A culpa é dos eucaliptos, porque os pinheiros não ardem.
A culpa é de quem não limpa os terrenos, esses preguiçosos octogenários cheios de genica nos músculos.
A culpa é dos pirómanos, e pouco importa que só 3% dos fogos sejam provocados por eles.
A culpa é do Estado, que não trata das suas florestas, mesmo que 9 em cada 10 hectares sejam de privados.
A culpa é do governo, até porque o problema dos incêndios se resolve em menos de meia legislatura.
A culpa é dos políticos das últimas décadas, que se elegeram e reelegeram sem os nossos votos.
A culpa é dos bombeiros, essa força poderosíssima que tem de organizar angariações de fundos para comprar equipamento.
A culpa é dos interesses dos meios aéreos, mas onde é que eles estão que já cá deviam estar e nunca mais chegam e não vêm porquê?
A culpa é das leis, que a solução é pôr a coisa no papel.
A culpa é das celuloses, a quem dá jeito que arda a sua matéria-prima.
A culpa é de quem não mandou fechar a estrada, esse assassino que sabia perfeitamente que o fogo ia para ali e queria ver umas dezenas de pessoas a morrerem queimadas.
A culpa é da natureza, do clima, do terreno, da pobreza, da desertificação, do minifúndio, da monocultura, do abandono da pecuária, do aquecimento global, das trovoadas. Do azar.
A culpa é deles. Não é nossa. Com toda a certeza não é minha.
Sessenta e quatro pessoas. Mães, pais, filhos, avós. O Diogo. O Sérgio e a Lígia. O Ricardo. A Fátima. O Mário. A Felismina. A Alzira. O Luciano.
A Bianca, a pequena Bianca.