O caso Homeland, um dos vinte processos judiciais em que degenerou o escândalo do Banco Português de Negócios (BPN), que envolve Domingos Duarte Lima, destacada figura do cavaquismo, teve esta sexta-feira, 28, o seu desfecho na primeira instância, depois da leitura da sentença que demorou mais de quatro horas. Duarte Lima, o seu sócio Vítor Raposo, os advogados João e Pedro Almeida e Paiva (irmãos) e o cambista Francisco Canas saíram do tribunal condenados a penas de prisão efetiva. Apenas Pedro Lima, filho do antigo líder parlamentar do PSD, foi absolvido.
A juíza Filipa Valentim considerou que uma pena patrimonial (multas e indemnizações) não seria suficiente face ao delito, e optou por pronunciar uma sentença “que não possa der encarada como laxista”.
Além das penas de prisão, os quatro arguidos foram condenados a pagarem, em conjunto, uma indemnização, que pode atingir os 18 milhões de euros, à empresa do Estado que teve de ficar com os ativos tóxicos do BPN no âmbito da nacionalização do banco presidido pelo antigo secretário de Estado Oliveira e Costa (no Governo de Cavaco Silva).
Acusado de burla agravada e branqueamento de capitais, Duarte Lima foi condenado a 10 anos pelo coletivo de juízes formado por Filipa Valentim, Afonso Costa e Pedro Cunha Lopes. Recorde-se que, nas alegações finais, o procurador do Ministério Público José Niza já pedira uma pena superior a cinco anos de prisão.
Condenados foram igualmente Vítor Raposo (também ele antigo deputado cavaquista), por burla, e Pedro Lima, pelos crimes de burla e branqueamento de capitais. Pedro Lima, que à época dos factos imputados tinha 19 anos, foi absolvido pois o tribunal considerou ter sido instrumentalizado pelo pai. Por seu lado, Vítor Raposo foi condenado a 6 anos de prisão.
O caso Homeland relaciona-se com crédito obtido junto do BPN para a aquisição, pelo fundo imobiliário Homeland, de terrenos em Oeiras, perto do local onde esteve prevista uma nova sede do Instituto Português de Oncologia, projeto que viria a ser abandonado.
O fundo foi criado por Duarte Lima, Pedro Lima e Vítor Raposo, em 2007, e o BPN detinha 15% desse fundo de 10 milhões de euros. Ainda que a participação do banco fosse minoritária, foi a instituição de Oliveira e Costa que entrou com o dinheiro todo emprestado a Duarte Lima, ao seu filho e ao sócio.
O tribunal deu como provado que estes três arguidos organizaram o seu esquema de forma a ser o BPN a financiar tudo – a sua própria participação no fundo financiou a crédito as participações de Duarte Lima, do filho e do sócio, além dos projetos a desenvolver pelo Homeland.
Segundo o tribunal, Duarte Lima e Vítor Raposo criaram nos responsáveis do BPN uma convicção errónea. Lima e Raposo pediram um financiamento de 22 milhões de euros para comprar terrenos que lhes foram vendidos por cinco milhões. É convicção do tribunal de que o remanescente serviu para beneficiar os acusados. No total, os empréstimos do BPN a estes três arguidos terão ascendido a 43 milhões de euros.
Segundo concluiu o coletivo de juízes da 7.ª Vara Criminal de Lisboa, no BPN ninguém estranhou que, ao projeto de Lima e Raposo, fossem concedidos financiamentos tão avultados, uma vez que o projeto Homeland tinha a chancela do presidente do banco, Oliveira e Costa.
João Almeida e Paiva e Pedro Almeida e Paiva, advogados dos proprietários dos terrenos envolvidos neste negócio, permitiram que os valores inscritos na escritura fossem inflacionados, tendo com isso lesado os seus clientes e obtido, através de Duarte Lima e Vítor Raposo, benefícios pecuniários. João Paiva foi condenado a pena de prisão de quatro anos, e o seu irmão Pedro a dois anos e três meses de pena suspensa, condicionada ao pagamento de 50 mil euros ao Estado, num prazo de três meses.
O setuagenário Francisco Canas, conhecido como “Zé das Medalhas”, que estava acusado de branqueamento de capitais, foi condenado a quatro anos de cadeia. Através do BPN em Cabo Verde, Canas, que também é arguido no processo Monte Branco, canalizou dinheiro que Duarte Lima obteve com o esquema Homeland, para contas na Suíça detidas por uma empresa do antigo deputado no offshore das Ilhas Virgens Britânicas.
O antigo deputado e Vítor Raposo contestaram a decisão do tribunal e vão apresentar recurso, podendo aguardá-lo em liberdade.
“Brutal, imerecida e injusta.” Foi assim que Duarte Lima classificou a pena. “É uma decisão com profundos e clamorosos erros de facto e erros jurídicos”, disse aos jornalistas, à saída do tribunal. “Não aceito ser responsabilizado pela derrocada do BPN”, acrescentou. Segundo ele, a responsabilidade do fracasso do negócio de compra de terrenos em Oeiras foi da queda do mercado imobiliário.
Detido em novembro de 2011, Duarte Lima esteve em prisão preventiva até maio de 2012. Desde então, e até abril deste ano, ficou em prisão domiciliária. Nos últimos meses, tem aguardado o desfecho do julgamento em liberdade.
É uma pena dura. Mas o tribunal não se conformou com a conduta de Lima e de Raposo, classificando-a de “ardilosa” – o empolamento dos valores dos terrenos para conseguirem valores de financiamento maiores e, assim, ficarem com uma parte do dinheiro para si.