A história de Mark Zuckerberg, tão boa que já deu um filme, permite um sumário em escassas linhas: este é o jovem geek que, num dormitório da Universidade de Harvard, criou aos 20 anos o que rapidamente se transformou na maior rede social do mundo e que a ele o tornou um dos homens mais ricos e influentes do planeta, revolucionando pelo caminho a forma como as pessoas comunicam, confraternizam e (supostamente) se informam. Por detrás deste desfecho que mais parece ficção, há, claro, uma mente brilhante e determinada, e um líder com um estilo de gestão muito próprio.
Para Zuckerberg, que antes dos 30 já liderava uma empresa a faturar mil milhões de euros, com mais de seis mil de trabalhadores, um dos seus maiores desafios é manter o espírito disruptivo – o que ele chama “hacker way”. Esta forma de trabalhar como um hacker é algo que ele procura, por todas as vias, manter viva. E isso nota-se em todos os pormenores quando se visita a sede do Facebook, em Menlo Park, Silicon Valley, onde a palavra hacker é omnipresente – desde o nome da avenida principal deste gigante complexo às letras colossais que decoram o chão do largo e que só são percetíveis do céu.
A história do cartaz à porta da sede não podia ser mais ilustrativa. À primeira vista, sobressai o famoso polegar espetado em fundo azul. Contornando a placa de cimento, uma mensagem escondida atrás – lá está o antigo logótipo da Sun Microsystems, que ocupava aquele espaço antes de esta ter sido comprada pela Oracle e de o Facebook lá se instalar. Em vez de mandar fazer um novo, Zuck (como é carinhosamente chamado pelos colegas) preferiu virar este sinal ao contrário, para que ninguém se esqueça o que acontece às empresas que ficam para trás. Um recado importante para todos os que ali entram: neste mundo tecnológico, é preciso andar rápido. “Move fast”, lê-se nas paredes por todo o lado. Um mantra que combina com outro, essencial no Facebook, e que Zuckerberg acarinha: “Mais vale feito do que perfeito.” O importante é arrojar, criar, ir mais longe, e depois se valer a pena logo se corrigem os bugs.
O Facebook é uma das primeiras grandes empresas tecnológicas do mundo lideradas por um millennial. E apesar de ter crescido de forma exponencial, preocupou-se sempre em manter intacto um certo espírito de startup que vive da inovação, criatividade, abertura e desafio constante. Zuckerberg gosta de liderar pelo exemplo: trabalha num open space enorme e reúne com os colegas numa sala envidraçada aberta para a avenida principal. Ninguém tem um gabinete no campus, e Zuckerberg senta-se numa secretária igual às outras no meio da equipa de diretores. Ele faz questão de dispensar formalidades e as distâncias que, na sua perspetiva, só criam entraves ao fluxo de informação e à inovação. Por isso, reúne frequentemente com as equipas, testa, dá as ideias e o feedback diretamente a quem está a trabalhar nos projetos, tudo de forma a fazer produtos viciantes e a alimentar esta grande “nação” já com mais de dois mil milhões de pessoas – a maior do mundo.
Quase todos os dias o veem em “walking meetings”, reuniões ambulantes em que circula na pista de jogging da avenida principal com um copo de café na mão. E todas as semanas repete um ritual carregado de simbolismo: um “Q&A” aberto a todos os funcionários do Facebook espalhados pelo mundo. Nesta sessão de perguntas e respostas, todos – do diretor mais alto ao estagiário – podem colocar questões diretamente ao líder. E ele, invariavelmente, pede para lhe atirarem com as perguntas difíceis.
Tudo para reter talentos
Ao circular naqueles edifícios (como tive oportunidade de fazer numa reportagem em 2015), percebe-se bem que os recursos humanos são uma preocupação omnipresente. Lá dentro tudo é gratuito: dos vários tipos de comida que existem nas dezenas de restaurantes às guloseimas, fruta e refrigerantes espalhados por todo o lado. Os pacotes salariais são muito apetecíveis, mas essa nem é a forma mais importante para se reter os talentos em Silicon Valley, e Zuckerberg sabe-o. É importante dar-lhes qualidade de vida e tempo para fazerem outras coisas além do trabalho e para manterem as pessoas em constante desafio, deixando-as testar os seus próprios projetos dentro de casa, para que não se sintam tentadas a ir fazê-lo lá fora. Por isso, organizam-se várias “hackatons” ou maratonas de hacking por ano, desafios de brainstorming em que todos podem participar, e os melhores projetos são escolhidos para serem testados numa tentativa permanente de se melhorar serviço – ou de torná-lo mais indispensável e lucrativo.
Zuckerberg, bem entendido, tem uma ambição planetária. A jogada do Facebook é a de ser uma “one stop shop” na internet, onde se pode fazer e encontrar tudo: amigos, namorados, informação, entretenimento, compras, passatempos. Um serviço com inúmeros tentáculos, tantos quantos os necessários para agradar a todo o tipo de utilizadores e utilizações. A estratégia afinada ao pormenor, com muitas voltas e vieses, ao estilo de uma startup. Como se viu com a mais recente alteração anunciada como objetivo para este ano: fazer da rede um local com mais “interações sociais enriquecedoras”, que é como quem diz: com menos notícias. Depois de ter estimulado as empresas de média a apostar no Facebook, oferecendo-lhes serviços, parcerias e receitas, Zuckerberg anunciou que vai passar a dar menos destaque às notícias, privilegiando as histórias dos amigos e o conceito de comunidade.
Em matéria de talentos, Zuckerberg tem outra máxima importante: rodear-se dos melhores e dedicar-se apenas àquilo que sabe fazer bem: disrupção e inovação. Foi assim que, em 2008, optou por ir roubar o chefe operacional ao Google, Sheryl Sandberg, para ocupar o lugar de COO. Toda a gestão e os números estão-lhe delegados, e os dois, aparentemente tão diferentes, funcionam como complemento perfeito um do outro. Ele traz o sentido do produto, a visão, a cultura e o foco estratégico, e Sandberg complementa-o nas áreas em que ele não é tão forte: a montar negócios, a dirigir as operações e a fazer dinheiro
Os 7 mandamentos
1 Irreverência, precisa-se. Cultiva-se no Facebook o espírito de atrevimento e de insubmissão permanente, uma espécie de contracultura que leva à inovação
2 “Work in progress”. Zuckerberg exige que se esteja constantemente a inovar e a melhorar. Velocidade e energia são essenciais para não se ficar para trás. Não há projetos acabados, tudo deve ser um work in progress
3 Abertura e transparência. Trabalha no meio de um open space, reúne numa sala aberta para o exterior e cultiva sessões de perguntas semanais em que todos podem questionar
os caminhos da empresa
4 Mais vale feito do que perfeito. O ótimo é inimigo do bom – mais vale lançar e testar um produto do que ver um concorrente fazê-lo
5 O CEO está no meio de nós. Gosta de cultivar a proximidade com as equipas para não perder a cultura de startup
6 Trabalhar por objetivos. Zuckerberg define metas anuais para a sua vida privada e profissional, e compromete-se publicamente com elas
7 Emendar a mão. Insistir num erro é pior do que cometê-lo. É essencial deixar para trás o que não correu bem e partir para outra