Um dos três cartazes pagos por um grupo de cidadãos que se reuniu na internet para homenagear as alegadas vítimas de abusos sexuais por elementos da igreja católica foi removido pela polícia, esta manhã, poucas horas depois de ter sido colocado. Trata-se do outdoor de Algés, junto à estação de comboio.
No cartaz inspirado nos outdoors oficiais da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), quer pelo tipo de letra usado, quer pelas cores (vermelho, verde e amarelo), podia ler-se, em inglês, “4800+ crianças abusadas pela Igreja Católica”. Ao lado, figuravam 4 815 pontos vermelhos – um por cada uma das vítimas. Ao todo, foram afixados, esta madrugada, três cartazes em espaços de destaque nos três principais concelhos organizadores da JMM: em Lisboa (na Alameda, logo à saída do metro), em Loures (perto do tribunal) e em Algés (na estação de comboio). E só o último foi retirado.
Contactada pela VISÃO, a autarquia de Oeiras defende que “toda a publicidade ilegal é retirada, neste e em todos os casos”, sugerindo, portanto, que foi o que aconteceu neste caso.
Acusação rejeitada pelo grupo de cidadãos que organizou o protesto. Telma Tavares, a designer do cartaz, nota que este “se trata de uma mensagem política, por isso, não precisaria de licenciamento. Mesmo assim, nós pedimos. A polícia fez uma intervenção num fornecedor privado que nem sequer foi contactado”.
“Este gesto é simbólico do que se está a fazer com as vítimas”, acrescenta Telma Tavares, indignada pelo bloqueio da ação organizada por um conjunto de cidadãos que não querem deixar em branco o tema dos abusos sexuais, durante a visita do papa Francisco a Portugal.
Por trás da iniciativa está um grupo de cidadãos “com diversos credos que não quer que se esqueçam dos abusos na Igreja Católica portuguesa”, como os próprios se apresentam no site “this is our memorial” (em português e em inglês) para explicar a sua mensagem. “Não nos escondemos mas também não queremos aparecer. O foco deve estar em dar voz às vítimas, as caras a aparecer devem ser as dos responsáveis pela instituição que permitiu que este tipo de abuso fosse estrutural e, até ao momento, impune”, continuam, exigindo da igreja respostas.
“Os outdoors são um memorial, são a nossa homenagem possível às vítimas. E são uma forma de protesto não só pelos abusos que a Igreja tenta minimizar como por todos os gastos financeiros com as jornadas que o Bordallo II tão bem referiu”, notou a responsável pelos cartazes, referindo-se ao “caminho da vergonha” (uma passadeira feita de notas de 500 euros) que Bordallo II estendeu na escadaria do palco principal da JMJ, como forma de protesto.
Esta iniciativa junta-se a um conjunto de ações curso, no terreno e nas redes sociais. Nas últimas semanas, Lisboa viu aparecerem vários grafiti alusivos à Jornada Mundial da Juventude, à vinda do Papa e aos abusos sexuais de menores no seio da Igreja. Como a frase “Ainda antes de o Papa vir, já eu rezava por um quarto aqui”, escrita à entrada de um prédio na Avenida Almirante Reis, em Lisboa, habitualmente ocupada por sem-abrigos.
Estes casos não têm merecido a atenção da igreja, que, na pessoa do cardeal patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, os desvalorizou. “Façam o que entenderem fazer, no respeito pela lei”, afirmou, esta semana, na primeira conferência de imprensa da organização da JMJ.