Teletrabalho, presença física rotativa, reforço do equipamento pessoal de segurança, antecipação de subsídios de férias, despedimentos. Os cenários são tão diversos quanto a dimensão e os setores das empresas contactadas pela EXAME, durante a última semana. O País tinha entrado em estado de emergência há apenas 24 horas quando as últimas respostas chegaram, e há cerca de uma semana que se estava a viver, verdadeiramente, com o Plano de Contingência devidamente implementado: o cenário é ainda assim assustador, apesar das reações rápidas de grande parte das empresas do setor privado.
As organizações foram particularmente céleres a implementar o regime de teletrabalho – a discussão tem anos, com os patrões, sobretudo em Portugal, a duvidar da possibilidade de eficiência dos seus trabalhadores em regime de home office. Agora, apostam as fichas todas neste método. A EDP foi uma das primeiras a reagir, com a experiência de Itália a ajudar – assim que os números de infetados começaram a subir, a elétrica nacional mandou os seus trabalhadores, em Itália, trabalharem em casa. Fonte oficial da elétrica confirmou entretanto que está “a manter o máximo de colaboradores em todos os serviços em regime de teletrabalho” desde dia 11 de março. A empresa definiu mesmo que tem sempre que cumprir um “mínimo de 50% dos colaboradores a trabalhar nesses moldes – mas atualmente esta percentagem é já bastante superior”, garante a empresa à EXAME. São, atualmente, 1 850 os funcionários da empresa liderada por António Mexia que estão a trabalhar em home office.
A EDP mantém, no entanto, um mínimo de equipas “em atividades operacionais críticas nos centros de comando de rede e instalações técnicas dispersas no país, por forma a garantir a resposta operacional em situações de avaria”. E decidiu antecipar o pagamento do subsídio de férias dos funcionários para o final do mês de março, ao invés de o fazer em maio, como habitualmente.
Na rua, em segurança
No mesmo sentido, o Instituto de Soldadura e Qualidade, responsável pela manutenção, por exemplo, da Ponte 25 de Abril e de estruturas aeroportuárias, garantiu que tem mais de 200 colaboradores em teletrabalho. No entanto, realçou fonte oficial da organização, “muitos dos serviços são prestados no cliente e fora de portas”, pelo que para esses casos “foram definidos procedimentos específicos para salvaguardar as pessoas em condições de segurança através nomeadamente da utilização de EPI – Equipamentos de Proteção Individual. Os colaboradores do ISQ são pessoas muito responsáveis e habituadas a trabalhar em condições especiais por via das funções que desempenhamos em infra-estruturas críticas como redes de gás, refinarias, plataformas petrolíferas, aeroportos, barragens, redes de abastecimento…”.
Na indústria papeleira, a Navigator teve que se reorganizar rapidamente, também, para dar resposta à pandemia e às indicações das autoridades de saúde, enquanto a maioria dos seus colaboradores não faz trabalho administrativo. Para isso, explicou fonte oficial da empresa à EXAME, foram instaladas em todas as “fábricas e escritórios áreas de isolamento para o caso de ser detetado um caso positivo (o que até ao momento ainda não se verificou) ou para permitir que os Colaboradores que apresentem sintomas possam ser isolados de imediato e foi ativado o Gabinete de Crise, que integra uma equipa média e várias Direções da Empresa, estando a acompanhar a situação 24/7 (24 horas por dia, sete dias por semana), reunindo todos os dias, ou sempre que se justifique, através de conference call. Já nas fábricas existe um posto médico a funcionar 24/7”.
Entretanto, revelou ainda a mesma fonte, “mais de metade das áreas corporativas” estão a funcionar rotativamente em regime de teletrabalho.
Sem público, mas a todo o vapor
Também a Fidelidade e a Altice, organizações em que que decidiram acolher as recomendações previstas no Plano de Contingência inicial do Governo e ter até 60% dos colaboradores em regime de home office, no caso da empresa de seguros. Já fonte oficial da telecom garantiu à EXAME que a organização estar preparada para ter pelo menos 4 000 trabalhadores a operar desde casa, embora tenha implementado um regime de ausência rotativa do local de trabalho. A Altice decidiu ainda dispensar de assiduidade em regime de home office os trabalhadores que integram os grupos de risco da Covid-19 e as grávidas, e criar um Gabinete de Crise.
No grupo Jerónimo Martins, o teletrabalho também se tornou a regra e, nas lojas, os horários de funcionamento foram reduzidos para tentar proteger o tempo de exposição dos trabalhadores.
Apesar da rapidez de atuação, e de estarmos a falar de empresas que deverão continuar a laborar por fazerem parte de setores considerados essenciais, a verdade é que esta pandemia vai afetar todos, mas sobretudo quem faz atendimento ao público e negócios que foram sendo obrigados a fechar com o escalar do estado de alerta do país.
Trocar as mesas pelo take-away
Vítor Sobral, dono de restaurantes como a Tasca da Esquina, em Lisboa, decidiu fechar os estabelecimentos, mantendo apenas abertas as opções de take-away e entrega ao domicílio. No entanto, já prevê redução da estrutura do seu efetivo, numa altura em que o governo anunciou medidas que o cozinheiro considera “insuficientes” para fazer face às perdas que já está a antecipar.
A uma só voz, e transversalmente, os vários gestores ouvidos pela EXAME optaram por um de dois caminhos quando questionados sobre as recentes medidas anunciadas pelo Governo para responder à crise: ou ficaram em silêncio ou se mostraram desagradados, garantindo que é preciso fazer mais. A resposta de Pedro Matias, presidente do ISQ, resume aquele que prece ser o sentimento geral: “A grande questão vai ser a tesouraria das empresas, o cumprimento de obrigações fiscais e o relacionamento com o sistema financeiro que ninguém sabe ainda como vai ser numa situação de crise como esta. Julgo que o Governo vai ter de aumentar os plafonds e os limites máximos de ajuda que definiu atualmente. A Linha de Crédito lançada pelo Governo vai ter de duplicar rapidamente e ser mais flexível nos critérios. É também muito importante o Governo privilegiar as Micro, Pequenas e Médias Empresas, mas não esquecer as chamadas “Mid-Caps” […] que são, em termos de número de colaboradores, muito importantes para a estabilidade da sociedade”.
Nenhum deles – exceto Vítor Sobral – antecipa, para já, ter que reduzir o número de colaboradores. Embora todos insistam em dizer que ainda é cedo para fazer grandes previsões. É certo que o impacto económico desta paragem global se vai fazer sentir, mas para já, ainda é cedo para fazer prognósticos – até porque todos os que se possam fazer, são à partida catastróficos. O que significa que as empresas se estarão a preparar para o pior, com esperança de que se confirme o melhor.