Muitos fotógrafos são capazes de arriscar tudo por uma fotografia, Joel Santos, 37 anos, também, mas depois prolonga esse risco: transmite aos outros, e ao público em geral, a forma como captou a imagem, em que condições e com que técnica. Sem receio de ser imitado ou que lhe descubram os “truques”. O que lhe interessa, confessa, é continuar a superar-se a si próprio. Por isso, não se importa de partilhar as suas técnicas e conhecimentos.
Foi assim que, em 2010, publicou o primeiro e mais completo manual de fotografia escrito por um português: um robusto volume de 252 páginas, em que assina todos os textos e imagens, com os conselhos essenciais (e muitos especiais) sobre enquadramento, composição, velocidades, abertura e todo aquele jargão habitual entre fotógrafos, mas que, no fim, fazem a diferença entre a boa e má foto. Mas aqui, mais uma vez, Joel apresenta uma outra diferença especial: “Todo o livro foi pensado, escrito e fotografado para que um simples apaixonado pela fotografia o possa compreender, sem se sentir afastado por expressões demasiado técnicas e, tantas vezes, incompreensíveis.” Para a concretização desse livro, Joel Santos usou a sua experiência como fotógrafo, como formador (organiza inúmeros workshops e viagens fotográficas), mas também como um relativamente recém-chegado a este mundo da imagem.
“Acho que estou na melhor posição possível para fazer um livro com estas características, pois ainda há bem pouco tempo era eu que andava em busca desse tipo de informação, sem a conseguir encontrar. Acho que sei exatamente aquilo que as pessoas procuram quando tentam iniciar-se na fotografia”, dizia ele, em 2010, com convicção.
Em busca da luz
Recuemos no tempo, ao final dos anos 90, quando Joel Santos, com pouco mais de 20 anos e uma bolsa do Banco de Portugal para o melhor aluno de Economia do seu ano, tenta concluir, em tempo recorde, uma tese de mestrado sobre”A Partilha do Conhecimento em Ambiente Económico”. Mas tanta pressão e esforço revelaram-se insuportáveis. Esgotado, pediu ao seu orientador de mestrado uma pausa de seis meses para descansar e recuperar, mental e animicamente.
“Foi nessa altura que, em casa e sem nada para fazer, peguei numa máquina fotográfica compacta, uma simples Sony 505, e comecei a ocupar o tempo a fotografar o candeeiro do meu quarto”, conta, num discurso sempre vivo e ininterrupto. “E porquê o candeeiro?”, faz ele próprio a pergunta. E dá a resposta: “Porque ali estavam todas as luzes.Era isso o que mais me fascinava, tentar perceber como podia captar e domar a luz.”
As primeiras experiências foram frustrantes, já que nunca conseguia captar na fotografia aquilo que tinha imaginado ou”visto” no seu cérebro antes do disparo.
O desafio estimulou-o: “Quando me interesso ou apaixono por uma coisa sou daqueles que, como se costuma dizer, ‘não larga o osso’. Foi assim que, para poder fotografar a luz do meu candeeiro, comecei a estudar as técnicas fotográficas.” Nunca mais parou de estudar…
Depois de “domada” a luz, Joel começou a fotografar gotas de água. Da máquina compacta passou para a primeira reflex digital, e a fotografar paisagens, perto de casa, na serra de Sintra. E começou a ver o seu trabalho reconhecido: enviou umas fotos para uma revista de fotografia e publicaram-lhe um portfólio, com direito a capa. Um laboratório farmacêutico descobriu umas fotos suas na internet e… pediu para as comprar, porque ficavam ótimas num catálogo. Concorreu, a partir de 2005, aos prémios de fotojornalismo da VISÃO e… foi premiado em três anos consecutivos.
Pelo meio, partiu para Timor, aceitando um convite para dar aulas na universidade durante três meses. “Acabei por ficar três anos, e foi ali que comecei a fotografar pessoas e rostos.” Mas não só: também começou a viajar mais, em especial pela Ásia. “As viagens transformaram-me completamente como homem. Percebi que a felicidade se obtém das formas menos esperadas e simples.” São várias as recordações que guarda. “Timor ensinou-me que não preciso de acordar obcecado para ver o e-mail, que existe uma outra noção do tempo.” Da Índia, guarda a recordação das pessoas, da sua amabilidade e simpatia. “Mas em termos de beleza em estado puro não há nada que se compare à Indonésia”, afirma, realçando, em seguida, o seu paraíso preferido em Portugal: “A ilha das Flores, nos Açores, está no meu top 3 mundial. É um dos sítios a que volto sempre que posso.” As viagens ensinaram-lhe ainda “que se pode ser muito feliz apenas com uma câmara fotográfica na mão”. Foi assim que encontrou aquele que gostaria que fosse o seu destino: “O meu sonho era percorrer todo o planeta.
E, sem falsas modéstias, acredito que tenho a capacidade de ir a um local e trazer de lá um olhar diferente, próprio e único.” Arriscando tudo para conseguir dominar a luz.
Nota: Adaptação de um texto de Rui Tavares Guedes, publicado originalmente, em novembro de 2010, na VISÃO VIDA & VIAGENS