Na eventualidade de os desembargadores Agostinho Torres e João Carrola, do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), revogarem a decisão do juiz de instrução Carlos Alexandre, de colocar José Sócrates em prisão preventiva, e determinarem, por exemplo, a libertação do ex-primeiro-ministro, o portão da cadeia de Évora pode não se abrir para a saída do recluso n.º 44.
O futuro imediato de Sócrates continuará nas mãos de Carlos Alexandre, violentamente atacado naquele recurso pelos advogados do ex-governante, João Araújo e Pedro Delille. Em breve, o magistrado irá rever os pressupostos da prisão preventiva que, em 25 de novembro passado, aplicou ao ex-primeiro-ministro. E pode prolongá-la por mais três meses, alicerçado em “factos novos”, decisão que prevalecerá sobre o acórdão do TRL, só esperado para dentro de dois meses, e que apreciará dados já desatualizados no processo, explicam fontes judiciais.
Basta atender aos sinais que chegam das investigações, em que Sócrates é suspeito de corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais, e aos prazos das decisões, esclarecem as mesmas fontes. Na fase mais recente do inquérito,Carlos Alexandre acompanhou pessoalmente buscas ao Barclays, BPI e Deutsche Bank. Sabe-se, agora, que o procurador Rosário Teixeira irá apresentar ao magistrado “novas provas” – no essencial, elementos bancários. Seguir-se-á o interrogatório de Sócrates, para o confrontar com esses dados, e o juiz deverá aproveitar a ocasião para rever os pressupostos da prisão preventiva, como é de lei que o faça, de três em três meses, prazo prestes a terminar. Mas ele pode antecipar essa diligência, a pedido do Ministério Público (MP) – que, nas contra-alegações ao recurso de Sócrates, considera essencial, para a conclusão das investigações, o prolongamento da prisão preventiva.
Nos meios judiciais, só se antevê uma decisão de Carlos Alexandre, a tomar dentro de dias: a continuação de Sócrates na cadeia de Évora. Esta semana, em entrevista escrita à SIC, Sócrates diz que tem o direito de se defender na praça pública, “onde está a ser julgado e condenado”. E lembra que continua por se esclarecer “onde estão as provas ou os indícios fortes ” de crime e de “que crimes estamos a falar”.
Já no TRL, os acórdãos estão a demorar dois meses a sair, em média. Antes ainda de um processo chegar aos desembargadores, passam 20 dias, entre o parecer do MP junto do TRL, sobre o recurso, e a pronúncia da parte contrária acerca dessas alegações. O recurso de Sócrates foi distribuído, por sorteio eletrónico, na segunda-feira, 2, e, quando tiverem o processo em mãos, Agostinho Torres e João Carrola dispõem de um prazo indicativo de um mês para tomar a sua decisão. É possível que o acórdão seja exarado em fins de março, e o que for decidido só representará uma “vitória moral” – ou para o juiz Carlos Alexandre e o procurador Rosário Teixeira, ou para o ex-primeiro-ministro.
O que acontecerá a Sócrates, anteveem as nossas fontes, sucederá também ao empresário Carlos Santos Silva, que o MP alega ser o testa de ferro do ex-primeiro-ministro, encobrindo €23 milhões que, em 2010, transitaram da Suíça para Portugal, ao abrigo do Regime Extraordinário de Regularização Tributária, e que supostamente pertencem, na verdade, ao ex-governante. Como Sócrates, Santos Silva deve já pensar num segundo recurso da prisão preventiva para o TRL.
Juízes ‘à la minuta’
Breve retrato dos desembargadores ?que vão apreciar ?o recurso de Sócrates
- Agostinho Torres ?É tido como algo “iconoclasta”, com posições por vezes desconcertantes e pouco dado a amizades na judicatura, mas tecnicamente apreciado.
- João Carrola ?Tem a tarimba criminal do antigo Tribunal da Boa-Hora, onde julgou anos a fio antes de subir à Relação. Domina a técnica e é formal no relacionamento.
- Filomena Lima ?Desempatará na decisão, caso Agostinho Torres e João Carrola divirjam nas suas apreciações. É uma juíza muito experiente e de convívio fácil com os colegas.