As doenças psiquiátricas afetam mais de um quinto dos portugueses, ou seja, quase uma em cada quatro pessoas. Um número que nos coloca no segundo país com mais casos na Europa, ou no primeiro, se considerarmos apenas as perturbações ansiosas. Para este flagelo contribuem, em parte, o envelhecimento da população e as circunstâncias de vida (separações, desemprego, precariedade), mas o principal “vilão” parece estar na prescrição e no consumo excessivo de medicamentos. Desde que a Direção Geral de Saúde adotou as orientações internacionais, há cinco anos, que a classe médica conhece o período de referência máximo para toma de ansiolíticos (três meses), largamente ultrapassado, como comprovou o estudo realizado pela da DECO, em 2013: um quarto dos 2 069 inquiridos consumia-os (por vezes, durante mais de um ano) e um em cada quatro exibia sinais de dependência.
O diretor do Programa Nacional para a Saúde Mental, Álvaro de Carvalho, defende que é urgente inverter a tendência, investindo nas boas práticas médicas (redução da prescrição e formação dos clínicos) e na limitação de incentivos ao consumo (reduzindo as comparticipações, que hoje já têm um limite de 37 por cento). Estamos a falar de benzodiazepinas (BDZ), prescritas para combater sintomas ansiosos, mas “que são altamente viciantes e cujo abuso têm efeitos nefastos nas funções mentais e psicomotoras, a curto e médio prazo”, lembra o psiquiatra Ricardo Gusmão, presidente da EUTIMIA – Aliança Europeia Contra a Depressão em Portugal. O médico refere-se aos casos de “défices cognitivos e demências que deixam de existir após o desmame das BDZ”, bem como aos acidentes de viação e às fraturas por quedas.
“Temos um grave problema de saúde pública e estamos na linha da frente entre os países da OCDE, em matéria de doses diárias de consumo de psicotrópicos”, acrescenta Ricardo Gusmão. Entre as medidas que estão a ser ensaiadas para alterar este cenário, destaca-se um programa de desabituação, promovido pela Faculdade de Medicina de Lisboa. Resta saber como o Ministério da Saúde vai separar o trigo do joio (real necessidade de toma v.s. abuso) e que recursos vai alocar para este fim (profissionais de saúde, psicoterapias).