A definição de tempos mínimos de intervalo entre marcação de consultas pode levar à necessidade de reduzir as listas de utentes por médico de família, no caso dos centros de saúde, uma vez que os tempos atuais são geralmente de 15 ou 20 minutos, reconhece o bastonário da Ordem dos Médicos.
Cumprindo uma das propostas do seu mandato, o bastonário vai colocar esta semana em discussão pública a proposta dos vários colégios da especialidade para os tempos padrão de consulta, que são no fundo tempos mínimos de intervalo entre consultas.
“Não é possível aceitar como inevitável a sobrecarga que atualmente se verifica nas consultas, agendadas com diferenças de escassos minutos, quando não sobrepostas, prejudicando as boas práticas clínicas e a qualidade da assistência aos doentes”, justifica o documento da Ordem.
Na apresentação deste projeto aos jornalistas, o bastonário Miguel Guimarães explicou que o objetivo é criar uma regulação dos tempos das consultas, uma vez que “a pressão que existe é grande” e “os médicos e os doentes não têm o tempo que deviam ter”.
“Esta intervenção tem a ver com a necessidade de organização do trabalho. Não significa que cada doente e cada médico não tenham o tempo que entenderem necessário”, afirmou o bastonário.
Depois de estar um mês em consulta pública, o documento tem de ser aprovado em assembleia de representantes da Ordem dos Médicos, sendo depois publicado, enquanto regulamento, no Diário da República.
O bastonário destaca que os tempos que vierem a ser definidos terão de ser aplicados tanto no público como no setor privado ou social.
Na medicina geral e familiar, a proposta da Ordem aponta vários intervalos de tempo para marcação entre consultas, consoante se são ou não primeiras consultas.
Nas primeiras consultas são recomendados tempos entre os 30 minutos e os 45 minutos, que devem ser aplicados nas consultas subsequentes que decorram com pelo menos 12 meses de intervalo.
Nas consultas de seguimento marcadas com menos de 12 meses de intervalo o tempo será entre 20 e 30 minutos. As consultas por doença aguda deverão ser marcadas com um intervalo entre 15 a 20 minutos.
Entre as várias consultas de especialidade hospitalar, os tempos variam por especialidade.
A psiquiatria da infância e adolescência é uma das especialidades que surge com tempo padrão mais elevado, sendo de 90 minutos no caso das consultas de primeira infância e na terapia familiar. Já na psiquiatria de adultos, o tempo de intervalo recomendado para as primeiras consultas é de 45 minutos, sendo de meia hora nas restantes consultas subsequentes.
Com tempos padrão de 60 minutos para primeiras consultas surgem especialidades como a genética médica, a oncologia e radioncologia, a medicina da dor e a medicina paliativa.
Com o máximo tempo padrão aparece, na proposta, a primeira consulta de acupuntura médica, com uma hora e 15 minutos.
O bastonário Miguel Guimarães destaca que a definição dos tempos padrão é essencial para proteger a relação entre clínicos e doentes.
“Os médicos têm cada vez mais de explicar ao doente a sua situação clínica e o que vão ou não fazer ao doente, discutir os possíveis tratamentos. Isto demora tempo. Não é só uma questão de diagnóstico médico, é também uma questão de empatia, de o doente ter confiança no médico e perceber exatamente o que o médico lhe está a propor”, argumentou o responsável num encontro com jornalistas para apresentar a proposta da Ordem, com base numa análise dos colégios de especialidade.
Miguel Guimarães diz que não espera resistência aos tempos padrão por parte das administrações das unidades de saúde ou das direções clínicas, embora reconheça que será necessária uma reorganização, porque atualmente os tempos são curtos e há até casos de mais do que uma consulta marcada para a mesma hora.
“Significa que os doentes têm de ter mais espaço, as unidades de saúde têm de ter mais médicos ou têm de ter mais consultas abertas. E têm de se corrigir as deficiências que existem. E ter menos utentes nas listas dos médicos de medicina geral e familiar”, avisou.
A discussão em torno da dimensão da lista de utentes por médico de família tem sido também muito levantada pelos sindicatos médicos, que querem que sejam repostas listas de 1.550 utentes, quando atualmente são 1.900 utentes por médico.
No documento que é a partir de hoje posto em discussão pública, a Ordem considera que a aplicação dos tempos padrão de consulta “exige sentido de compromisso e responsabilidade” da parte das organizações, unidades de saúde e profissionais.
“É necessário que compreendam as vantagens destas recomendações para a melhoria da qualidade dos atos médicos praticados, da saúde dos doentes e da própria organização do sistema”, refere o documento.
com Lusa