O pedido de audiência ao Presidente da República seguiu com a nota de urgente, mas o procurador-geral da República, Cunha Rodrigues, ainda teve de aguardar uns bons minutos no seu gabinete, no Palácio Palmela, até que o chefe da Casa Civil, Alfredo Barroso, lhe indicasse a melhor hora para se fazer ao caminho. Motivo: Mário Soares estava no ginásio. Quando recebeu o telefonema, Cunha Rodrigues arrancou com a má notícia. “Ia preparado para o pior.” Já instalado no Palácio de Belém e com Soares à sua frente, o procurador adiantou-lhe que Carlos Melancia, governador de Macau, seria um dos acusados do caso do “Fax”. “O senhor só se mete com os meus amigos!”, disparou o então Presidente, numa reação “imediata e desabrida”.
Passaram mais de três décadas e três procuradores-gerais (Souto de Moura, Pinto Monteiro e Joana Marques Vidal) sobre o episódio de 24 de setembro de 1990 – contado pelo próprio Cunha Rodrigues, nas suas Memórias Improváveis (Almedina) –, e a tensão entre o PS e o Ministério Público regressou com a Operação Influencer, sobretudo no que diz respeito ao seu afluente: a investigação aberta contra António Costa, que corre no Ministério Público do Supremo Tribunal de Justiça e que acabaria por ditar a queda do Governo socialista e a marcação de eleições para 10 de março de 2024.
O mais poderoso
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José Narciso da Cunha Rodrigues, 83 anos, foi procurador–geral da República durante 16 anos (1984-2000). Antes, passou por gabinetes ministeriais, tendo sido assessor, por exemplo, de Almeida Santos. No Ministério Público, ainda hoje é a grande referência para os procuradores, que elogiam a sua batalha pela autonomia do MP e pela direção efetiva das investigações. O poder acumulado durante 16 anos como procurador-geral valeu-lhe muitas críticas, sobretudo à forma como geriu alguns processos com impacto mediático, existindo suspeitas de que várias fugas de informação teriam tido origem na própria PGR.