Turbulência
Foi em Braga, corria abril do ano passado. À margem de uma visita ao Instituto Ibérico de Nanotecnologia, na companhia do autarca de Braga, Rui Moreira afirmou: “A TAP não é estrutural para o Aeroporto Francisco Sá Carneiro nem para região, nem a região parece ser estrutural para a TAP. Não dramatizo essa situação, é um problema do Governo, não é um problema nosso”. Quase um ano depois e uma mudança de cor política no Executivo nacional, parece que não é bem assim. O presidente da Câmara do Porto acusa a companhia aérea, agora de gestão privada, de querer suprimir ligações aéreas da Invicta para Barcelona, Roma, Milão e Bruxelas, além do voo noturno para Londres (Gatwick). Como se isso não bastasse, a TAP voará, a partir de 1 de julho, para Vigo (Galiza). A opção é, no entender do autarca, “uma brincadeira de mau gosto, vai drenar tráfego da Galiza e retirar passageiros”. Se as pressões institucionais e as denúncias públicas falharem, Moreira ameaça apelar a um boicote nortenho à TAP. «Manif» à vista?
Fortaleza voadora
Na sequência das negociações com o consórcio Gateway, que tinha 61 por cento da TAP e agora fica com 45, o Governo assumirá metade das ações da companhia, sobrando os outros cinco por cento para os trabalhadores. Rui Moreira deseja que o primeiro-ministro, de quem é amigo, faça valer o poderio que metade do capital da companhia aérea lhe dará e faça da TAP um ativo estratégico. “Se vamos pagar a TAP com os nossos impostos, então deve prestar serviço público”. De momento, António Costa não prometeu coisa alguma. Disse apenas que o acordo para a reversão da privatização da TAP, negociada por PSD/CDS, dá ao Governo margem para intervir no assunto. Amigos, amigos…
Pânico no Ar
Há pouco menos de dois anos, Rui Moreira ainda era, para a generalidade da Imprensa galega, o atrevido e carismático autarca que tinha abalado o stablishment político português à boleia de uma furgoneta hippie que percorrera a cidade em campanha eleitoral e o levaria ao lugar onde se encontra hoje. Agora, o caso mudou de figura: com a inauguração da ligação aérea Vigo-Lisboa prevista para breve, a TAP conquistou os afetos do lado de lá da fronteira e a ira do autarca do Porto. Abel Caballero, autarca socialista daquela cidade, considerou a atitude de Moreira “intolerável” e pediu uma investigação da União Europeia às declarações do seu congénere portuense, considerando-as “de uma gravidade extrema” por significarem uma forma de “condicionar o mercado livre”, acusou. “Até pode chamar a PIDE”, respondeu-lhe o independente que lidera a Câmara do Porto. A relação entre ambos nem sempre foi assim. Em julho de 2014, os dois acordaram, por escrito, estreitar os laços entre as duas cidades através da promoção turística. Mas devia ser por terra, presume-se.
Assalto ao Aeroporto
Na Galiza, a estratégia comercial agressiva do Aeroporto Francisco Sá Carneiro não caiu bem. Aproveitando a falta de coordenação entre os aeroportos galegos e as divergências políticas entre eleitos de diferentes cores do lado espanhol, o Porto captou mais de 800 mil galegos para o seu aeroporto, oferecendo uma paleta superior a 60 destinos estrangeiros. O jornal Faro de Vigo denunciou há semanas a publicidade enganosa do “Sá Carneiro” na cidade. Os cartazes anunciam que, pela módica quantia de três euros, o turista pode fazer a ligação de uma hora entre Vigo e o aeroporto do Porto por autocarro. Só de Fórmula 1, ironizou o jornal. A polémica acentuou-se desde que Rui Moreira afirmou, em maio do ano passado, que o “Sá Carneiro” era o maior aeroporto…”da Galiza”. Fê-lo na Corunha, de braço dado com o autarca local do PP encantado por provocar mais umas ciumeiras ao congénere socialista de Vigo.
Ases pelos Ares
A criticada “presunção” de Moreira tem, no entanto, um fundo de verdade: o aeroporto do Porto superou no ano passado a barreira dos 8 milhões de passageiros, ou seja, mais do dobro dos três aeroportos galegos juntos. Acontece, porém, que o terminal de Vigo começa a ganhar destinos e passageiros. E para piorar, até o diretor geral da TAP em Espanha veio a público socorrer os galegos: “Transportamos milhares de viguenses para o Porto. O natural era existir um voo desde Vigo”, explicou ao Faro de Vigo numa entrevista em que anuncia a sua disponibilidade para dar asas à Galiza, em detrimento do Porto: “Trabalharei para que a rota de Lisboa seja um êxito total”, afirmou. Por estes dias, a mensagem dos comentadores galegos parece cada vez mais azeda para Rui Moreira: “É o mercado, senhor regedor do Porto”, escreveu Carlos Punzón em La Voz de Galicia: “O mesmo mercado manipulado que deixou Vigo sem voos por causa das ajudas a outros aeroportos”.