Se não fosse pela guerra que há mês e meio acontece na Ucrânia, o Babel não seria do conhecimento dos portugueses. A sua equipa continuaria a escrever textos sobre temas interessantes e úteis da vida política ucraniana, sobre Economia, História e descoberta científicas, sem manipulação e sem procurar o clickbait.
Se não fosse pela guerra que parece não ter fim, o pessoal não estaria a trabalhar a contrarrelógio, sete dias por semana, a partir de bunkers em Kiev e em outras cidades, usando apenas fontes confiáveis e verificando ainda mais toda a informação que veiculam.
Se não fosse por esta guerra na Europa, não teriam lançado podcasts e artigos de opinião de testemunhas do que se está a passar. E os artigos estariam apenas escritos em cirílico, em vez de estarem todos traduzidos em inglês – para que o mundo inteiro possa ler acerca do que se passa.
Se não fosse pela guerra que tem dizimado cidades e civis, os níveis de audiência elevados continuariam a garantir publicidade suficiente para aguentar a forma de trabalhar da equipa de 25 pessoas, desde 2017. E não estariam a pedir ajuda monetária ao resto do mundo. Qualquer leitor interessado em perpetuar o bom trabalho que têm consigo fazer em condições tão adversas, pode doar um montante em paypal@babel.ua.
“O jornalismo de qualidade ainda é mais necessário numa época como esta”
Anton Semyzhenko edita a versão inglesa do Babel.ua, probono. Antes da guerra, era um dos 15 jornalistas que fazem parte da equipa deste site noticioso. Falámos com ele sobre as condições difíceis em que trabalham, a partir de Kiev.
A vossa equipa está a trabalhar na Ucrânia? Sim. Mais do que isso ― a equipa ficou em Kiev, mesmo durante os dias mais perigosos. Trabalhamos a partir de abrigos e bunkers.
Conseguem publicar tudo, sem censura? Não há censura. Mas há sanções para quem revelar a localização dos militares ucranianos, os seus movimentos ou outra forma de ajudar o inimigo. Também temos restrições em revelar onde caíram os mísseis russos, porque isso ajuda na tomada de decisão de novos ataques. Percebemos as limitações: elas não são atentados à liberdade, mas antes garantem-nos a sobrevivência.
Quais são as principais dificuldades de trabalharem durante uma guerra e dentro dela? Separaria isso em três partes: A primeira é mantermo-nos vivos. Nestas circunstâncias, para fazermos um bom trabalho jornalístico é importante estar perto do campo de batalha. E a Rússia, definitivamente, não quer que os detalhes acerca da invasão sejam conhecidos. Portanto, os jornalistas são muitas vezes alvos a abater. Usar um distintivo de Imprensa, quando se encontra um soldado russo, não ajuda (antes pelo contrário).
O segundo tipo de dificuldades são as físicas. Algumas pessoas que estão a trabalhar perderam as suas casas, porque foram bombardeadas. Alguns decidiram mudar-se para regiões mais seguras. Os raides aéreos são uma constante – sempre que soa uma sirene, temos de nos abrigar e a internet não existe nesses locais nem eles são sítios confortáveis para se trabalhar.
E o terceiro?
São as questões psicológicas. É difícil lidar com tanta dor. Claro que tentamos pôr as nossas emoções em stand by, mas toda a gente sabe que isto não é temporário. Além disso, um dos nossos principais objetivos é reportar todas as violações, atrocidades e detalhes e isso significa ouvir tudo e ver o máximo possível. Não é uma tarefa fácil.
Também é difícil não odiar os soldados russos, mas sabemos que estamos a dar passos no sentido da desumanização. Por isso, na nossa publicação, nunca descemos o nível, tal como a Rússia faz, ao afirmar que os ucranianos não deveriam existir enquanto nação.
Porque precisam de apoio agora? É difícil dizer que, neste momento, haja um mercado de publicidade na Ucrânia – o nosso rendimento caiu para o zero. Já cortámos nas despesas e nos salários, mas para conseguirmos continuar a trabalhar, irmos às zonas de batalha e produzir conteúdos em duas línguas, precisamos de apoio. Sem ele, não podemos continuar ― o jornalismo de qualidade ainda é mais necessário numa época como esta.