Sempre que se toma um antibiótico, a flora intestinal é afetada, sendo eliminanda uma parte significativa das bactérias boas. Publicada esta semana na Nature, a investigação do Laboratório Europeu de Biologia Molecular analisou mais de mil medicamentos à venda quanto ao efeito em 40 bactérias presentes na flora intestinal e concluiu que mais de um quarto dos farmácos afeta o crescimento de pelo menos uma espécie do microbioma, o nome deste conjunto de bactérias do intestino.
Na última década, tornou-se clara a relevância desta população, cujo desequilíbrio tem sido relacionado com problemas como a obesidade, diabetes, e até as doenças autoimunes.
Recentemente, descobriu-se que não são só os antibóticos que afetam a flora intestinal, mas a extensão do problema não era conhecida até agora. O novo estudo é o primeiro a identificar as interações diretas entre os medicamentos e cada bactéria e o resultado surpreendeu os próprios investigadores.
“O número de medicamentos não relacionados que afetam as bactérias intestinais como dano colateral foi surpreendente”, afirma Peer Bork, um dos quatro autores.
Alarmante é também o risco do consumo deste medicamentos levar à resistência aos antibióticos. “Isto é assustador”, considera Nassos Typas, outro dos autores, “tendo em conta que tomamos muitos medicamentos que não são antibióticos ao longo da vida, por vezes por longos períodos”.
Em causa estão fármacos tão comuns como os usados contra as psicoses, a hipertensão e o cancro ou mesmo antihistamínicos, analgésicos e contracetivos. A sinvastatina, do grupo das estatinas, prescrita muitas vezes para o controlo dos níveis de colesterol no sangue, foi um dos medicamentos que se revelou mais prejudicial ao microbioma, assim como o taximofeno (usado como tratamento hormonal no cancro da mama) ou a loratina, para combater os sintomas da febre dos fenos.
Os investigadores, alertam, no entanto, em comunicado, que nem todos os medicamentos têm impacto no microbioma e que em alguns casos o que está em causa é a resistência a um antibiótico específico, o que abre caminho à conceção de combinações de medicamentos específicas para determinados fins.
“Estamos entusiasmados por avançar e explorar as interações -medicamentos-microbioma em comunidades microbianas complexas, uma vez que isto vai ajudar a perceber como é que os indivíduos respondem, por vezes, de formas diferentes à mesma medicação”, afirma, por seu lado o investigador Georg Zeller, que também integrou o grupo responsável pelo estudo.
As últimas estimativas apontam para que, uma vez chegados a 2050, 10 milhões de pessoas morram anualmente com infeções por superbactérias resistentes aos antibióticos.