São duas horas num voo de pássaro, umas vezes bem alto, outras vezes rasante, em que passamos pelo Coliseu, o Panteão, as Termas de Caracalla e até por monumentos desaparecidos. Os detalhes são realistas. E, ao vermos à nossa frente o Colosso de Nero, a gigantesca estátua de bronze que o imperador mandou construir e colocar à entrada do seu palácio, de que hoje não existe nem sombra em Roma, é como se regressássemos a um passado em que a cidade estava no seu apogeu.
Por volta de 320 d.C., a capital do Império Romano era uma das cidades mais populosas da Europa, com um milhão de habitantes e sete mil edifícios espalhados por quase 14 mil metros quadrados. Era monumental e fascinante, sublinham os autores de Roma Renascida: Voo sobre a Roma Antiga, uma visita virtual “cientificamente rigorosa”, feita “com base nas provas históricas disponíveis, ainda que fragmentárias”, cuja apresentação podemos espreitar aqui.
A voz que nos explica os sítios que exemplificam a geografia e a geologia da cidade no século IV, e os seus templos e os seus mercados, é a do americano Bernard Frischer. Faz sentido que seja este arqueólogo a guiar-nos até ao passado da Cidade Eterna – afinal, foi ele o criador deste delicioso voo virtual por Roma doutros tempos.
Licenciado em Estudos Clássicos, Frischer chegou pela primeira vez à capital italiana em 1974, para passar dois anos a estudar topografia romana in situ. Logo em outubro desse ano, visitou o Museu da Civilização Romana e ficou tão impressionado com a maqueta da Roma antiga em exposição que nunca mais a esqueceu.
Feita em gesso, a uma escala de 1: 250, a maqueta reproduz, com precisão, a paisagem antiga de Roma na época de Constantino I, antes de a capital do império ter sido transferida para Constantinopla. Mussolini encomendou-a, em 1933, e o arqueólogo Italo Gismondi demorou 36 anos a construí-la.
O realizador Ridley Scott havia de utilizar essa maqueta em algumas cenas do seu filme O Gladiador, de 2000, mas quatro anos antes já Frischer lançara um projeto internacional para digitalizá-la e usá-la como principal recurso para criar uma visita virtual a Roma antiga.
Entre 1996 e 2003, o arqueólogo andou ocupado a dirigir as escavações da Villa de Horácio, em Licenza, também em Itália, patrocinadas pela Academia Americana em Roma. Ao mesmo tempo, era o responsável pelo Laboratório de Realidade Virtual Cultural da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, um dos primeiros no mundo a utilizar modelação informática 3D para reconstruir património.
De 2002 a 2004, Frischer dirigiu a equipa, encabeçada pelo engenheiro Gabriele Guidi (então no Politécnico de Milão, em Itália, e agora na Universidade de Indiana, nos EUA), que digitalizou a maqueta. E foram esses dados digitalizados que deram origem à primeira versão de Roma Renascida, apresentada pelo presidente da Câmara de Roma em 2007.
Um ano depois, surgiu uma versão 2.0, em que os dados foram substituídos por representações mais detalhadas da arquitetura da cidade. E, em 2018, seguiu-se a versão 3.0. da mesma visita virtual.
Esta nova versão 4.0 é ainda mais realista, graças ao desenvolvimento de computação gráfica avançada. E beneficia de descobertas arqueológicas recentes que permitiram enriquecer a base de dados com recriações novas e atualizadas de monumentos que não constavam das edições anteriores.
Exemplos? As Termas de Caracalla, os templos no Monte Capitolino e as estruturas no bairro dos teatros, como o Estádio de Domiciano (atual Piazza Navona) e os teatros de Balbus, Marcellus e Pompeu, o Grande.
As duas últimas versões de Roma Renascida foram já produzidas pela Flyover Zone, a empresa que Bernard Frischer fundou em 2016. A sua missão é comercializar produtos e serviços que utilizam tecnologias digitais 3D para apresentar locais e monumentos que fazem parte do património cultural.
“[A aplicação] Yorescape Roma Renascida 4.0 é o culminar de mais de vinte e sete anos colaboração internacional na utilização de ferramentas digitais para investigar a história cultural e dar-lhe vida”, afirmou o arqueólogo, num comunicado de imprensa. “Os professores podem utilizar esta e outras visitas virtuais para levar os seus alunos a conhecerem as culturas que estão a estudar. E os viajantes podem explorar grandes lugares históricos sem terem de sair de casa.”
“A Yorescape ajuda os viajantes a prepararem-se antes de saírem de casa e depois a manterem vivas as suas memórias quando regressam”, disse ainda Frischer. O objetivo, sublinhou, não é substituir o turismo do mundo real, mas sim melhorá-lo. E dar-nos a ilusão (tão realista) de que a história pode ganhar uma nova vida.