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O bairro dos antigos trabalhadores das minas, em Vale das Gatas, no concelho de Sabrosa, é o guardião da memória de um tempo, o da II Guerra Mundial, em que o volfrâmio permitiu à região conhecer uma autêntica Idade de Ouro. Mas as minas pararam há muito, depois de o minério ser devolvido ao seu valor de quase nada.
“No tempo da guerra morreu aqui muito homem, sobrtudo marteleiros, por causa dos vapores que inalavam, enquanto partiam a pedra”, conta Filinto Branco, 84 anos, que sabe só pelo que ouviu contar, já que ele ali trabalhou 20 anos mas mais tarde, até ao fecho das minas, quase na década de 1990.
Toda aquela área pertence hoje a um engenheiro. Mas foi uma concessão alemã no tempo da II Guerra, quando o volfrâmio era indispensável à indústria de armamento e as minas trabalhavam sem descanso. “Andavam lá mais de mil homens, em três turnos”, conta ainda Filinto Branco, enquanto vai mostrando as aberturas por onde entravam os operários. Nos terrenos próximos muitos outros homens, uma espécie de “garimpeiros”, jogavam às escondidas com a polícia, à procura de qualquer resto do minério.
Muito desse volfrâmio era vendido nas tasquinhas de São Lourenço, localidade próxima, onde se juntavam os recetadores. E surgiram asssim as grandes fortunas daquela zona , que entraram no domínio da lenda. Esses eram os tempos em que se “acendiam os charutos com notas”, ou se “acompanhava o caldo verde com pão de ló”.
E entre todas as grandes fortunas de então, uma das maiores foi a acumulada por um homem que já prosperara na venda de farinha e que, depois, aproveitou com exímia a corrida àquele ouro ocasional: Júlio César Monteiro, a quem chamavam o “Reco”, nome dado na zona aos naturais de Paços de Sabrosa – o avô materno de Sócrates.
A multiplicação da herança
No centro de Vilar de Maçada, muito perto dali, mas já no concelho de Alijó, ergue-se a Casa da Renda, um nome que vem dos tempos, diz-se, em que os camponeses ali iam pagar a renda ao senhor local. É também conhecida por casa do Lagarto, o animal estilizado que serve de batente ao portão. Naquela casa os foragidos podiam conseguir proteção. Como se conta na vila, “bastava agarrar o lagarto para já não se poder ser apanhado cá fora”.
Parte dessa casa, a zona do torreão em granito, foi herdada por Maria Adelaide Carvalho Monteiro, 83 anos, mãe de José Sócrates. Sempre que visita a terra natal, é ali que fica, desde que recuperou o edifício. E foi uma herança do lado materno. Depois da morte da mãe, quando era ainda muito jovem, foi viver com uma tia materna, ao que consta por não se dar com a segunda mulher do pai, de quem Júlio “Reco” viria a ter dois filhos, Júlio César e Celestino.
Ali bem próximo, Adelaide Cunha Monteiro, 74 anos, conhece bem a mãe de Sócrates e viu como as obras na Casa da Renda lhe mudaram a relação com a terra natal. “Antes não vinha cá muito, mas desde aí sim”.
Embora tenha vivido com a tia algum tempo em Angola, a mãe de Sócrates viria a casar com um homem de Vilar de Maçada, Fernando Pinto de Sousa, de uma família não tão abastada como a dela (o pai arranjava andores, fazia molduras e encadernações), mas que se tornaria arquiteto e professor na Covilhã. Júlio “Reco” não terá ficado muito agradado com o casamento. Mas menos ainda gostou quando a filha lhe anunciou, um dia, que iria separar-se de Fernando, de quem entretanto tivera três filhos. E não ajudaria Maria Adelaide nessa altura, que se queixa de ter passado dificuldades.
Até que, em 1981, Júlio “Reco” morreria de ataque cardíaco, ao assistir em Lisboa, onde vivia, ao atropelamento mortal da segunda mulher. E Maria Adelaide herdaria parte do que se tornara uma fortuna (ver texto sobre as partilhas). Júlio aplicara o dinheiro do volfrâmio em imobiliário. Como conta um amigo da família, “ainda antes do final da guerra, comprou um prédio com dez apartamentos na Avenida Almirante Reis, em Lisboa. Pô-lo em propriedade horizontal e foi fazendo negócio. Por cada apartamento que vendia, comprava uma quinta em Setúbal”. Assim, nos anos 60, já possuiria dez quintas nesta cidade. Em vários dos terrenos construiria depois mais prédios.
