A moção é curta e, essencialmente, de balanço dos dois primeiros anos desde que sucedeu a Paulo Portas. Assunção Cristas já tem pronto o texto que vai apresentar a Lamego, no 27.º Congresso do CDS, e em 16 páginas assume aquilo que pretende fazer (numa lógica de continuidade) para que os centristas cresçam eleitoralmente: mais pragmatismo e menos ideologia.
No documento de 16 páginas, a presidente dos democratas-cristãos assume que o “grande desafio” que se coloca ao partido passa por contrariar os anátemas criados na sociedade desde a sua fundação, pelo que sustenta que é preciso “retirar os rótulos que foram sendo colados injustamente” e, ao invés, que se avalie o CDS “pelas suas propostas e pelos seus protagonistas”. “Queremos um CDS que já não é visto como partido ‘dos ricos’, ‘dos patrões’ ou ‘dos quadros’, mas é o partido de todos, de todas as idades, homens e mulheres, rapazes e raparigas, que valorizam mais o trabalho, o mérito, as ideias, o afinco, a credibilidade, e, sobretudo, a imaginação, a força criativa e o entusiamo”, pode ler-se.
Traduzindo, e apesar das críticas internas de que já foi alvo (especialmente das correntes mais conservadoras), Assunção Cristas tenciona prosseguir o caminho de transformação do CDS num partido interclassista, que lhe permita conquistar mais eleitorado ao PS e, sobretudo, ao PSD. Defende, portanto, que os democratas-cristãos estejam “mais focados na solução do problema e menos na ideologia”.
O facto de a moção ser menos marcada do ponto de vista doutrinário não é inocente. Aliás, na página 15 da proposta de estratégia para os próximos dois anos, a líder apela aos militantes que expliquem às populações que “não há nada intransponível”, isto é, “o que o voto útil acabou” após as legislativas de 2015. A tese é fácil de descodificar: votar no PSD ou no CDS, para derrotar a maioria de esquerda, torna-se, assim, igual. Por isso, nem quer ouvir a frase “vocês nunca lá chegam”, uma vez que, graças ao novo arranjo parlamentar, essa perspetiva “está a passar à história”.
“Acreditamos que os portugueses querem um partido do presente a trabalhar para o futuro e que não querem ficar agarrados aos preconceitos do passado”, reforça Assunção Cristas, como se estivesse a lançar, em simultâneo, um aviso a Rui Rio e um repto aos sociais-democratas descontentes.
Ao longo da moção, datada de 23 de fevereiro de 2018, sexta-feira, a ex-ministra da Agricultura e do Mar enfatiza os vários momentos em que o CDS assumiu a dianteira da oposição ao Executivo chefiado por António Costa: da moção de censura apresentada após os incêndios de outubro do ano passado à recusa das alterações à lei do financimento dos partidos políticos, passando pela vasta agenda social que o partido fez chegar ao Parlamento sob a forma de iniciativas legislativas.
Para o próximo biénio, indica que “os grandes desafios estruturais do país” prendem-se com a demografia, o território, as alterações climáticas, a inovação e o empreendedorismo. E, como em 2019 haverá três atos eleitorais (um dos quais as regionais madeirenses), Assunção Cristas reitera a proposta que levou ao conclave de há dois anos em Gondomar, quando ascendeu ao lugar de Paulo Portas. “Devemos disputar as eleições europeias [o CDS só tem um eurodeputado, Nuno Melo] e as legislativas em listas próprias, com a profunda convicção de que assim estaremos a dar o nosso melhor contributo para Portugal ter uma alternativa às esquerdas unidas”, frisa a deputada.
Na prática, a presidente do CDS avisa Rio que tenciona ultrapassar o PSD pela direita, sendo “a primeira escolha dos portugueses” e “dar o máximo contributo” para que sociais-democratas e centristas, juntos, atinjam a maioria dos lugares (116, pelo menos) no hemiciclo. “Somos alternativa de centro-direita ao Governo das esquerdas unidas. Tudo faremos para dar uma sólida contribuição para que o centro-direita possa atingir esse número e, após as eleições, entender-se para governar.” Amigos, amigos, coligações pré-eleitorais à parte.