A Amnistia Internacional Portugal lançou, na última quarta-feira, uma petição online que insta o Governo português a agir no sentido de garantir a retirada segura de civis afegãos, sobretudo os mais vulneráveis à nova realidade do seu país. A ajuda internacional pode permitir que inúmeros afegãos consigam fugir de forma segura, através de rotas legais, impedindo que o desespero os encaminhe para viagens arriscadas que lhes podem custar a própria vida.
O primeiro nível desta ação humanitária é a petição, que necessita de 2500 assinaturas para ser enviada a Mariana Vieira da Silva, Ministra de Estado e da Presidência, e que pretende mudar “o paradigma da presença internacional e da diplomacia portuguesa, bem como a diplomacia dos outros países, que têm muito mais interesse na parte económica, na parte do domínio e do poder e da força militar e não tanto na capacitação, na ajuda pública ao desenvolvimento, na cooperação para o desenvolvimento e nos direitos humanos” explica Pedro Neto, diretor executivo da Amnistia Internacional Portugal, à VISÃO.
O objetivo da petição é garantir “que milhares de pessoas internamente deslocadas ou que precisem de proteção internacional recebem o apoio adequado de que carecem e a que têm direito ao abrigo do direito humanitário internacional”, uma vez que “proteger estas pessoas é uma obrigação moral, humanitária e legal” de todos, pode ler-se no documento.
Com poucos vistos cedidos por Embaixadas de vários países em Cabul e países vizinhos a impedir a entrada de afegãos com a construção de muros nas fronteiras, a Amnistia espera que “Portugal possa acolher pessoas que estão a fugir, principalmente mulheres e crianças, que são os alvos e maiores vítimas, não esquecendo também os seus maridos e irmãos, porque não vamos separar famílias”, garantiu o diretor da Amnistia Portugal. Os jornalistas, ativistas e defensores de direitos humanos são também grupos que merecem destaque na petição e para os quais o auxílio na evacuação imediata é solicitado.
A Amnistia apela a que as autoridades portuguesas “usem todos os canais diplomáticos para pressionarem os países vizinhos do Afeganistão a abrirem as suas fronteiras a refugiados, privilegiando depois os processos de reinstalação e recolocação para garantir a proteção internacional destas pessoas”. Tal como acredita que o país tem capacidade para ajudar e receber afegãos, justificando que “há pouco tempo soubemos os resultados dos Censos e soubemos que há uma crise demográfica, por isso, em nome do crescimento económico e da sustentabilidade da segurança social, Portugal precisa de gente. Está, também, comprovado que o acolhimento de refugiados e a ajuda que lhes damos, rapidamente se transforma em benefício e riqueza para o país e para o Estado”.
Um dos requisitos explícitos na petição é que seja garantido aos indivíduos que cheguem a Portugal uma integração rápida, com o ensino da língua portuguesa e “acesso à saúde e ao mercado de trabalho”.
A comunidade civil também pode contribuir com um papel ativo, oferecendo bens de primeira necessidade ou disponibilizando-se como casa de acolhimento, para que nem todas as crianças e menores desacompanhados tenham de ficar em instituições. “A sociedade e as pessoas estão disponíveis com generosidade para apoiar naquilo que é necessário. O próprio Alto Comissariado para as Migrações já está a fazer uma consulta à sociedade civil, através de um inquérito, para que pessoas se ofereçam para receber cidadãos afegãos, para dar apoio psicológico e bens de primeira necessidade. Portanto, acreditamos que Portugal consegue fazer melhor do que o número que o Ministro Eduardo Cabrita disse que o país podia receber, 50 afegãos”.
O diretor executivo da Amnistia Internacional Portugal defende que não só o Governo português mas todos os Governos podiam estar a fazer mais esforços para ajudar a população afegã e refere ainda que lhe tem “causado muita desilusão a forma expectante como a comunidade internacional e Portugal estão a ver os desenvolvimentos para saber quem é o Governo com que terão de dialogar em termos institucionais”, não pondo sequer em causa “a forma como a tomada de poder está a ser feita, sem respeitar os direitos civis”.
A petição termina com o pedido de que Portugal atue “de forma a influenciar outros países da UE a cumprirem as suas obrigações morais, humanitárias e legais, e a não continuarem com a política de regressos forçados ao Afeganistão”.
Os talibãs tomaram 30 de 34 capitais provinciais em apenas dez dias e, no último domingo, ao entrarem na cidade de Cabul sem encontrarem praticamente resistência das forças de segurança governamentais, proclamaram o fim da guerra e a sua vitória, mudando o rumo da vida dos afegãos que nos últimos 20 anos tinham alcançado inúmeras conquistas sociais.