“Está a criar-se o medo às pessoas, de que as eleições podem vir a ser impugnadas porque há muitos confinados. Nas presidenciais do ano passado estavam confinados 380 mil, agora estarão mais 13 mil. Estamos a falar a 3% mais”, alertou, esta quarta-feira, João Tiago Machado, porta-voz da Comissão Nacional de Eleições (CNE), no Irrevogável, programa de entrevistas da VISÃO.
Tendo em conta a polémica instalada com os direitos de quem está confinado por estar infetado com Covid-19, ou cumpre isolamento por ser contacto de risco, João Tiago Machado revelou que o organismo, a quem compete fiscalizar os atos eleitorais, já reuniu com a ministra da Administração Interna, Francisca Van Dunem, sobre qual a solução a adotar para um universo de eleitores tão grande, quando o País se rege pela Lei de Bases da Proteção Civil – com a situação de calamidade – e não por um estado de exceção, que desse amparo constitucional a uma eventual proibição de sair de casa.
“Nada disso [leis de bases] é lei com força suficiente para afastar a Constituição. Impedir alguém confinado de ir votar está a cometer um crime”, disse o responsável, realçando que “se alguém vai votar em violação do confinamento, tem de fazer em respeito dos demais” e “a obrigação de não por em risco os outros e cumprir o essencial distanciamento”. Mas mostrou-se contra a possibilidade de vir a ser exigido à entrada dos locais de voto a identificação – “é um atentado à democracia”.
João Tiago Machado lamentou que, mesmo depois de “a pandemia bater-nos à porta a 13 de março de 2020, aquando do primeiro confinamento”, os deputados não terem acautelado antes da dissolução da Assembleia da República uma extensão da legislação “que vigorava até 31 de dezembro e que foi usada para as autárquicas, quando houve mais uma hora para votar”. “Se o Parlamento tivesse trabalhado a partir do dia 8 de novembro, quando soube que ia ser dissolvido […]. Trabalhar nessa altura para acautelar este processo eleitoral. Mas coisas deveriam ter sido feitas logo no início. A CNE começou logo a trabalhar em abril de 2020 para umas eleições nos Açores que só ocorriam dali a meses”, exemplificou.
“Nunca houve nenhum surto que tenha sido reportado como tendo origem num eleitor” ao longo das eleições que já se realizaram em pandemia, salvaguardou.
Críticas de Rui Moreira
O porta-voz da CNE frisou ainda o voto antecipado, como importante recurso para quem não possa ir até a uma mesa de votação. “Inscrevendo-se até dia 20, para votar no dia 23”, disse, refutando as críticas do presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, à CNE, devido à logística que está a ser impostas às autarquias. De acordo com João Tiago Machado, Moreira confunde a CNE com a Secretaria-Geral da Administração Interna, a quem compete responder às necessidades dos municípios sobre os atos eleitorais.
“Essas críticas do presidente da Câmara do Porto têm em comum uma coisa: o desconhecimento da lei ou vontade de não dar a conhecer. Porque o dr. Rui Moreira já cá anda há muitos anos. Custa-me que ao longo destes anos, tal é a vontade de criticar a CNE que não se dá ao trabalho de ler o primeiro artigo que regulamenta a CNE e quais são as competências da CNE. Não faz parte das competências da CNE organizar o processo eleitoral. A CNE, com os seus 12 funcionários e os seus 12 membros permanentes, nunca teria capacidade para organizar o processo eleitoral. Nem tem missão, nem competências para tal – a competência é da Secretaria-geral da Administração Interna, que é coadjuvada pelas autarquias. Se as autarquias não têm meios, aí não cabe à CNE”, atirou, no Irrevogável.
O dirigente da CNE lembrou que “desde o dia 23 de setembro, numa deliberação que está publicada no site desde esse dia, que alertámos para este problema [de que Rui Moreira se queixa]. Agora, não temos poder legislativo, nem para impor nada ao legislador. Mas é mais fácil afrontar o mais fraco [CNE] do que o Ministério da Administração Interna”, acrescentou João Tiago Machado, assegurando que obteve de Francisca Van Dunem a garantia que tudo “está a correr maravilhas com os autarcas”.
“Também ouvi o presidente da Câmara de Lisboa dizer que, em poucos dias, com as juntas de freguesia, conseguiu duplicar o número de mesas como era exigido. Se o presidente da Câmara de Lisboa consegue e o do Porto não consegue, essa é uma pergunta que se deve colocar ao presidente da Câmara do Porto”, concluiu.
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