“Os olhos também comem.” Quanto a isto não restam dúvidas. Mas esta máxima está a custar-nos o que verdadeiramente conta no prazer da mesa: o sabor. Os tomates são o exemplo perfeito de como da busca de um fruto bonitinho, sem manchas, acabou por resultar uma experiência pobre e dececionante, na hora de mastigar. Há mais de 70 anos que os produtores de tomate selecionam as variedades mais vermelhas e de cor homogénea. Décadas de cruzamentos entre sementes originaram um tomate de aspeto perfeito, que enche as prateleiras dos supermercados americanos, europeus e asiáticos. Bonitos por fora, mas desinteressantes por dentro.
Nas plantas, a fotossíntese permite produzir glicose, através da luz solar e da água. Este processo acontece numas pequenas estruturas, os cloroplastos, onde está a clorofila, a qual dá a cor às plantas. “Quando se selecionam tomates com cor mais uniforme, diminui-se a quantidade de cloroplastos e, logo, de glicose”, esclarece Cândido Pinto Ricardo, 75 anos, coordenador do grupo de bioquímica de plantas do Instituto de Tecnologia Química e Biológica, em Oeiras. “Ficámos com menos cores e menos aroma.”
O gene responsável
O assunto é tão sério que levou uma equipa de cientistas da Universidade da Califórnia – região líder mundial na produção destes frutos -, a analisar dezenas de variedades de tomates da América, da Ásia e da Europa. Em todas elas, encontraram uma mutação genética que reduz a quantidade de açúcar. Um único gene, o SIGLK2, faz a diferença entre o saboroso tomate selvagem e o “plastificado” que encontramos nas grandes superfícies comerciais. “O SIGLK2 regula a formação de cloroplastos. Uma forte concentração de cloroplastos num tomate leva a uma grande variedade de verde, que é a característica que os produtores tentam evitar. A questão é que também aumentam os níveis de açúcar no tomate, e os açúcares desempenham um papel essencial na formação do sabor”, lê-se num artigo publicado esta semana na revista Science.
“É igualmente importante o estado em que se apanham os frutos”, nota Pinto Ricardo. A opção dos produtores passa por colher os tomates ainda verdes, para que resistam às viagens até ao destino final e a vários dias na prateleira do supermercado. Só que este amadurecimento fora da terra também se paga em sabor. “Para amadurecer como deve ser, o tomate precisa de estar exposto ao vento, ao sol intenso – e tudo isto contribui para o enriquecer”, explica.
Em laboratório, a equipa de cientistas conseguiu corrigir a alteração genética e repor o sabor do estado selvagem. O resultado é um tomate com mais 40% de açúcar. Um valor medido, mas nunca saboreado, já que se trata de um organismo geneticamente modificado – a legislação impede o seu consumo, até ser certificado.
Agricultura: Um bom negócio
Rico em nutrientes e com propriedades antioxidantes associadas ao licopeno, o tomate não faz apenas bem à saúde: é também um dos frutos mais apreciados em todo o mundo, produzindo-se mais de 120 mil toneladas por ano. Portugal tem “excelentes condições” para se destacar no mercado mundial, assegura Gonçalo Escudeiro, 42 anos, diretor da Torriba, Organização de Produtores de Hortofrutícolas. “Conseguimos colher, todas as semanas do ano, graças ao nosso verão ameno, com noites frescas e a uma ótima qualidade do solo”, sublinha. Em 2010, o setor valia 250 milhões de euros e 95% da produção tinha como destino o mercado externo.