Quanto à parte herdada por Maria Adelaide, rezam as lendas de Vilar de Maçada que “só em dinheiro recebeu 80 mil contos, fora o imobiliário”, enquanto outros dizem que arrecadou muito mais. De seguro sabe-se apenas que a esta herança ela juntou, poucos anos depois, uma segunda: José Júlio, o seu único irmão do lado materno, era assassinado no Brasil, sem deixar descendentes.
Uma vila em alvoroço
Para conhecer o único primo direito de Sócrates ainda residente em Vilar de Maçada há que sair do centro da vila e ir até à Quinta de Fiães, propriedade de Fernando Morgado. Destinada a turismo rural, por ali já passaram políticos e celebridades da música .
Sócrates, que foi o único dos três filhos a ir viver com o pai para a Covilhã, depois da separação do casal, terá sido sempre “mais próximo dos primos do lado paterno”, como é o caso de Fernando. Aliás, era em casa da mãe de Fernando que Maria Adelaide e mesmo José Sócrates ficavam quando iam à vila, até às obras na Casa da Renda.
Entre a família reina a mesma incredulidade que na vila sobre a prisão do ex-primeiro-ministro. “Houve gente que chorou”, conta Laura, mulher de Fernando. “Ele não tinha necessidade” é o comentário mais frequente entre os populares a propósito do caso. Mais difícil ainda de acreditar que a detenção se devesse a corrupção ou troca de favores. “Pelo menos aqui na vila ele não fez nada!”. Quando muito terá dado uma ajuda à aprovação do projeto do Centro, um misto de infantário e lar, que é um orgulho local.
Sócrates só viveu em Vilar de Maçada nos primeiros meses de vida. E desde sempre manteve com a vila uma relação de alguma distância, ainda que volte com regularidade. Como conta uma ex-autarca, “já em novo ele era um senhor. Ficava aí a ler, dava-se com muito poucas pessoas”.
Em 2005, Maria Adelaide assegurava, em entrevista a Herman José. “O meu filho não gosta de dinheiro, não quer nada para ele. Quer tudo para os outros”.
Mas, desde que se tornou um político conhecido, os media questionavam com alguma regularidade as origens do dinheiro de Sócrates, os seus gostos caros, desde os fatos, os carros (logo o primeiro era um Mercedes, ainda que usado), os restaurantes frequentados e sobretudo a sua casa, num edifício de luxo no centro de Lisboa, o Heron-Castilho. Era um bom viver que ele sempre atribuiu a dinheiro de família.
Do lado paterno ainda não terá herdado. Fernando Pinto de Sousa, que morreu em 2011, após uma queda nas escadas da sua casa de Vilar de Maçada, um edifício brasonado, tornara-se um homem abastado. Só que ainda não terão sido feitas as partilhas.
Mas o ex-primeiro-ministro sempre se referiu em particular à herança do volfrâmio, vinda do avô materno. Resta saber que parte dela já terá, de facto, recebido.”Maria Adelaide distribuiu alguns dos bens herdados pelos seus três filhos, negócios que o pai tinha montado, mas José Sócrates preferiu a parte dele em dinheiro. A mãe ainda tentou dissuadi-lo, mas a liquidez dava jeito a quem começava a descobrir na política o seu modo de vida”, escreve Eduarda Maio na biografia O Menino de Ouro do PS. Lançado em 2008, o livro conta ainda: “O apoio económico da mãe sempre ajudou José Sócrates a viver sem grandes inquietações financeiras, desde muito novo. ‘Nunca precisou de dinheiro, conta Fernando Sarrasqueiro, ‘a mãe emprestava-lhe o que precisasse”. Essa seria, segundo a autora, talvez uma forma de o compensar por ser o único filho que fora criado longe dela.
Aliás, Sócrates é hoje o único filho de Maria Adelaide. A mais velha, Ana Maria, morreu em 1987, de síncope cardíaca, enquanto o mais novo, José António, faleceu em 2011, de fibrose pulmonar, deixando duas filhas.
A biografia soma ainda testemunhos de amigos sobre o seu hábito de querer pagar a conta em saídas de grupo ou o gosto em dar presentes às pessoas que mais estima.
As origens do dinheiro de Sócrates voltam agora a estar sob suspeição, mas desta vez por parte da Justiça. Vista de hoje, só pode parecer ironia a definição que ele fazia de felicidade, na entrevista dada, há um ano, a Clara Ferreira Alves, do Expresso, a propósito da sua vida como estudante em Paris, depois de deixar o Governo. “Estou como o George Harrison: a felicidade é abrir os jornais e não falarem de nós. Agora falam menos de mim”. Falavam.
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