Longe vão os dias em que os museus eram belas adormecidas. Entrava-se aí, em passo sossegado e silêncio sacro, para fazer um intervalo do frenesim do mundo. Hoje, esses supostos santuários para uma mera contemplação da arte estão transformados em campos de batalha. Não se trata meramente do muito divulgado tiro ao alvo com sopa de tomate ou dedadas de tinta, apontado a obras canónicas como a Mona Lisa em nome das lutas ambientais – um ativismo visto como protesto eficaz por alguns e infantilidade mal direcionada por outros. O museu, e outras instituições culturais, têm sido empurrados a abandonar a sua suposta neutralidade (que, a bem dizer, nunca existiu já que sempre funcionaram como espaços de poder que selecionam quem é aí visto e valorizado), e a confrontar-se com temáticas como a sustentabilidade ambiental, a restituição de bens culturais aos países de origem, a igualdade de género nas coleções e programações, o colonialismo, a inclusão, a representatividade de minorias, a justiça social. Terem exposições bestseller, recordes de bilhetes vendidos, edifícios de arquitetos-estrela? Não chega para ficar bem na moldura. Aos museus, pede-se agora maior responsabilização social, cívica, política.
Dificilmente poderá causar espanto, portanto, que as guerras do nosso tempo tão polarizado se reflitam nos espaços museológicos – incluindo os conflitos feitos com balas reais e mísseis rasantes. A guerra levada a cabo por Israel no território da Palestina, em consequência do atentado de 7 de outubro que vitimou 1200 israelitas, tem deixado um rasto de destruição também em insuspeitos white cubes. Na Alemanha, nos EUA ou na Grâ-Bretanha, ao longo do último ano, tem sido denunciada nos media uma vaga de cancelamentos de exposições e apoios dedicados a artistas que se manifestaram em prol da causa palestiniana ou do fim da guerra, sendo, consequentemente, acusados de alegado anti-semitismo. É, pois, uma significativa exceção a registar o facto da artista britânica Jasleen Kaur, 38 anos, ter sido ontem anunciada como vencedora da edição 2024 do Prémio Turner, o maior galardão anual atribuído a um artista visual no Reino Unido.
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