Evolução dos Chumbos
Na Europa há os que chumbam e os que não chumbam. Portugal é dos que mais chumba.
A Europa está claramente dividida entre os países onde se chumba muito (Holanda, França, Espanha, Portugal e Luxemburgo) e os países onde quase não se chumba (Finlândia, Suécia, Polónia, Dinamarca, República Checa e Irlanda).
Portugal faz parte dos que chumbam muito e, em 2012, cerca de 35% dos alunos com 15 anos já chumbaram pelo menos uma vez. Portugal e Espanha são os únicos países que viram a sua percentagem aumentar de cerca de 30% em 2003 para perto dos 35% em 2012, tendo-se atingido um pico em 2009. França destaca-se pelo facto de a percentagem de alunos que ficam retidos estar a diminuir, assistindo-se a uma queda acentuada: de 40% em 2003, 37% em 2009 para 28% em 2012.
Considerando a percentagem de alunos que chumbam por nível de ensino, Portugal é o país onde mais se chumba no início do percurso escolar, 23% dos alunos repetiram pelo menos uma vez até ao 6º ano e 20% chumbaram no 3º ciclo. Portugal assume a liderança ao chumbar tantas crianças nos primeiros anos da sua aprendizagem. Espanha prefere adiar esta medida para o 3º ciclo, apresentando relativamente poucos chumbos nos primeiros anos, mas compensando nos anos subsequentes. A Holanda obriga os alunos a repetirem nos primeiros anos, mas reduz a percentagem no 3º ciclo. (Consultar www.aqeduto.pt/dados – percentagem de alunos que chumbam por nível de ensino) Portugal é comparado com dez países europeus que foram selecionados estatisticamente de acordo com semelhanças e diferenças em cinco critérios considerados relevantes para este trabalho.
Quem são os alunos que chumbam?
Em Portugal, chumbar o ano está fortemente associado com o Estatuto Socioeconómico e Cultural (ESCS) das famílias. Se observarmos o gráfico, 87% dos alunos que chumbam vêm de famílias de estratos sociais, económicos e culturais abaixo da média. Do mesmo modo, estes alunos obtêm classificações no teste PISA Matemática 2012 também inferiores à média de referência (500) e mesmo inferiores à média portuguesa de 487. Ainda mais procupante é verificar que dos alunos que chumbam apenas 40% conseguem resultados PISA iguais ou superiores ao nível 3 (482,4); ao passo que de entre os alunos que nunca chumbaram este número cresce para 74,5%.
Em Portugal, ao contrário do que se passa na Holanda, a maioria dos alunos que chumbam vêm de famílias de estratos sociais, económicos e culturais abaixo da média.
Portugal é de todos os países da Europa aquele que mais associa chumbar com um baixo estatuto sócioeconómico e cultural da família. Na Holanda, sendo um país onde chumbar é uma prática corrente, existe praticamente paridade de chumbo entre classes sociais mais e menos abastadas. As escolas portuguesas parecem estar a ser incapazes de fazer um trabalho de nivelamento de oportunidades, principalmente se nos lembrarmos que é até ao 6º ano que a maioria dos chumbos acontecem.
Chumbar
UM CASTIGO OU UMA OPORTUNIDADE?
Em todos os países, os alunos que repetiram pelo menos um ano têm resultados nos testes PISA muito abaixo dos seus pares que nunca repetiram. Nos países onde a retenção é uma prática mais regular o peso destes alunos no sistema é maior e como tal os resultados globais são mais influenciados.
Em Portugal, os alunos que nunca repetiram obtêm resultados médios muito acima da média (530), mas os alunos que já repetiram atingem resultados médios muito baixos (411) o que significa mais de 100 pontos de diferença entre os dois grupos, o que segundo a OCDE equivale a mais de dois anos de atraso na escolaridade.
Os países que melhor conseguem mitigar esta diferença são a Irlanda e a Holanda, onde a diferença entre os resultados dos que chumbaram e não chumbaram é de cerca de 50 pontos.
Em todos os países, os alunos que repetiram pelo menos um ano têm resultados no PISA muito abaixo dos seus pares e, no caso de Portugal, apenas 14% do alunos que chumbam apresentam sinais de recuperação.
Em Portugal, dos alunos que já chumbaram, apenas 14% conseguem ter um desempenho de nível 3 ou mais. Isto é, mais de 85% destes alunos permanecem muito atrás dos seus pares a nível da resolução de problemas do dia a dia. Este cenário assume depois uma dimensão mais preocupante se nos focarmos na percentagem de alunos que se ficam por níveis de proficiência zero e abaixo de um (que de acordo com a OCDE representam desempenhos de alunos que apenas resolvem problemas óbvios e que não envolvem processos de raciocínio ou de recolha indireta de informação), que em Portugal é de 21% e 36% respetivamente.
A Holanda sendo um país com uma forte prática de retenção de alunos está a ajudá-los a recuperar o atraso (cerca de 50% destes alunos atinge pelo menos o nível 3), nos restantes países onde se chumba muito (Portugal, Espanha, França e Luxemburgo) a recuperação é bastante limitada – cerca de 14% em Portugal; França 15%; Espanha 18% e Luxemburgo 25%. A Irlanda consegue também recuperar cerca de 35% dos seus alunos embora chumbe numa percentagem menor. Os restantes países também não recuperam os alunos que ficam retidos, mas a percentagem de alunos que chumbam é realmente baixa, e por isso os efeitos a nível global são menos vincados.
Quanto custa chumbar?
Para além de dispendioso, chumbar não melhora as aprendizagens. É tempo de repensar a sua utilidade e procurar medidas alternativas que realmente promovam as aprendizagens, especialmente direcionadas a alunos com dificuldades.
O problema não é o que se gasta mas sim se se gasta da melhor forma. Vários estudos internacionais, realizados em diversos contextos sociais e económicos, têm demonstrado que chumbar um ano é a medida mais cara e a que menos traz benefícios aos alunos. Em muitos casos consegue-se provar que os alunos em vez de recuperarem aumentam a distância face aos pares, ficando pior preparados para enfrentar os desafios da vida adulta. Várias medidas têm sido adotadas, todas com melhores resultados e a custos mais baixos. Em Portugal, a despesa direta ligada a mais um ano de escola é de cerca de 7000 USD por aluno. A este custo devemos somar o custo indireto que provém de perdas a nível de salários, maior tempo de dependência da segurança social ou com problemas de saúde e outros (www.aqeduto.pt).
O senso comum em educação ganhou larga expressão nas últimas décadas. A progressiva mediatização dos problemas do sistema de ensino tem conduzido à consagração de adquiridos sobre a educação que nem sempre se sustentam em evidência científica.
Tendo esta questão em conta, o Projeto aQeduto: avaliação, qualidade e equidade em educação visa explicar, através de uma linguagem acessível – mas sem desvalorizar o rigor científico na análise das relações estudadas – a variação dos resultados dos alunos portugueses nos testes PISA, tendo em conta três eixos fundamentais: os alunos (alterações na condição social, económica, cultural, comportamental e motivacional dos alunos e das famílias), as escolas (mudanças na organização escolar) e o país (variações nas condições económicas a nível macro do país).
Para saber mais sobre este projeto consulte www.aqeduto.pt