André Ventura apresentou a moção de censura ao Governo, como sendo a única forma de pôr Luís Montenegro a dar explicações sobre as dúvidas relacionadas com um potencial conflito de interesses originado pela sociedade Spinumviva, Lda, de que são sócios a sua mulher e os seus filhos. Para Ventura, “uma grande parte do País reconhece que a única forma de obrigar o primeiro-ministro a prestar esclarecimentos ao povo que o elegeu” foi a apresentação desta moção, depois de, durante os últimos dias, Montenegro se ter mantido praticamente em silêncio, optando por responder apenas ao Correio da Manhã.
“Chegámos aqui porque o primeiro-ministro se recusou a dar explicações”, defendeu Ventura, afirmando que “o senhor primeiro-ministro quer queira, quer não queira, tem de vir dar explicações à casa da democracia”.
Luís Montenegro, num tom mais exaltado do que é costume, respondeu como se a moção de censura fosse um ataque pessoal. “Esta moção de censura é sobre o meu caráter e a minha honra”, disse, aludindo às denúncias anónimas que levaram à abertura de um inquérito sobre a construção da sua casa em Espinho, que acabou arquivado por falta de indícios de crime.
“Há muitos anos que sou alvo de ataques estranhos e violentos”, disse o primeiro-ministro, antes de reiterar a legalidade da cessação de quotas feita entre si e a sua mulher, com quem é casado em comunhão de adquiridos, e de explicar que esta sociedade teve origem na sua vontade de envolver os filhos, ambos estudantes de Gestão de Empresas, nas suas atividades fora da advocacia.
“Não venderam nada do que receberam dos meus avós. Não vou vender nada do que recebi dos meus pais. E adoraria saber que os meus filhos não sentiam necessidade de vender nada dos bisavós. Assim nasceu a Spinumviva”, disse lembrando que entre o património herdado está uma quinta no Douro na qual pretende construir uma adega e uma unidade turística.
Os clientes da sociedade familiar de Montenegro
Montenegro elencou ainda os “clientes pontuais”, que teve na consultoria sobre proteção de dados, não sendo claro quem prestou – uma vez que a sua mulher tem duas licenciaturas em Educação e o filho mais velho é licenciado em Gestão – mas aludindo à contratação de prestadores de serviços externos e às competências que os seus familiares terão conquistado nesta área, dando consultoria “sobre boas práticas de tratamento de dados” a estas empresas.
Além da Cofina, que já tinha revelado ser um dos clientes da Spinumviva, Montenegro explicou que a sociedade prestou serviços a uma fábrica de equipamentos industriais, a uma transportadora de mercadorias, a uma empresa de retalho e lojas físicas e online, que gere um ficheiro com mais de dois milhões de clientes, a um estabelecimento de ensino privado com mais de 1200 alunos e 200 funcionários, um grupo de farmácias e um grupo no ramo do aço.
“Sabem o meu património e origem. Sabem onde moro. A partir de hoje sabem a minha estratégia pessoal e familiar. A partir de hoje só respondo a quem for tão transparente como eu, afirmou o primeiro-ministro, dizendo que o número de telefone da Spinumviva é o seu porque é o que constava do registo inicial da empresa e frisando que a cedência de quotas à mulher é “perfeitamente legal, embora ninguém me impedisse de manter participações”.
O refrão do PSD: “O populismo combate-se com competência”
“O debate da moção de censura acabou”, decretou Hugo Soares, líder parlamentar do PSD, depois da intervenção do primeiro-ministro, aproveitando para questionar se André Ventura via algum conflito de interesses no facto de haver deputados seus que detêm participações em imobiliárias que participam no debate e na votação da Lei dos Solos.
De resto e perante a ausência de resposta de Ventura a esta questão, Hugo Soares pediu à Mesa da Assembleia que distribuísse pelos deputados as declarações de registo de interesses feitas por deputados do Chega que detêm participações em imobiliárias.
A bancada social-democrata arranjou até um refrão para lidar com a moção de censura. “O populismo combate-se com competência”, repetiram, um a um, vários deputados do PSD, à medida que iam perguntando a André Ventura se também censurava as medidas que, em seu entender, foram implementadas por este Governo nas mais variadas áreas, do complemento solidário de idosos ao reforço remuneratório dado às força de segurança, do acordo celebrado com um dos sindicatos dos médicos ao IRS Jovem.