experiência que tem num hotel… pode ter essa experiência em casa. É importante conseguirmos proporcionar isso. A pessoa precisa de viver a saber quem realmente é”, defende a artista que lamenta ainda que haja algum receio em arriscar mais neste campo. Para Gracinha, o segredo de um projeto, ou de uma casa, de um espaço onde as pessoas se sentem bem, é precisamente o facto de ele poder dizer algo sobre quem o utiliza. “Acho que as pessoas, hoje em dia, querem descobrir quem são. E eu quero ajudá-las a celebrar quem elas são. Honestamente, creio que está a haver uma viagem para dentro de nós”, admite. Nascida e criada num ambiente propício à imaginação e à criatividade – recorde-se que também a mãe, Graça, foi sobejamente premiada durante a sua carreira –, a designer confessa que adora o que faz e que essa procura pelo estilo de cada cliente é uma das coisas que mais a entusiasmam. “Sou incapaz de dar a mesma resposta [a um cliente, a uma instituição], porque nunca é a mesma historia, a mesma pessoa, o mesmo estilo. E tenho uma curiosidade enorme e uma vontade grande de desenvolver logo um estudo.”
Já com várias distinções arrecadadas no País e fora dele, a designer de interiores não nega que é também para estas que trabalha. “Faz parte da minha missão dar isso ao cliente, assegurar prémios! Faz parte da minha missão dar uma certa categoria ao projeto para pô-lo no mapa”, admite com orgulho. New York Times, Bloomberg International Property Awards, Andrew Martin Interior Design Awards ou Luxury Lifestyle Awards são alguns dos palmarés em que consta o nome Viterbo, seja por projetos nacionais, como o Hotel Bela Vista, Relais&Chateaux, no Algarve, seja por projetos internacionais, como vários dos que assinou em Singapura e que a elevaram à posição de Melhor Designer de Interiores daquele país.
Na mira dos investidores
Portugueses orgulhosos, apesar do percurso internacional e da necessidade de continuar a marcar pontos pelo mundo, o casal acredita que o País tem uma posição única para continuar a afirmar-se como destino. Miguel acredita que vai continuar a haver quem escolha Portugal para viver e, no mesmo sentido, não tem dúvidas de que, “daqui a dez anos, o País vai ser ainda mais internacional e vai atrair muitos empresários proeminentes de todo o mundo, que vão trazer consigo empresas e colaboradores mais importantes…”
O empresário garante que “temos tudo para ser um País com um crescimento acima da média da União Europeia. Mas, naturalmente, isso depende dos incentivos que os governos vão dar nos próximos anos. Seria uma pena não aproveitar a posição que Portugal conseguiu atingir”. Aproveita, ainda, para pedir que as instituições não estraguem o caminho que já foi feito e considera que seria significativo manter os vistos gold, mesmo que com regras diferentes para quem quiser investir nas cidades, em moradias ou apartamentos. Para Miguel, uma das soluções pode passar por dar incentivos mais apelativos a quem investir no Interior do País. Além do mais, claro, “a parte fiscal deveria ser incentivada para continuarmos a atrair empresários e talento: tudo elementos que podem acrescentar muito ao PIB nacional”, salienta.
A parte fiscal deveria ser incentivada para continuarmos a atrair empresários e talento: tudo elementos que podem acrescentar muito ao PIB nacional
miguel vieira da rocha
Certo é que, na calha, os dois empresários – que detêm partes iguais da empresa cujo capital está também, ainda que numa percentagem praticamente residual, nas mãos dos pais de Gracinha Viterbo – têm para o arranque do ano vários projetos residenciais, dos quais não podem falar por motivos de confidencialidade, e também dois espaços públicos pelos quais se revelam particularmente ansiosos: “As zonas públicas do Castilho 203 [o projeto de luxo que nasceu no centro de Lisboa e cuja penthouse terá sido comprada, segundo os rumores de mercado, a Cristiano Ronaldo] e um hotel-boutique no Monte Estoril.” Mas há ainda mais alguns em calha e sobre os quais ambos preferem não falar.
Certo é que, num ano em que todos somos convidados a permanecer em casa por muito mais tempo do que estávamos habituados, e num registo que possivelmente nos vai fazer nunca mais voltar a sair do nosso espaço privado durante as habituais 12 horas por dia, o design de interiores ganhou uma nova importância e, decerto, um novo fôlego. Por seu lado, Gracinha Viterbo e Miguel Vieira da Rocha prometem continuar a estar disponíveis para ajudar todos aqueles que querem encontrar quem são através dos espaços que ocupam, com a disponibilidade, a inovação e a criatividade que, ao longo das últimas duas décadas, imprimiram à marca Viterbo, e a fazer crescer o ateliê em idade, estatura e, claro, graça. ENão houve ninguém em layoff e a empresa continuou a trabalhar a todo o gás”.
Artigo publicado originalmente na edição 442, de fevereiro de 2021, da revista EXAME