Foi sentido em Portugal Continental, esta madrugada, dia 26 de agosto, o maior sismo dos últimos 55 anos. Com uma magnitude 5,3 na escala de Richter, o tremor de terra, com epicentro ao largo de Sines, foi sentido um pouco por todo o País e, até à data, foram sentida mais três réplicas: 1,2 na escala de Richter, a segunda de 1,1 e a terceira de 0,9. De acordo com o Instituto Português do Mar e Atmosfera, o epicentro do abalo, registado às 05:11, a oeste de Sines, teve origem no mar, a mais de dez quilómetros de profundidade.
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Contudo, a ocorrência deste sismo relembrou o País que este não é um tema que não pode ser esquecido. Martim Chichorro, geólogo e professor da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, considera que deve haver um maior alerta entre a população para o potencial sísmico que existe na zona Sudeste da Península Ibérica. “O Sudoeste da crosta ibérica é uma zona bastante complexa. E o sismo de hoje vem provar precisamente isso: que a complexidade de fraturas e de falhas com potencial sismogénico é muito grande”, explicou à VISÃO.
De forma a explicar este fenómeno natural, Martim descreve-o recorrendo a uma analogia. “Suponha que tem 2 lápis na mão, um novo e um que já foi muito usado, muito dobrado e, portanto, tem algumas zonas de fraqueza. E agora imagine que pega nesse lápis – que já tem alguma fraqueza – e tenta dobrá-lo. Vai ver que vai precisar de exercer uma força menor para o quebrar do que no outro lápis novo. Ou seja, ao se aplicar essa força, as tensões vão se distribuir precisamente nessas zonas que já estão fraturadas e a resistência do lápis vai diminuir”, explica.
A zona em que decorreu o sismo de hoje tem uma série dessas falhas suscetíveis de acumular uma série de tensões. Por isso, o terramoto desta madrugada teve origem no movimento de uma falha que entrou em rutura. “Não podemos dizer que foi uma área de rutura muito grande, um sismo de 5.4 de magnitude não está relacionado com uma área de rutura muito grande. No entanto, ajuda-nos a perceber que existe ali uma falha com potencial sismogénico, com potencial de gerar sismos”, explicou.
Será preciso recuar até ao devastador terramoto de 1755, contudo, para se compreender o sismo desta madrugada. Com uma magnitude – estimada – na ordem dos 8.8 a 9 na escala de Richter, o terramoto de 1755 – seguido de um tsunami – devastou a cidade de Lisboa, tendo sido sentido em vários pontos do mundo, como Salamanca ou Marrocos. Um abalo tão significativo que, segundo o especialista, se transferiu para outras falhas.
“Para se gerar um sismo desses, a área de rutura – o deslocamento ao longo das falhas – tem que ser brutal e de muitos quilómetros quadrados. Ou seja, há quem pense que o foco sísmico de 1755 se transferiu para outras falhas. E o mais interessante do sismo de hoje é que esta falha é uma potencial estrutura que pode estar associada ao terramoto de 1755”, explicou.
É preciso educar
Para Chichorro, a relevância deste sismo encontra-se nas lições que dele podemos retirar dele. “O evento de hoje é um evento relativamente insignificante”, começou por dizer. Para o especialista em sismotectónica, todos os portugueses devem estar informados de como proceder num sismo de maior magnitude. Uma educação que deve “começar logo nas escolas”.
“Muitas escolas fazem simulacros dos sismos para mitigar os riscos dentro do edifício. Mas os alunos também têm que estar informados que correm riscos quando vivemos ou estamos perto de zonas costeiras. Todos nós temos esse papel a fazer. Mas nós não conseguimos fugir da evidência de estarmos próximos de uma fronteira de placas”, explicou.
Será também essencial alertar a população para o potencial risco de tsunami, uma vez que Portugal se encontra numa zona costeira. Para Chichorro, as placas de alerta de Tsunami, colocadas em alguns pontos do País, que indicam a trajetória a seguir nessa eventualidade devem ser implementadas “desde São Martinho do Porto até Sagres e de Sagres até Tavira, toda a Ria Formosa”.
Ademais, a população deverá também estar atenta à duração do tremor de terra, uma vez que, segundo o especialista, pode ser dado um primeiro alerta para o tsunami após um sismo que perdure por mais de 40-50 segundos. “Depois a proteção civil, naturalmente, iria lançar esse alerta, mas as pessoas têm que saber que antes da proteção civil lançar esses alertas, nós temos que já ter essa informação que devemos fazer por nossa própria iniciativa”, avisou.
A imprevisibilidade dos sismos
Segundo o especialista, não é possível prever quando irá ocorrer um próximo tremor de terra. “É uma coisa tão extraordinariamente anormal, pode acontecer amanhã como pode acontecer daqui a 10 milhões de anos, mas a estrutura está lá”, explicou.
Apesar de se conhecer a localização das margens das placas com maior potencial sismogénico – no continente e offshore – estes fenómenos são completamente imprevisíveis. “Mesmo a falha de Santo André, a mais estudada do mundo, tem um grau de imprevisibilidade grande, portanto, nós não conseguimos prever quando é que pode existir esses sismos. Temos que definir quais são as zonas de risco”, concluiu.