Há 18 anos, quando José Amoroso foi para Bruges fazer Erasmus, o curso de Educação Física belga já tinha o ultimate frisbee no programa. Originário dos Estados Unidos da América, este desporto coletivo surgiu no final da década de 1960, precisamente como desporto universitário, e, ao contrário de tantas outras modalidades, não se joga com uma bola mas sim com um disco. E não tem árbitro, o que pode soar estranho numa altura em que a nova tecnologia do videoárbitro dominou o Mundial de futebol, na Rússia, tendo mesmo alterado resultados.
Este é um dos desportos coletivos mais fáceis e baratos de sempre. Para se jogar frisbee – que, na verdade, é o nome de uma marca registada, e por isso passou a designar-se ultimate – basta um disco (cujo preço ronda os €10), adversários, um areal ou um jardim, e de preferência um verão mais quente e menos ventoso do que este. A Portugal chegou, em 1995, pelas mãos do holandês Patrick van der Valk, que organizava partidas nos jardins de Belém, em Lisboa. Hoje, perto dos 60 anos, é presidente da Beach Ultimate Lovers Association.
Desde que regressou a Leiria, de onde é natural e dá aulas de Educação Física no Instituto Politécnico, José Amoroso, 43 anos, tem feito todos os esforços para inserir o ultimate no desporto escolar. “Tal como acontece com o futsal ou o surf, também o ultimate está, há um ano e meio, numa gaveta do Ministério da Educação à espera de aprovação para passar a fazer parte do Programa Nacional de Educação Física”, lamenta o presidente da Associação Portuguesa de Ultimate e Desportos de Disco e fundador da equipa Leiria Flying Objects, com 60 praticantes, dos 14 aos 52 anos.
No entanto, José Amoroso reconhece que, nos últimos dois anos, foram dados dois passos muito importantes: em 2016, o ultimate foi reconhecido pelo Comité Olímpico Internacional (e poderá ser desporto olímpico em 2024 ou 2028); e, já este ano, também pela Federação Internacional do Desporto Universitário e pela Federação Internacional de Desportos Escolares. Por cá, em maio do próximo ano, a Praia da Rocha, em Portimão, vai receber o Campeonato Europeu de Ultimate de Praia. Parece estar no bom caminho.
Mano a mano
O ultimate vai buscar diversas componentes táticas a outros desportos, como o râguebi e o futebol americano ao nível da ocupação de espaço, e ao basquetebol, por exemplo, usando o pé de pivô (pé que se fixa ao chão para rodar e não para fazer passos). Se pensarmos que se corre durante 45 minutos (jogos na praia) ou 100 minutos (na relva), é ideal a nível de cardio e fitness. Jogada com um disco de 175 gramas, a modalidade não permite o contacto físico entre jogadores, e, sempre que o disco cai no chão, troca-se a equipa, que tem substituições ilimitadas. Além de a duração do jogo ser diferente, consoante se joga na praia ou na relva, também o número de jogadores e as medidas do campo mudam: na relva, são sete contra sete, num campo de 100 metros de comprimento por 47 de largura; já na praia, são cinco contra cinco, num campo mais pequeno (75 m x 25 m), com zonas de finalização (endzone) de 15 metros de comprimento; e num pavilhão indoor são só quatro em cada equipa.
Dizer que o ultimate é uma modalidade dos oito aos 80 anos pode parecer cliché, mas é uma grande verdade – desde que a pessoa tenha agilidade, nada a impede de lançar o disco. No entanto, José Amoroso defende o 1º ciclo (dos seis aos dez anos) como a altura certa para as crianças começarem a praticar, a lançar os discos de adaptação mais leves, desenvolvendo as suas capacidades motoras. “É o único desporto que tem um disco para apanhar, e, ao início, as crianças agarram-no como se de uma bola de tratasse. É bom para desenvolver a orientação espacial. Como o disco voa, naturalmente as crianças vão atrás dele e depois percebem que não o apanham. É preciso parar e escolher a trajetória do disco.”
Sendo um jogo sem árbitro, ajuda os miúdos a aumentarem as capacidades de resolução de conflitos. “A ausência de árbitro faz com que desenvolvam o respeito próprio e o respeito pelo outro”, sublinha o professor de Educação Física. Na modalidade existe mesmo o “espírito de jogo”, um prémio atribuído à equipa que apresenta mais fair play sobre as situações de jogo. Os jogadores escusam de ter manhas para ganhar pontos, pois a situação tem de ser resolvida única e exclusivamente entre os dois jogadores. Ninguém opina sobre os lances: os dois têm 30 segundos para ultrapassar a situação. O ultimate é ideal para miúdos que nunca praticaram nenhum desporto e mesmo para ex-jogadores de andebol. José Amoroso não tem dúvidas de que a vertente social é o fator principal da escolha de uma modalidade sem zangas nem confrontos, apenas arrufos de fácil resolução.
Como se joga – As regras
– Cada ponto começa com as duas equipas em lados opostos do campo; a equipa que defende lança o disco para a outra.
– A equipa atacante apanha o disco e tenta passá-lo entre os seus jogadores, dentro do campo, em qualquer direção, sem que este caia no chão, para tentar chegar à linha de marcação.
– O jogador na posse do disco (lançador) não pode correr e tem dez segundos para passar o disco.
– O objetivo é́ tentar que um companheiro apanhe o disco dentro da zona de marcação contrária (ou seja, para lá da linha final do campo adversário, tal como no râguebi); se o conseguir, a equipa soma um ponto.
– Se o disco cair no chão, se for intercetado por um defesa ou apanhado fora do campo, a posse do disco passa para a outra equipa, e os papéis invertem-se: a equipa que defendia agora ataca e vice-versa.
– Apenas um jogador pode defender o lançador, fazendo a contagem dos dez segundos, e não pode tocar no disco enquanto este estiver na mão do seu adversário.
– Não deverá haver contacto físico entre os jogadores; caso aconteça, deverá ser marcada uma falta ao jogador responsável por provocar o contacto.
– Em situação alguma as regras de jogo poderão ser infringidas voluntariamente (“Espírito de Jogo”).
Onde jogar
1 – Aveiro – Gambozinos: segundas e quartas-feiras, às 19h30, na Universidade de Aveiro (relva), e sábado às 10h30, na Praia da Barra.
2 – Leiria – Leiria Flying Objects: terças e quintas-feiras, às 21h, no Colégio Conciliar Maria Imaculada, na Cruz da Areia (duas primeiras semanas grátis). Instituto Politécnico de Leiria: quartas-feiras, às 22h15, no Pavilhão do Telheiro.
3 – Lisboa – Lisboa Ultimate Club: terças e quintas-feiras, às 21h, na praia de Carcavelos; Disc’Over Lisboa: terças e quintas, às 19h, na Alameda da Universidade, no parque em frente à Reitoria
4 – Palmela/Setúbal – Vira’o’Disco: quartas-feiras, às 20h30, na Escola Secundária Sebastião da Gama, em Setúbal; domingos, às 10h, na Praia da Figueirinha.
5 – Portimão – Ultimate Frisbee Algarve, consultar Facebook.
6 – Porto – Porto Ultimate Frisbee, consultar Facebook.
7 – São Luís/Odemira – Ultimate Frisbee São Luís: quartas-feiras, 19h30, Campo de Futebol de São Luís