Na terça-feira, 27, era ainda tempo de felicitações. António Marinho e Pinto, 63 anos, eleito para o Parlamento Europeu pelo MPT, passou a manhã a responder a telefonemas de parabéns. Embora seja a primeira vez que ocupa um cargo político, tem a certeza de que não será “um segundo Fernando Nobre” e promete suspender a inscrição na Ordem dos Advogados – em nome da transparência. Em Estrasburgo vai sentar-se com a “família” ambientalista.
Ficou surpreendido com os resultados do MPT?
Fui dizendo sempre ao meu n.° 2 que ele também ia ser eleito…
Confirmou-se. De onde vinha essa certeza?
Fui jornalista durante 29 anos e sou advogado há trinta. Conheço o País e as pessoas. O meu trabalho é falar com elas e resolver-lhes os problemas. Estive nos concelhos onde ninguém vai, em campanha eleitoral.
Foi a sua estratégia?
Em Portugal, fazemos política de forma exageradamente formal. Não podemos ter este carreirismo político que ignora os interesses dos que servimos, o povo. A dimensão da crise devia levar os principais partidos a porem de lado as divergências.
Isso significa que está pronto para fazer alianças?
A política é isso. Alianças e convergências.
A quem poderá o MPT aliar-se?
O PCP é um partido de protesto com que nunca se pode contar. E que solução podem dar ao País partidos que criaram a maior parte dos problemas por estratégia ideológica, como o PSD e o CDS? Depois do 25 de Abril, nunca estive na política, mas fui convidado várias vezes para ser candidato independente.
Por que nunca aceitou esses convites?
Porque sou incapaz de colar cartazes de pessoas que detesto.
O que o fez avançar, desta vez?
Há várias razões, mas costumo apontar uma de natureza pessoal. Fui para o Brasil com meio ano. Um dia perguntei ao meu pai porque não voltava. Ele disse-me que, em Portugal, não havia futuro. Foi um choque enorme. Quando, 60 anos depois, a minha filha emigra e diz a mesma coisa, pergunto o que andamos a fazer. Fez-se o 25 de Abril, estamos na União Europeia e os jovens têm de emigrar para ter uma vida digna!
Foi a gota de água?
Não sei. Interpelou-me. Que responsabilidade tenho eu? Andamos todos a fingir, a ignorar. Na Ordem, fazíamos o diagnóstico, as propostas, mas nada acontecia. Os interesses dominam o processo legislativo em Portugal através de advogados que estão lá para garantir a proteção de interesses de alguns clientes.
Foi bastonário da Ordem dos Advogados seis anos. O que fez para mudar isso?
Não consegui. As teias clientelares dominam as direções partidárias.
Portanto, agora vai tentar mudar a política por dentro?
Não sei o que poderei fazer, mas vou lá dentro. E começo pelo Parlamento Europeu, naturalmente.
Naturalmente, porquê?
Grande parte dos problemas dos portugueses resolvem-se hoje nos órgãos europeus. Dois terços da legislação tem proveniência europeia. Como é possível que haja empresas a pagar os seus impostos à Holanda por serem mais baixos? Isto não é próprio de uma união.
Para resolver isso defende mais integração?
Sim. Quero combater o dumping fiscal na UE e aprovar medidas legislativas de uniformização de salários. A miséria iria abater-se sobre os portugueses se deixássemos a União. Portugal está em 22.º lugar no índice de progresso social. A UE tem 500 milhões de consumidores, com um nível de vida inigualável e representa 7% da população, mas produz 20% da riqueza mundial. O populismo e a demagogia estão na defesa da saída do euro e no ataque à Europa.
Algo de que o acusaram durante a sua campanha…
É populismo defender mais integração europeia e a permanência de Portugal na moeda única? Defender os imigrantes? A dignidade dos reclusos? Combater julgamentos sumários?
De onde vem essa leitura, então?
É a sublimação de algumas frustrações de políticos e de jornalistas.
Porquê o Partido da Terra?
Nos grandes partidos ou me sujeitava a eles ou eles me destruiriam, portanto, não eram opção. Dos pequenos falei com vários e o que me pareceu melhor foi o MPT. Mais puro, com convicções mais cristalinas. Até por Gonçalo Ribeiro Teles, que é uma figura tutelar da democracia portuguesa, sendo monárquico. Prova de que podemos cooperar desde que haja convergência no essencial.
É mais fácil brilhar em círculos mais pequenos. Ser um partido pequeno é uma vantagem?
Não. Ser pequeno só tem desvantagens. Deu mais trabalho e a ostracização dos órgãos de comunicação foi maior.
Com um resultado de mais de 7%, passou a ocupar o quarto lugar dos mais votados, ultrapassando o Bloco de Esquerda. Sente-se “vingado”?
Sinto responsabilidade. E uma estranha sensação de vazio, que me vem sempre depois de conseguir as coisas que quero.
Porque acabou a luta?
Num processo de luta, somos o que somos, mas também aquilo que os nossos adversários nos obrigam a ser. Chegado ao fim do caminho, pergunto a mim próprio: o que vou fazer com isto?
E a que resposta chegou?
Vou ser deputado no PE. Mas não sei se vou concluir o mandato. Provavelmente, não.
Porque não?
Por outras opções políticas. São ponderações a fazer no momento apropriado. Agora não. Mas garanto que vou suspender a minha inscrição na Ordem dos Advogados, porque acho que um deputado não deve exercer advocacia.
As presidenciais também estão no horizonte?
Tudo está no horizonte e tudo não está. Não há especializações em política.
Corre o risco de transformar-se num fenómeno bolha tipo Fernando Nobre?
Nobre foi um epifenómeno, triturado por um mundo que não compreendia. Acenaram-lhe com um lugar que era a negação de tudo o que tinha andado a pregar na campanha. Sou muito diferente. Não me envaideço com as vitórias nem me atemorizo com as derrotas.
Mas estava emocionado, no domingo?
Estava. Ponho muito sentimento no que digo e faço. É o meu grande defeito. Quando me lembro da minha mãe… emociono-me. Ela tinha muito orgulho em mim e as minhas filhas também. Uma das minhas filhas todos os anos me telefona a agradecer pelo 25 de Abril. Não me emociono nos momentos de perda e de desaire, mas quando consigo o que queria.
Está na política para ficar?
Sim, sim. Não entrei na política para sair. Para o ano, vai haver legislativas. Provavelmente, vou candidatar-me às legislativas. Dizem-me que se estas eleições tivessem sido para a Assembleia da República representaria 12 deputados.
O MPT teria massa crítica para isso?
Terá de transformar-se. Sou um candidato independente. Neste momento, vivo em união de facto com o MPT. E as uniões de facto terminam ou pelo casamento ou pela separação.
Vai haver casamento?
Não lhe sei dizer. Até aqui, tem sido uma lua de mel. Vamos fazer com que se prolongue. Mas o processo de crescimento também é difícil, sobretudo quando é súbito e em torno de uma vitória eleitoral.