A avaliar pelas declarações dos envolvidos, a manhã de 3 de novembro na Quinta do Assento, em Gondizalves (Braga), foi bastante animada: o alvo da busca, Manuel Pinho, antigo ministro da Economia, suspeito de corrupção no processo EDP, garante que o procurador Carlos Casimiro se entreteve a fazer “considerações homofóbicas” sobre um juiz e fez queixa à Procuradora-geral da República. Entretanto, e um dia antes do ex-ministro apresentar publicamente a sua versão, surgiu um documento no processo, elaborado por um inspetor da Polícia Judiciária, no qual este afirma ter assistido a uma série de insultos dirigidos por Manuel Pinho contra polícia e o procurador.
De acordo com documentos do processo, a busca à quinta de Manuel Pinho – que o seu advogado, Ricardo Sá Fernandes, classificou como um episódio “baixo demais naquilo que deve ser a dignidade da justiça” – começou às 11h10 do dia 3 de novembro. Apesar de ter estado presente no local, o procurador Carlos Casimiro não consta do auto, nem sequer assinou o documento. No final do auto, refere-se que a “diligência ocorreu sem incidentes, tendo o visado Manuel Pinho assumido uma postura não colaborante no final da diligência”. E, continua o documento, “como resultado desse comportamento, verificou.se a não assinatura do expediente”, com a excepção do Termo de Consentimento para apreensão e análise aos conteúdos do telemóvel.
Mas só seis dias mais tarde, é que Álvaro Sousa, inspetor da Polícia Judiciária colocado no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), informa o processo de que “no preciso momento” em que as buscas tinham terminado e tendo solicitado “três vezes ao arguido que nos acompanhasse ao 1º piso”, Manuel Pinho, “em tom exaltado”, vociferou: “Vão para o c…”, para, logo em seguida, “em tom mais alto”, insistir: “Eu quero que vocês vão todos para o c…!”. O factos, continuou o inspetor, “ocorreram na sala de refeições do piso térreo da residência”, onde o antigo ministro de encontra em pisão domiciliária, e foram presenciados por um advogado de Braga, assim como foram “bem audíveis por vários elementos da GNR e pelo próprio procurador da República que acompanhava a diligência”.
Esta informação de serviço tem a data de 4 de novembro, porém só foi incluída no processo após um despacho do Ministério Público de 9 de novembro.
Com data de 9 de novembro, existe outra informação, mas desta vez redigida pelo cabo da GNR Aníbal Almeida. O documento é um pouco contraditório com o descrito no Auto de Busca, já que refere a “postura não cooperante” de Manuel Pinho no início da busca e não apenas no final, como refere este último documento. De acordo com o relato do guarda da GNR, no início da diligência, Manuel Pinho afirmou: “Prefiro ir preso do que ficar sem o telemóvel e o computador (…) não me vão tirar o telemóvel, pois não?”.
A análise ao conteúdo do aparelho acabou por ocorrer na casa de Manuel Pinho, tendo este assinado o respetivo Termo de Consentimento.
A garrafeira de Pinho
Em matéria de apreensões, a diligência serviu para recolher serigrafias de diversos autores, um saco de gol, uma máquina de Pinhal e 81 garrafas de vinho. O inventário revela que o antigo ministro da Economia tem um gosto diversificado, desde a região do Douro (Quinta do Vale Meão, VT08, Quinta do Sagrado), passando por Espanha (Herederos deu Marqués de Riscal, Matilda Nieves, Vida Zorzal), França (Domies-Agrassac, Henri Dubois Champagne, Chateaux Forcas Dupré), entre outros.
A lista completa: Almeirim Inglaterra.Soplo Rafael Cambra.La Forcalla de Antonis.Chateau Pomies -Agassac. Samsara Priorat. Finca La Montesa.Valminor. Vina Zorzal.Quinta Monte D’Oiro.Jose Pariente. Muga. Sensacionante. Cubio.Altos de Torona. Naia. La Caprichosa. Eya. Bianco Toscano.Louis Perdrier. Blanc de Blancs.Markus Molitor.Quinta da Lapa Reserva.Bensi Sercardi.Jose Pariente.Lindes de Remelluri. Tascante. Mara. Vina Zorzal. Soalheiro Grant. Palacio de Primavera.Vina Zorzal.Lindes de Remelluri. Quinta Vale do Meao. Planeta/Cometa. Precure. Orben. Pata Negra.Matilda Nieves.Quinta Vale Meao. Domies-Agrassac.Quinta da Lapa.Tesch.Henri Dubois Champagne.Henri Dubois ChampagneBruto Rose.Belle-Vue.Prelude.Chateau Forcas Dupre. Quinta do Noval.Quinta Vale Dona Maria. Chassag-Montranchel. Finca Azaya. Petit Chablis.Bret Brothers. Soalheiro. Maçanita. Champagne Pol Roger.GHMUMM.Pena el Gato.Domaine de BeamRenard. Soalheiro/Alvarinho. Mara.Granja Amareleja. VT08.VT06.Herederos Del Marques de Riscal. Quinta do Sagrado.Ponte.Jose Pariente.
PGR abre inquérito
Esta semana, “a Procuradora-Geral da República, na qualidade de Presidente do Conselho Superior do Ministério Público, determinou a instauração de processo de averiguação de forma a aferir a relevância disciplinar da atuação do Ministério Público”, tal como adiantou o gabinete de imprensa da PGR.
Além das “considerações homofóbicas”, o antigo governante referiu que a operação liderada pelo Ministério Público (MP) contou com aproximadamente trinta elementos, “entre os quais vários agentes armados, cuja intenção não poderia ser outra que não a de intimidação”.
Manuel Pinho criticou também as apreensões feitas nessa diligência na casa em Gondizalves, uma vez que o mandado indicaria a apreensão de “bens de valor”.
“Esta ridícula apreensão só encontra explicação na tentativa de me humilharem para retaliar de uma decisão recente do Tribunal da Relação que coloca em cheque a tese defendida pelos procuradores e pelo juiz e na visível vontade de exibição de um poder abusivo e arbitrário”, acusou. Pinho aludia ao acórdão de outubro em que foi revogada a apreensão da pensão do arguido, com o MP a reagir com um pedido de arresto preventivo e integral da pensão.