Esta quinta-feira, realiza-se a terceira reunião de um grupo de trabalho específico criado pela TAP. As agendas destes encontros têm um ponto único: reduzir o risco de pilotos e tripulantes que voem para zonas endémicas contraírem malária. O número de participantes revela a dimensão da preocupação – à volta da mesa sentam-se representantes das direções de Recursos Humanos, de Planeamento e Gestão, de Operações de Voo, de Pessoal de Cabina e da Unidade de Cuidados de Saúde da companhia, a que se juntam dirigentes dos sindicatos dos pilotos e do pessoal de voo.
Este grupo de trabalho foi criado logo após a morte, no dia de Natal, do comissário de bordo Pedro Ramalho, 27 anos, vítima de malária cerebral, que contraiu durante uma viagem de trabalho, entre 4 e 6 de dezembro, a São Tomé, com pernoita em Acra, no Gana, para resolução de um problema técnico no avião. O tripulante de cabina ainda fez depois mais três viagens de trabalho, na Europa. Até que adoeceu, com febre, dores de cabeça e vómitos.
Circunstancialmente sozinho em casa, Pedro Ramalho foi visto, a 18 de dezembro, por um médico da Ecco-Salva, empresa que há muitos anos está contratada pela TAP para prestar assistência clínica aos seus funcionários, fora das horas de funcionamento da Unidade de Cuidados de Saúde da transportadora. O médico, que não terá perguntado ao combalido paciente se viajara para uma zona endémica de malária (como são os casos de São Tomé ou da capital ganesa), diagnosticou-lhe uma gripe.
Mas Pedro Ramalho, afinal, desenvolvia malária cerebral, a forma mais grave da doença, transmitida através da picada da fêmea do mosquito da família Anopheles, contaminado com o parasita do género Plasmodium. Numa fase inicial, o parasita aloja-se nos glóbulos vermelhos do indivíduo atingido. E a malária cerebral é gravíssima, afetando o sistema nervoso e a atividade hepática, pulmonar, renal e metabólica. Pedro Ramalho não lhe resistiu e faleceu, a 25 de dezembro, no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
Soaram os alarmes
Um porta-voz da TAP disse à VISÃO que o trágico caso de Pedro Ramalho está a ser alvo de um “inquérito rigoroso e extensivo”. Mas em 2016 houve outros três casos de malária em tripulantes de cabina da companhia, os quais foram atempadamente diagnosticados e tratados em hospitais.
Por agora, já foram reforçados, na assistência clínica ao domicílio, os procedimentos obrigatórios da check list. Porém, o sindicato do pessoal de voo quer que, nessa circunstância, os médicos transportem o kit do teste da malária (uma análise ao sangue que deteta a presença do parasita nos glóbulos vermelhos), de modo a efetuar o exame logo na casa do funcionário doente, caso tenha viajado para zona endémica.
No grupo de trabalho já foi sugerido, também, o reforço da informação, com distribuição de kits, contendo panfletos preventivos e repelentes, por pilotos e tripulantes que voem para destinos endémicos (Maputo, Luanda, Bissau e Belém do Pará, além de São Tomé e Acra), para lá da criação de uma Linha de Atendimento Permanente.
Em estudo está, igualmente, uma “distribuição mais equitativa” dos voos para zonas endémicas, o que implica uma maior rotatividade das equipas, de maneira a que pilotos e tripulantes tenham a menor exposição possível ao risco.
A malária pode ser prevenida e curada, mas os viajantes não imunes revelam-se particularmente vulneráveis. São os casos dos pilotos e dos tripulantes de cabina, para quem é inviável a profilaxia (o fármaco mais utilizado e recomendado é a cloroquina). O medicamento começa a ser tomado uma semana antes da viagem e prolonga-se até um mês após a saída da zona endémica. Ora, pilotos e tripulantes teriam de fazer tantas vezes a profilaxia a ponto de se tornar danosa para a sua saúde, dados os efeitos secundários perniciosos, sobretudo no fígado.