Não foi o primeiro satélite português a ser colocado em órbita, mas o PoSAT-2, lançado para o Espaço no passado dia 14, a bordo do foguete Falcon 9, da SpaceX, será o primeiro com objetivos comerciais.
Trata-se de um microssatélite (com cerca de sete quilos, dez centímetros de largura e de altura e uma profundidade três vezes maior) que irá desenvolver uma espécie de “Waze para os oceanos”. O projeto é da empresa portuguesa LusoSpace que, depois deste, colocará em órbita mais 11 aparelhos no próximo ano, criando assim uma constelação de 12 satélites que irão monitorizar o tráfego marítimo, através do sistema AIS/VDES.
AIS é o acrónimo de Automatic Identification System (em português, sistema de identificação automática), que serve para identificar, localizar e até obter o curso e a velocidade de embarcações através da troca de dados por via eletrónica.
Segundo a LusoSpace, a capacidade de observar embarcações a partir do Espaço permite “prever, antecipar e corrigir situações complexas”. Apesar de já existirem outras constelações de satélites que disponibilizam este serviço, o AIS tem vindo a sofrer uma constante sobrecarga de comunicação, especialmente perto de grandes portos com maior densidade de navios. Para aliviar a pressão e evitar a saturação deste canal de comunicação, foi criado o Sistema de Intercâmbio de Dados de Muito Alta Frequência (VDES), um padrão de comunicação por rádio que adiciona capacidade para maior troca de dados.
A ATON, como se designa esta constelação de satélites, será a primeira a disponibilizar este serviço e, além de orientar a navegação marítima, pode também ser utilizada para detetar ações criminosas, como o derrame de resíduos em alto-mar, entre outras.
O PoSAT-2 servirá para testar se todos os subsistemas ficarão operacionais para posteriormente lançar os outros 11 satélites, que já terão uma dimensão e uma massa superior.
Mas a aposta portuguesa em rentabilizar o Espaço não se fica por aqui. Estão a ser desenvolvidas outras três constelações que irão operar comercialmente noutras áreas de negócio. A portuguesa Geosat, empresa criada com a compra dos satélites da Urthecast, uma entidade canadiana que estava falida, prepara-se agora para colocar em órbita uma constelação com sensores óticos de alta resolução (HR). Numa primeira fase, serão colocados três satélites em órbita. Em paralelo, a mesma empresa está a criar uma outra constelação de dois satélites de VHR, ou seja, de muito alta resolução, que envolve aparelhos de grandes dimensões, com mais de 200 quilos. Com estas operações, a Geosat torna-se um dos maiores operadores europeus de satélites deste segmento.
Outro projeto nacional envolve o lançamento de satélites SAR, que significa, radar de abertura sintética, um sistema usado para criar imagens de objetos a partir do Espaço. São os maiores de todos e, de início, será colocado apenas um no Espaço.
Todos estes projetos fazem parte da agenda New Space Portugal, um consórcio criado no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
Esta agenda pretende lançar vários satélites, até ao final de 2025, de forma a que Portugal consiga entrar nos mercados globais de observação da Terra. A par deste processo, a New Space Portugal criará ainda uma plataforma digital intitulada Digital Planet, onde irá integrar dados obtidos por múltiplas fontes para criar serviços de valor acrescentado.
Segundo o consórcio, o objetivo é “posicionar Portugal na primeira divisão da observação da Terra através do Espaço, criando capacidade nacional para não só acelerar o crescimento da indústria aeroespacial no País, mas também colocar Portugal na vanguarda de um setor altamente tecnológico e promissor para o futuro”.
A agenda New Space, projeto criado no âmbito do PRR que envolve39 entidades, quer colocar Portugal nos mercados globais de observação
da Terra
Todos os satélites que integram estas constelações nacionais estão a ser testados pelo ISQ, instituto que iniciou as suas atividades no ramo aeroespacial em 2008.
“Fazemos testes para este setor desde esse ano, contudo, até 2023, fazíamos apenas a certificação dos subsistemas que compunham os satélites. No ano passado, começámos a fazer os testes a todos os componentes do satélite”, diz Paulo Chaves, diretor do departamento de aeronáutica do ISQ.O trabalho começou com um pequeno satélite, o AEROS, lançado no final do ano passado. Foi desenvolvido por várias universidades nacionais e será usado no estudo dos oceanos. Mais tarde fizeram os testes de um satélite de grandes dimensões, com cerca de 150 quilos, o que obrigou o ISQ a adquirir novos equipamentos de teste.
Nas instalações do instituto português são testadas as vibrações que os aparelhos irão suportar, o termovácuo – as condições do ambiente espacial no que respeita a temperatura, pressão e radiação absorvida pelas superfícies do satélite – e ainda a compatibilidade eletromagnética.
“O objetivo é criar competências em Portugal, que vão desde a engenharia à construção de equipamentos, aos testes e à operação deste tipo de veículos para posteriormente gerar negócio em cada uma destas áreas da cadeia de fornecimento”, explica Paulo Chaves.
No que respeita ao ISQ, todos os investimentos e o conhecimento que está a ser adquirido nesta nova atividade irão colocar o instituto português no mercado europeu das entidades especializadas no teste de satélites, desde os mais pequenos até aos de grande dimensão.
Com o New Space, Portugal entra numa corrida ao Espaço, nesta era das comunicações em tempo real.