Homens à porta das lojas de roupa, à espera das suas companheiras, é uma imagem que dentro de pouco tempo tenderá a desaparecer. Sair de casa só para ir às compras está a deixar de ser a principal motivação que leva as pessoas aos centros comerciais. O conceito de anticentro comercial (anti-mall, em inglês), um lugar de lazer e entretenimento, começa a ganhar terreno à medida que aumenta o comércio na internet.
Em Portugal, apenas 37% dos residentes entre os 16 e os 74 anos fizeram compras online no ano passado (um número baixo quando comparado com os 57% da média europeia). Mas entre os meses de novembro de 2012 e 2018, as operações de compra processadas pela SIBS e efetuadas em lojas online com cartões emitidos em Portugal quase triplicaram, com um aumento de 187%, segundo dados da empresa que gere a rede multibanco.
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Nos novos shopping resorts, deixa-se de ser cliente para se passar a ser convidado, e as atividades destes verdadeiros parques temáticos estão pensadas para toda a família, da criança mais pequena aos avós. Veja-se o exemplo do Cirque du Soleil que, a partir de setembro, instalará o seu parque Creactive na Greater Toronto Area, no Canadá, proporcionando “uma experiência imersiva, criativa e participativa para a família, onde as pessoas podem pôr à prova a imaginação, exercitar os músculos, explorar novas habilidades circenses e atuar no palco virtual”, explica a companhia canadiana em comunicado. Os átrios outrora vazios servem agora para rentáveis espetáculos, desfiles de moda ou showrooms de carros.
Continuando no Canadá, o West Edmonton Mall, por exemplo, inclui um parque aquático (e uma “praia” com ondas), espetáculos de leões-marinhos e o maior parque de diversões coberto da América do Norte. Além de 600 lojas, porque o objetivo último, já se sabe, é que as pessoas gastem dinheiro nas compras.
Mais do que ir às compras
Por cá, o Dolce Vita Tejo, na Amadora, agora rebatizado UBBO, é o primeiro centro comercial a transformar-se num shopping resort. A reta final de uma reestruturação iniciada em 2015 irá culminar, lá mais para o final do ano, com a nova Praça Central, um projeto da arquiteta italiana Teresa Sapey. O que agora é um espaço morto ganhará vida com um parque infantil temático do canal Nickelodeon, terraços e cafés, parque aquático, minigolfe e paredes de escalada. “O conceito de shopping resort já é do século passado; agora falamos de emotional resort. Ir ao centro comercial será algo mais do que apenas ir às compras”, reforça Teresa Sapey. A arquitetura deste novo tipo de shopping “é mais sustentável, respeitadora e interativa”, garante.
Há 15 anos, já Teresa Sapey tinha visto os primeiros anti-mall, em São Paulo, no Brasil, mas também os há na Ásia, em Hong Kong e Singapura, todos repletos de atividades. Nos Estados Unidos da América, o número de centros comerciais quadruplicou entre 1970 e 2017 (de 300 para 1 202), um tempo em que era útil ter grandes cadeias de lojas perto de casa. Hoje, e sobretudo nos EUA, o smartphone tornou-se a porta de entrada no mundo das marcas. E os malls fantasma começaram a acumular-se às centenas. Estes novos autênticos parques temáticos são uma reação ao seu desaparecimento.
Apesar dos bons resultados do Dolce Vita Tejo – fechou 2018 com um crescimento de mais 1,8% em tráfego e 6,4% em vendas, a somar aos 15,5 milhões de visitas –, já há três anos que as alterações no centro indicavam um outro caminho. Uma das grandes apostas foi a reestruturação da zona de restauração, por onde passam 40% das pessoas que ali entram. Com muita luz natural, a área de 7 000 m2 e 1 500 lugares sentados ganhou mobiliário de design, criando recantos mais confortáveis para simples refeições, reuniões de trabalho ou mesmo só para estar.
Em Londres, também o Westfield investiu num gigantesco recinto de restaurantes, entretenimento e lazer ao ar livre, incluindo o maior salão de comida japonesa da Europa, o Ichiba. “Os shoppings do futuro têm a oportunidade de satisfazer outras necessidades da comunidade além do comércio”, disse à Business Insider June Williamson, professora de Arquitetura do City College de Nova Iorque e autora de Retrofitting Suburbia.
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Outra das novas estratégias para atrair mais pessoas aos centros comerciais passa por fazer parcerias com hospitais, ginásios, igrejas, escritórios ou bibliotecas públicas, que podem não acrescentar grande rentabilidade, mas servem sobretudo como âncora. Na Amadora, a obra do novo hospital do grupo Trofa Saúde já começou e, em breve, a unidade terá acesso direto ao Dolce Vita Tejo. Um investimento de 50 milhões de euros, com todas as valências clínicas, em 15 585 m2, que irá criar 500 novos postos de trabalho. O número de clínicas ambulantes nos shoppings subiu 15%, de 2011 a 2016, segundo a norte-americana Urgent Care Association. Dados da Bloomberg revelam que um terço de todos os cuidados de urgência se localiza agora dentro de centros comerciais.
Mas como o foco maior desta mudança de paradigma é combater o aumento das compras online, nada como criar espaço físico para os retalhistas digitais. O grupo chinês Alibaba, especialista em comércio eletrónico, tem trabalhado a sua própria versão do shopping do futuro com o conceito more mall (mais centro comercial). O centro de cinco andares, inaugurado em abril do ano passado, em Hangzhou, está repleto de inovações tecnológicas. Se não podes vencê-los, junta-te a eles.