A poucos dias da entrega do Orçamento do Estado para 2024, o Governo deu um passo atrás na negociação que estava a realizar com a CIP – Confederação Empresarial de Portugal, com base numa proposta dos patrões em que se incluía a criação de um 15º mês de salário para os trabalhadores, e que se desenvolvia à margem da Concertação Social. Um murro na mesa do presidente do Conselho Económico e Social (CES), Francisco Assis – que se terá traduzido numa mensagem de WhatsApp enviada a todos os parceiros sociais e que vazou para a praça pública – levou o Ministério do Trabalho a ficar-se por duas reuniões com os patrões, das cinco que estavam agendadas. Mas o Executivo PS não se livra de críticas pelo que aconteceu. Paulo Pedroso, 58 anos, que já teve nas mãos a mesma pasta de Ana Mendes Godinho e que se prepara para liderar a Causa Pública (um think tank de esquerda, onde pontuam socialistas como Alexandra Leitão, Isabel Moreira e Pedro Delgado Alves), defende que foi cometido um “desrespeito” para com a Concertação Social e que Assis tinha motivos para apresentar a demissão.
Como alguém que tutelou esta área, acha admissível a negociação paralela à Concertação Social, por parte do Governo e de uma das centrais sindicais, com o patronato? Foi uma afronta a Francisco Assis?
Acho absolutamente normal que uma confederação fale bilateralmente com o Governo, em qualquer fase de um processo negocial, incluindo numa fase de elaboração de proposta. Só que é muito inusitado que se realizem reuniões bilaterais sem haver uma apresentação inicial de proposta na Concertação. O que descreve na sua pergunta é completamente atípico e inesperado. E o que me leva a compreender a posição crítica de Francisco Assis é o facto de ele se deparar com a existência de negociações do Governo com um ou dois parceiros sociais, sobre um processo que não tinha sido apresentado na Concertação Social. Se tivesse havido meras reuniões preparatórias, que até pudessem alimentar a proposta, ou se tivesse havido meras reuniões bilaterais, não me surpreendia, nem acharia estranho. Mas avançar para reuniões que foram apresentadas como sendo de negociação, sem uma apresentação prévia na Comissão Permanente de Concertação Social, parece-me um desrespeito pela instituição da Concertação Social.