A prioridade é clara desde o primeiro momento: encontrar a família das crianças que chegam aos centros de acolhimento desacompanhadas.
“O critério é a vulnerabilidade. Ninguém está mais vulnerável do que um menor sozinho”, explica a responsável pelas Relações Internacionais da Cruz Vermelha Portuguesa (CVP), Diana Araújo, 40 anos.
Três dias depois do ciclone Idai ter atingido o centro de Moçambique, a portuguesa foi imediatamente requisitada pelo Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV) para liderar uma equipa com a missão de reestabelecer laços familiares.
Diana Araújo conta com o apoio de meia dúzia de voluntários da Cruz Vermelha de Moçambique, que também estão no terreno a recolher os registos de quem procura familiares desaparecidos. Um dos voluntários, antes de integrar a equipa, utilizou os serviços para entrar em contacto com a sua família, tornando-se num dos primeiros casos de sucesso.
No final da semana passada, havia 683 inscritos na plataforma online de restabelecimento de laços familiares do CICV. A esmagadora maioria está à procura de alguém (455), enquanto 225 pessoas se assinalaram como estando a salvo. Ao fim de três semanas, foram concluídos 83 reencontros.
O número de casos registados deverá continuar a aumentar nos próximos dias, já que a equipa continua no terreno, em regiões como Dombe e Manica, depois de já ter passado pela cidade da Beira, e também por localidades como Lamego, Dondo, Tica ou Nhamatanda.
Os dados são recolhidos manualmente e, mais tarde, introduzidos na plataforma online. Os próprios familiares podem fazer o registo, mas a dificuldade de acesso à internet torna esta possibilidade bastante remota.
O material de trabalho de Diana Araújo inclui, por exemplo, telefones satélite ou baterias solares, já que, em muitos casos, as pessoas perderam o contacto com familiares porque deixaram simplesmente de ter acesso a telecomunicações e não conseguem avisar que estão bem.
“Hoje em dia, ninguém memoriza os números de telefone e, como não conseguem carregar os telefones porque não há energia, ficam impedidos de avisar onde estão.” Mas nem todos os casos são assim tão simples.
Em colaboração com as instituições locais, como o Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC), a equipa do CICV está elaborar listas com os nomes das pessoas alojadas em centros de acolhimento – chegaram a ser 160 mil, mas as autoridades atualizaram os números esta semana em menos de metade, cerca de 73 mil. Entre elas, poderão estar vários desaparecidos.
“Na zona de Búzi, por exemplo, muitos habitantes ficaram isolados e, quando foram resgatados, desencontraram-se da sua família”, explica Diana Araújo.
A articulação com os serviços forenses também é fundamental porque há quem esteja à procura de pessoas já mortas. “Alguns viram o seu familiar ser levado pelas cheias, mas não sabem do cadáver. Por isso, é importante que se inscrevam à mesma na plataforma”, aconselha.
Nos casos de morte, a notícia deve ser dada com uma linguagem clara para evitar equívocos, garantindo que quem a recebe não está sozinho. Até ao momento, estão contabilizados 600 mortos só em Moçambique (o Maláui e o Zimbabué também foram afetados).
Diana Araújo estima que menos de 10% dos registos na plataforma sejam de menores. A VISÃO confrontou-se com dois adolescentes sozinhos numa breve visita ao centro de acolhimento de Muda, próximo de Tica, onde estão alojadas mais de 6 mil pessoas.
Nestas situações, é indispensável conquistar a confiança das crianças e adolescentes antes de abordar a história familiar. “Por vezes, são tão pequenos que nem conseguem dizer o nome dos pais. A solução é fotografá-los e ir para as suas aldeias em busca da família para depois verificar toda a informação.”
Diana Araújo confessa que, à medida que os dias passam, vai tomando consciência da verdadeira dimensão da catástrofe. E, por isso, está empenhada em somar mais reencontros.
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